O vereador Sebastião Melo (PMDB) quer revogar a lei racista nº 8.470, sancionada pelo prefeito Raul Pont (PT) em 21 de março de 2000, proposta pela vereadora Helena Bonumá (PT) – atual titular da Secretaria Municipal de Direitos Humanos. A lei foi aprovada na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, infelizmente, sem passar por mínimo e imprescindível exame. Ao fim, foi sancionada de igual modo apressado e irrefletido pelo então prefeito Raul Pont (novamente candidato a prefeito de Porto Alegre) com salientes e perniciosas deformações conceituais e sob a falsa alegação de ser socialmente inclusiva.
A Lei 8.470 utiliza-se de terminologia racialista, ao propor a classificação de indivíduos por critérios tipológicos raciais. A norma em vigor assume a existência de raças, a saber, branca, negra, amarela, indígena e outras (sic). O racialismo é precisamente a doutrina segundo a qual tal tipologia é cientificamente positiva. Trata-se de grosseira regressão a idéias originadas na paleoantropologia dos séculos 18 e 19, que resultaram na nefasta sociobiologia racista nazista.
Em sendo assim, a única explicação para que a administração municipal de Porto Alegre continue a crer na legitimidade da Lei 8.470 é que dela pretende auferir vantagem político-clientelista, justamente de uma norma conceitualmente degenerada, fundamentada na desinformação e na ignorância ética e científica.
Ressalte-se que o clientelismo político configurado numa espécie de populismo racial, no caso da Lei 8.470, é prática em si mesma retrógrada e, como tal, em nada faz avançar o combate a qualquer forma de discriminação racial e preconceito. Muito menos pode resultar em benefícios ao nível de políticas públicas nas áreas de saúde e educação.
Em manifestações na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, o Movimento de Justiça e Direitos Humanos desafiou o Poder Municipal a mostrar os alegados benefícios que decorreram, decorrem ou podem decorrer da implantação de um cadastro racial em Porto Alegre. Nenhuma resposta se ouviu em 3 anos e certamente não se ouvirá, porque de tal perversão não pode decorrer benefício algum para a população pobre e carente, em grande parte constituída por negros. Políticas públicas são universalistas, e não discriminatórias. E o racismo é uma patologia social, que exige constante combate, com instrumentos educativos e, sobretudo, com a efetiva implantação de condições igualitárias de acesso à saúde e à educação de qualidade para todos.
Decretocratas e racismo benigno
De tal lei e de tal malfadado cadastro, decorrem tão somente vergonha política, desrespeito aos direitos humanos e agressão à privacidade dos indivíduos, revelando sua natureza autoritária, arbitrária, discricionária e racista.
Como alguém pode ser compelido a enquadrar-se em alguma raça, se raças não existem? Como se pode defender a determinação, prevista no Art. 3º § 2º do Decreto nº 13.961, de 14 de novembro de 2002, que regulamenta a Lei 8.470 de 21 de março de 2000, e na qual está prevista a identificação de raça e etnia nos dados cadastrais da Administração Municipal. Segundo o decreto ‘na impossibilidade ou negativa de o declarante realizar o auto-reconhecimento de sua raça/etnia, o cadastrador o fará, fazendo constar tal fato em campo próprio do sistema de dados’.
Em outros termos, o cidadão, ao negar-se a racializar-se, será racializado pelo Estado, contra sua vontade. Aqui fica escancarada a malícia e a desfaçatez dos decretocratas raciais: um funcionário discricionariamente deve fazer constar do cadastro municipal, a raça (ou etnia) de um cidadão. Com qual propósito? Com que direito? O funcionário certamente deverá ser treinado por alguma cartilha racista, para que possa cumprir aquilo que atualmente a Administração Municipal lhe impõe fazer.
