Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mário Magalhães

‘O repórter Kleber Tomaz e o fotógrafo Antônio Gaudério saíram cedo para a entrevista que o Departamento de Investigação sobre o Crime Organizado marcara para a tarde da terça. Chegaram antes da hora.

A Polícia Civil de São Paulo anunciaria o balanço de uma operação. Enquanto esperavam em um auditório, os jornalistas da Folha ouviram gritos do outro lado de uma divisória de madeira, onde se instala uma delegacia.

Tomaz correu com o gravador. Ouviu uma voz que seria de policial: ‘Aqui não. Aqui você vai falar que não apanhou’. Sobreveio um som de tapa. Um homem que parecia estar preso berrou: ‘Ai, ai’.

O suposto policial: ‘Aqui não. Aê, seu bosta. Você vai falar que não apanhou. […] Na época da ditadura, os caras batiam [som de risadas]’. E ironizou quem apanhava em tempos não tão velhos assim: ‘E os bandidos: ‘Não senhor, pelo amor de Deus’’.

O assunto da coletiva foi para o pé de uma bela reportagem que, infelizmente, não mereceu nem alto de página. A foto, ‘roubada’ por uma fresta, não rendeu boa imagem. A polícia defendeu-se: foi ‘brincadeira’ dos policiais. Com o ‘furo’, contudo, a Secretaria da Segurança Pública ordenou apuração sobre os eventuais atos de tortura.

Os repórteres fizeram a coisa certa: tinham uma pauta, mas mudaram de rumo quando outra notícia se sobressaiu.

Não é sempre assim: um estorvo do jornalismo é a submissão burocrática à pauta original como um fanático ao seu livro-guia. É preciso estar de olhos -e ouvidos- atentos à novidade, rejeitando os antolhos que limitam a visão.

Conforme o ‘Manual da Redação’ da Folha, ‘pauta’ é ‘o primeiro roteiro para a produção de textos jornalísticos e material iconográfico’. A melhor reportagem não é a que satisfaz a pauta, mas a que vai além dela e surpreende.

No auditório havia um terceiro repórter, de outro veículo, cuja identidade a Folha omitiu. Ele escutou os gritos, mas só noticiou o que era oficial. Ficou com a pauta de origem, calou sobre a violência.’

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‘CVM está errada; imprensa também’, copyright Folha de S. Paulo, 19/8/07.

‘Trata-se de capricho autoritário a minuta de resolução da Comissão de Valores Mobiliários que, como descreveu a Folha, ‘propõe normas de conduta para empresas jornalísticas, na publicação de análises de investimentos, que contenham recomendações sobre evolução de indicadores e de valores de ativos’.

A autarquia do Ministério da Fazenda pretende ‘que as fontes das informações utilizadas sejam fidedignas’. A CVM não esclarece quem classificaria a fidedignidade. Ou seja: se um repórter considerar que um dirigente da comissão não é fonte merecedora de crédito, pode ser punido por ela. Não é papel da CVM censurar a imprensa.

A proposta tem um mérito: escancara a absurda ausência de auto-regulamentação sobre conflito de interesses: não deveria investir na Bolsa jornalista que apura, edita ou comenta o mercado financeiro.

O ‘Manual da Redação’ condena a atuação ‘em interesse próprio, escrevendo sobre empresa ou negócio com que tenha relação, mesmo indireta’. Defendo vetos mais específicos. Consultada, a direção da Folha me informou que discutirá o tema.’

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‘Cobertura deveria reforçar equilíbrio e evitar ‘economês’’, copyright Folha de S. Paulo, 19/8/07.

‘Na edição de anteontem, uma reportagem em Dinheiro sobre a turbulência na Bolsa trouxe opinião do economista-chefe do banco WestLB, Roberto Padovani.

Na página seguinte, ele foi novamente ouvido, sobre ‘contágio do fluxo comercial’. Em outra, comentou a queda das cotações das commodities (no ‘Aurélio’, ‘produtos primários’, especialmente ‘de grande participação no comércio internacional, como café etc’).

A repetição evidencia menos uma gama limitada de fontes e mais a predileção por gente e instituições das finanças, em detrimento da economia produtiva e ‘real’. Pode haver mais equilíbrio.

Outra sugestão: evitar ou explicar o ‘economês’. Na crise, novos leitores procuram se informar. Ninguém é obrigado a saber o que significa ‘vencimento de contratos’ na Bovespa ou mesmo ‘commodities’.’

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‘A Folha contra o ‘Cansei’’, copyright Folha de S. Paulo, 19/8/07.

‘Angeli e José Simão são privilégio dos leitores da Folha. Para mim, dos melhores talentos do jornal. Na sexta-feira, inspirados, eles dardejaram o ‘Cansei’, na data em que o movimento se manifestaria na praça da Sé. Cartum e coluna expressam opinião. É bom que o jornal a contemple com pluralidade.

Nos dias anteriores, entretanto, o noticiário sobre a organização capitaneada pela OAB-SP, sindicatos patronais, e personalidades ligadas ao PSDB pareceu enviesado, anti-‘Cansei’.

Na quarta, o jornal entrevistou a atriz Cristiane Torloni. Na quinta, a apresentadora Ana Maria Braga. A escolha das artistas deu a impressão de não haver ‘pessoas comuns’ com motivação autêntica para aderir ao grupo que elas consideram -e é- legítimo. O território noticioso tomou-se de tom, ainda que sutil, contra o ‘Cansei’.’

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‘‘Painel do Leitor’ ou ‘Painel do Assessor’?’, copyright Folha de S. Paulo, 19/8/07.

‘O jornalista Adilson Laranjeira é um ótimo assessor de imprensa do deputado Paulo Maluf (PP-SP). Exerce a função com eficiência e determinação. Conforme levantamento do ‘Painel do Leitor’, a Folha publicou 12 cartas suas em 2005, 11 em 2006 e oito neste ano. A penúltima no sábado retrasado, a última na terça.

O missivista está certo em escrever. A Folha, que integra um grupo jornalístico no qual Laranjeira trabalhou, é que está errada. Manifestação de políticos e assessores deve sair como declaração entre aspas na editoria que veiculou as informações contestadas.

Leitores protestam contra a ‘invasão’. Vêem um ‘Painel do Assessor’ preterindo ‘anônimos’ que só têm aquele espaço em favor de figurões (e porta-vozes) habitués de outras páginas. Assino embaixo.’