A expressão ‘caça às bruxas’ é de domínio popular. Todos a ouvimos em algum momento de nossa história pessoal. O que nem todos conhecem a fundo é a origem do termo. A História ocidental registra o período compreendido entre a segunda metade da Idade Média e o início da Idade Moderna em que o Tribunal do Santo Ofício, também conhecido como a Inquisição, promovia verdadeiros espetáculos de julgamentos e execuções para aqueles que fossem acusados de heresia e bruxaria. Bastava o testemunho de um vizinho, de um desafeto e o destino da vítima estava selado.
Pelos registros que chegaram aos nossos dias, o que se pode perceber é o grande prazer que as execuções causavam à massa ignara. Pois bem, na última semana, após o relativo cansaço causado pelas repetidas denúncias contra parlamentares, governo e obscuros assessores apanhados em circunstâncias exageradamente constrangedoras, para se dizer o mínimo, o movimento capitaneado por significativos setores da mídia paulista resolveu que era hora de cortar cabeças. Ou queimar corpos, se preferirmos a metáfora da Inquisição.
Comentaristas e editorialistas ‘descobriram’ que relatores e presidentes das CPIs do Mensalão e dos Correios estavam fazendo corpo mole, preparando, como se diz no jargão político, a chamada pizza. Resultado: na mesma semana os parlamentares das duas Comissões resolveram juntar forças e encaminhar 18 nomes para a Corregedoria da Câmara Federal. Uma resposta contundente àqueles que levantavam suspeitas sobre um possível acordão. A massa terá seu sangue.
Livros de História
Tem se tornado cada vez mais óbvio que muitos ilícitos foram cometidos e que há diversos envolvidos que devem responder por seus atos. O problema nessa história toda é que as verdadeiras pressões e o grande debate não estão sendo conduzidos. E a tal da reforma política? Por que o presidente da República vai à TV dizer que a prática do caixa 2 é comum na política brasileira e apenas algumas vozes na mídia se levantam para questionar tal afirmação? Afinal, como funciona essa promiscuidade entre o público e o privado? Por que existiriam empresários interessados em financiar campanhas de todas as cores e agremiações, sempre sob o manto do anonimato das doações sem recibo? Pautas, pautas, pautas.
Mais uma vez a imprensa brasileira, pelos menos até aqui, vem perdendo uma grande oportunidade de passar o Brasil a limpo. De ir a fundo nas questões e de tornar a discussão sobre política algo atraente e útil para a sociedade e não de reforçar a imagem de decadência e desencanto.
Curiosamente muitos dos que rugem furiosamente pedindo algumas cabeças, em nome do Santo Ofício midiático, são os mesmos que noticiaram de maneira estrondosa as denúncias de doleiros mafiosos, cafetinas e outras personagens de credibilidade duvidosa como algo peremptório. O paralelo é inevitável porque o que se passa a questionar não é a (in)competência da prática jornalística, mas as possíveis intenções que se escondem por trás das mesmas.
Diante de tais incoerências e voltando para os livros de História, é lícito perguntar: será que todos os denunciantes acreditavam que seus vizinhos eram realmente bruxos?
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Jornalista