Nossos decretocratas que representam o racismo benigno, como a secretária Helena Bonumá e o atual prefeito João Verle, que assinam o Decreto 13.961, defendem uma modalidade que se pretende não-lesiva de preconceito. Mas isso não passa de ignorância petulante, cujos efeitos são potencialmente tão graves e negativos como os efeitos da decretomania nazi-racista.
Ariano ou sumeriano?
Não se lê ou ouve na imprensa discussão sobre o assunto. Quanto aos nossos decretocratas raciais, ele deveriam compulsar a literatura sobre o racismo e o nazismo. Nela descobririam seus predecessores que, aliás, não deixaram de enfrentar problemas, mesmo sendo racistas convictos e não apenas meros demagogos raciais que se dizem bem intencionados. Exemplificamos: desde 15 de setembro de 1935, quando foram decretadas a Lei de Cidadania do Reich, a Lei de Proteção do Sangue e da Honra Alemãs e o Primeiro Regulamento para a Lei de Cidadania do Reich – este em 14 de novembro de 1935 (o conjunto dos três ficou conhecido como as Leis de Nuremberg) –, a condição judaica foi transformada numa subcondição humana na Alemanha e os judeus foram desprovidos de qualquer vestígio de direitos civis. A definição de ‘judeu’ consta do Primeiro Regulamento, Artigo V:
1. Um judeu é um indivíduo que descende de pelo menos três avós que eram judeus racialmente puros. O Artigo II, parágrafo, alínea linha 2 será aplicado. (Art. II, alínea 2: um indivíduo de sangue misto judeu é aquele que descende de um ou dois avós que eram judeus racialmente puros, mesmo que não seja um judeu de acordo com a seção 2 do Artigo V. Avós com 100 por cento de sangue judeu são aqueles que pertenciam à comunidade religiosa judaica).
2. Um judeu é também um indivíduo que descende de dois avós puramente judeus:
(a) se era membro de uma comunidade religiosa judaica quando esta lei foi editada, ou se integrou a uma, após a edição desta;
(b) quando a lei foi editada, era casado com uma pessoa judia ou foi subseqüentemente casada com um indivíduo judeu;
(c) é descendente de um casamento no qual um dos cônjuges é judeu, no sentido da seção 1, contraído após a entrada em vigor da Lei para Proteção do Sangue e da Honra Alemã, de 15 de setembro de 1935;
(d) é descendente de uma relação extraconjugal que envolveu um judeu, de acordo com a Seção 1, e nasceu ou é filho ilegítimo nascido depois de 31 de julho de 1936.
Os nazistas enfrentaram problemas técnico-jurídicos com aqueles que tinham o status de ‘terceira-raça’, os mischlinge, muitos dos quais pertenciam a famílias alemãs ‘puras’, logo pretendiam ser quase arianos. Houve doze decretos posteriores editados para tratar desse assunto – objeto de discussão também na Reunião de Wannsee , nos quais foram introduzidas as categorias de mischlinge de ordem 1 (descendentes de um avô judeu) e 2 (descendente de dois avós judeus, não pertencente à religião judaica e não casado com um judeu até 15 de setembro de 1935). Para a quase totalidade desta terceira raça, a solução foi o aprisionamento em asilos, que ao fim terminou com a deportação e o extermínio. Houve, no entanto, mischilinge, por decretos conhecidos como normas de libertação, arianizados e alguns chegaram mesmo a exercer cargos na alta burocracia nazista (ver Raul Hilberg, The Destruction of the European Jews, New York-London, Holmes and Meyer, 1985).
Como se vê, a rasteira convicção nazi-racialista não impediu que seus operadores enfrentassem problemas ‘técnicos’.
