Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A mídia em defesa das mulheres

O ano de 2009 promete um novo comportamento da mídia em relação à violência doméstica. Foi um começo tímido – uma matéria de uma coluna em meia página do Estado de S.Paulo e matéria de duas páginas em Claudia – mas que já dá esperanças de uma sensibilidade maior da imprensa para com os problemas de suas leitoras.

Matérias – pequenas ou grandes – não vão resolver o problema, mas pelo menos ajudam as mulheres a ver que, se são vítimas, não estão totalmente desamparadas. E, o que é melhor, mostram que elas devem reagir.

A matéria do Estadão registrou a mais recente pesquisa sobre o tema, que tem um enfoque interessante: por que as vítimas continuam vivendo com seus agressores.

‘Uma pesquisa realizada na cidade mineira de Uberlândia mostra que o principal motivo que leva mulheres vítimas de violência doméstica a continuar com seus agressores é a esperança de que o relacionamento venha a melhorar no futuro. O medo de ameaças, a situação financeira difícil e a existência de filhos são outras razões. De acordo com os dados levantados, a cada mês, pelo menos uma mulher é morta no município nessas circunstâncias’ (O Estado de S. Paulo, 1/1/2009).

‘Homem que bate é criminoso’

Diz mais, o jornal:

‘Entre as mulheres assistidas pela ONG, 36,9% disseram que as causas das agressões foram os vícios do marido (álcool ou drogas); 19,9%, ciúmes; 15%, raiva; 12,8%, infidelidade; 5,9% situação financeira; 2,6%, recusa sexual; e 1,4%, filhos… As vítimas tinham entre 18 e 39 anos, em 70% dos casos; 41% eram empregadas domésticas ou donas de casa.’

O que se pode cobrar do jornal é um aprofundamento da pesquisa, o que pode ser feito em duas partes. A primeira, discutindo a situação dessas mulheres que se vêem forçadas a permanecer na relação por falta de condições de sustentar os filhos. A segunda matéria seria um prato cheio para especialistas, considerando que vício e raiva estão entre os motivos apontados para a violência.

A matéria de Claudia, intitulada ‘Não à violência doméstica’, foi baseada num fórum realizado pela revista e faz referência a outra pesquisa, da Fundação Perseu Abramo:

‘A cada 15 segundos, uma brasileira sofre com a violência doméstica, de acordo com uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo. (…) A violência doméstica está em todas as classes sociais, atinge cada vez mais jovens e mata mais do que o câncer, as guerras e os acidentes de trânsito. Homem que bate é criminoso, não deve ser tratado apenas como vítima de uma patologia’ (Claudia, janeiro de 2009).

Um primeiro passo

Embora a pesquisa divulgada pelo Estadão seja limitada a uma cidade e uma classe menos favorecida, a matéria de Claudia afirma que a classe social não é determinante nos casos de violência doméstica. É o que disse à revista Ana Paula Portella, coordenadora de pesquisas do SOS Corpo:

‘Embora em alguns casos o homem possa sofrer de um distúrbio de personalidade, a violência masculina não deve ser vista como um problema psicológico. Não é possível traçar um perfil exato do agressor. Ele pode ter sido vítima de pai violento ou não, ter diploma universitário ou não. O agressor pertence a todas as classes sociais e está em todas as regiões do país. Nas camadas mais pobres da sociedade, a violência aparece mais porque, como revela pesquisa do Ibope de 2008, as mulheres das classes A e B têm vergonha de denunciar.’

Mas, de todas as convocações feitas pela matéria, a mais interessante é a de Maria da Penha, a mulher que deu nome à lei de proteção das mulheres agredidas:

‘Se uma casa começa a pegar fogo, os vizinhos chamam os bombeiros, arrombam a porta, fazem tudo para salvar quem está lá dentro. O mesmo deve ser feito em relação à violência doméstica. É preciso denunciar o agressor e mesmo o policial que não toma as medidas previstas na lei.’

E continua:

‘O machismo é mais uma barreira para o cumprimento da lei. Prova disso são delegados e juízes preconceituosos ou despreparados que alegam que a Lei Maria da Penha é inconstitucional por favorecer a mulher em detrimento do homem. Há casos, inclusive, de juízas que perguntam para a mulher agredida se ela não quer dar mais uma chance ao marido.’

Tomara que a matéria de Claudia seja apenas o começo de uma efetiva campanha da revista em favor das mulheres. A violência não vai acabar por influência da imprensa, mas a divulgação do que as mulheres podem fazer para se defender pode ser o primeiro passo para melhorar a situação.

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Jornalista