De igual modo, o que dizer dos problemas que os funcionários da Prefeitura de Porto Alegre enfrentam? Como definir um ‘amarelo’, um ‘branco’ ou um ‘negro’? Pode-se pensar em definições como as propostas pelas Leis de Nuremberg. Qual a diferença entre raça e etnia? Alguém diz que é negro por parte de pai, meio branco e meio índio por parte de mãe. O que constará no cadastro dessa pessoa? Ou se disser que é negro, apesar de sua cor ser branca? Ou o contrário? Quem será capaz de provar que ele fala a verdade ou mente? Com que método? E se disser que sua raça é ‘outra’, por exemplo, que é ariano ou sumeriano? Ou se alegar que pertence à raça do prefeito, mas que sua etnia é a mesma que a da secretária municipal de Direitos Humanos? Ou, por fim, se simplesmente chamar o funcionário de racista?
Malária grave
Tem-se alegado que políticas públicas serão implementadas a partir do cadastro racial. A lei tem três anos e sua regulamentação, mais de um ano. Em que resultaram? No âmbito da saúde pública, por exemplo, cabe citar justificativa trazida ao processo pela ilustre vereadora Clênia Maranhão, então como presidenta da Cece, segundo a qual essa malsinada lei, entre outras motivações, surgiu ‘…para que problemas de saúde específicos da etnia possam ser identificados, como é o caso da anemia falciforme’.
Descontemos a discussão sobre a diferença entre raça e etnia, que é uma diferença sem uma distinção. Descontemos também a completa indiferença da mídia gaúcha e brasileira, que não concedeu uma linha sequer ao assunto, sequer para noticiá-lo, desde que a revogação da lei foi proposta. No que importa, a anemia falciforme é uma doença letal e deve-se ter o cuidado em distinguir, mais uma vez, entre assuntos sérios de ordem biológica e assuntos de ordem racial, que não passam de fetiches perniciosos.
A anemia falciforme ocorre em indivíduos de cor negra e é incurável; logo não pode ser evitado, por qualquer intervenção exógena, que seus portadores morram muito jovens devido a ela. Crianças homozigóticas (que apresentam um par de genes alelos iguais para uma determinada característica) – no caso, para o gene da hemoglobina falciforme (uma mutação do ramo BETA que substitui o glutamato, uma proteína, da posição 6, por uma proteína distinta, a valina) –, apresentam taxa de sobrevivência próxima de zero. No entanto, a mesma hemoglobina, em indivíduos heterozigóticos (indivíduos cujos genes alelos são diferentes), não causa morte. Em heterozigotos, o gene da hemoglobina falciforme é recessivo – e atua como agente de proteção contra a malária grave (causada pelo protozoário Plasmodium falciparum).
Concluem os pesquisadores que, na África subsaariana, onde 1 milhão de crianças morrem anualmente devido à malária grave, a pressão ambiental que essa doença infecciosa (a malária) exerce é responsável pela presença do gene da hemoglobina falciforme em indivíduos heterozigóticos (ver Mandel, Douglas and Bennet, Principles and Practice of Infectious Disease, Churchill Livingstone, New York, Edinburgh, London and Tokio, 1996, pp. 2.417/18).
Designação imposta
Não é admissível, muito menos inteligente, do ponto de vista científico, sustentar que uma decorrência da evolução humana em determinados ambientes, da qual resulta o surgimento de uma mutação genética específica, responsável por uma patologia hereditariamente transmissível, seja indicativo de uma característica racial. Ninguém é de uma raça porque pertence a um grupo mais propenso, por traços genéticos ambientalmente induzidos, a manifestar essa ou aquela patologia. Há incontáveis mutações genéticas, muitas patológicas, ambientalmente induzidas, específicas de grupos distintos, que as adquiriram em circunstâncias evolutivas.
A espécie humana é, em última análise, resultado de constantes mutações genéticas decorrentes de adaptações ambientais. No caso da Anemia Falciforme, todos sabem que ela incide em determinado grupo e quais são suas conseqüências. O chamado jornalismo científico tem ignorado o problema de forma constrangedora, porque em nível nacional tornou-se politicamente correto apoiar um sistema de cotas para negros nas universidades, sem que no entanto, ninguém possa conceder ao termo um sentido científico, sem aderir ao racialismo.
Nada, em termos de saúde pública, pode ser feito para combater a anemia falciforme. Pode-se apenas constatar a sua existência, o que, aliás, já foi feito há muito tempo. Para que essa mutação genética letal seja extinta, é preciso que a natureza atue. Ela não é uma doença contagiosa, não é adquirida por fatores de insalubridade, desnutrição ou epidêmicos. Para combatê-la, é necessário esclarecimento sobre como a natureza age sobre os homens, alterando com o tempo seus determinantes genéticos. Nesse caso, a natureza pode restringir progressivamente a incidência da patologia por meio da isogameta (uniões intergrupais), que produzirá cada vez mais indivíduos heterozigóticos para a hemoglobina falciforme e, desse modo, livres da anemia letal.
Os jornalistas que trabalham com informações científicas deveriam estar atentos à mentira racialista, porque o problema da segregação ou discriminação dos negros no Brasil tem sido distorcido por alegações pseudocientíficas. Distinções culturais, religiosas, lingüísticas, identidades históricas, traços fenotípicos e genotípicos não são distinções raciais. Cor da pele não é raça. ‘Negro’ é uma palavra de origem espanhola que significa cor preta e sequer tem sentido cultural ou identitário na África, de onde os negros da América provêm. ‘Negro’ tem origem no latim ‘nigru’, que por sua vez se origina do grego ‘necro’, que significa morte. Sua utilização para designar uma identidade grupal humana nem sequer foi escolhida pelo grupo que a palavra designa. Ela lhe foi imposta pelos europeus.
Modelo segregacionista
Pode alguém perguntar qual é a relação entre os conceitos ‘morte’ e ‘negro’. Explica-se: é mais do que sabido que os africanos egípcios acreditavam na vida após a morte e que o culto aos ancestrais era uma das marcas salientes da civilização egípcia. Os primeiros gregos a estabelecerem contato com a adiantada civilização do Egito Antigo (cerca de 2.500 anos AC) registraram a preocupação dos egípcios com a morte e aduziram à semântica do vocábulo ‘necro’ um traço designativo dos povos que cultuavam os ancestrais mortos. O moderno termo ‘negro’, por seu turno, foi usado pela primeira vez, sem conotação pejorativa, para designar os habitantes da África Ocidental, por exploradores espanhóis e portugueses, no início do século 16 (ver Ivan Hannaford, Race, The History of an Idea in the West, The Woodrow Wilson Center Press, Washington, D.C., 1996).
Mais tarde, trazidos aos milhões como escravos para a América, os então denominados negros foram subumanizados e tratados como mercadoria e, no Brasil, seus descendentes continuam a sofrer preconceito e discriminação, por razões histórico-culturais que devem ser analisadas com a devida atenção. Entretanto, combate-se o preconceito com a afirmação da indistinção da espécie humana e não com a demagogia de um multiculturalismo sectário, reafirmado com base em classificações raciais esdrúxulas, que justificaram a exploração colonialista, a escravidão, a segregação política, o extermínio e hoje ainda modelam ideologicamente o preconceito racial.
Pela Lei 8.470, vigente em Porto Alegre, indivíduos são obrigados a declarar o que não há para declarar ou não desejam declarar, porque ser negro ou cigano ou hispânico ou judeu é, na melhor das hipóteses, uma questão de inclusão identitária voluntária, de livre escolha e de foro privado. No que concerne objetivamente à sociedade e ao estado democrático de direito, há uma e apenas uma espécie humana, com uma enorme e diferenciada bagagem genética herdada evolutivamente. O racialismo e sua manifestação política, o racismo, são a negação da unidade do homem em sua diversidade histórica, cultural e ambiental. Apesar do que dizem os demagogos racialistas e do que não diz a imprensa brasileira, sabe-se lá por quais motivos, pois nesse tema seguramente não há controvérsia.
Em não sendo biologicamente sustentável em termos conceituais, o racialismo torna-se instrumento de demagogia política, disseminação de irracionalidade e violação dos direitos humanos, dos quais é exemplo a lei até agora em vigor em Porto Alegre. Na época em que foi sancionada, o então deputado federal Aldo Rebelo, do PC do B, hoje ministro da Coordenação Política do governo Lula, disse acertadamente: ‘Essa lei só vai estimular o preconceito. O último país que teve esse tipo de cadastro foi a Alemanha’. E ainda: ‘Esse cadastro segue o modelo multiculturalista dos Estados Unidos. É uma forma de apartheid civilizado, mas é apartheid. É lamentável que uma prefeitura de esquerda tenha adotado esse modelo norte-americano de segregacionismo’ (Zero Hora, 25/3/00, p. 36).
Interesses mesquinhos
Impressiona como a discussão do racialismo benigno, que nos traz vergonha, não aparece na imprensa, especialmente naquela parte da imprensa que se diz especializada em ciência. Dizem os pesquisadores Flávia C. Parra, Roberto C. Amado, Roberto R. Lambetucci, Jorge Rocha, Carlos M. Antunes e Sérgio D. J. Pena, respectivamente dos departamentos de Bioquímica e Imunologia e Parasitologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto:
‘Se considerarmos algumas peculiaridades da história e da estrutura social brasileiras, podemos construir um modelo para explicar a razão pela qual a cor deve ser tomada como um precário indicador de ancestralidade africana a um nível individual. A maioria dos africanos possuem pele negra, geneticamente determinada por um número muito pequeno de genes que foram selecionados evolucionariamente. Assim, se contamos com um sistema social de identificação racial baseado primariamente no fenótipo, tal como ocorre no Brasil, classificamos indivíduos com base na presença de certos alelos em um pequeno número de genes que possuem impacto na aparência física, enquanto ignoramos todo o restante do genoma. … Nosso estudo torna claros os perigos de se igualizar cor ou raça com ancestralidade geográfica e de se usar de modo intercambiável termos tais como branco, europeu ou caucasiano, por um lado, e negro ou africano ou outro qualquer, por outro lado.’ (‘Color and genomic ancestry in Brazilians’, in: Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 100, January 7, 2003)
Em outro estudo, intitulado ‘Retrato molecular do Brasil’ (Ciência Hoje, vol. 27, nº 159, abril de 2000), Sérgio Pena, Denise R. Carvalho Silva, Juliana Alves Silva, Vânia F. Prado (Departamento de Bioquímica e Imunologia, UFMG) e Fabrício F. Santos (Departamento de Biologia Geral, UFMG), enfatizam:
‘A razão pela qual ‘raça’ está entre aspas no texto é que, embora o IBGE ainda use o termo, ele é mais uma construção social e cultural do que biológica. Do ponto de vista genético, não existem raças humanas. O homem moderno distribuiu-se geograficamente e desenvolveu características físicas, incluindo cor da pele, por adaptação ao ambiente de cada nicho geográfico. Geneticamente, no entanto, não houve diversificação suficiente entre esses grupos geográficos para caracterizar raças em um sentido biológico, como mostrou recentemente o geneticista americano Alan Templeton. Isso introduz uma dificuldade: como podemos nos referir a certos grupos, como os índios brasileiros? Uma nomenclatura que tem sido crescentemente usada é a de ‘etnias’, que deveriam ser definidas (de modo muito amplo) como grupos populacionais que têm características físicas ou culturais em comum. A definição de etnia como ‘um grupo biológico e culturalmente homogêneo’, dada pelo Novo Dicionário Aurélio (1ª edição), é errada. Não existe na Terra nenhum grupo biologicamente (nem culturalmente) homogêneo’.
Não há razão sequer remotamente plausível para aceitar a vigência em Porto Alegre de uma lei que não apenas postula a abjeta distinção racialista, como ainda cria um infame cadastramento racial, instrumento que brutaliza as relações entre os indivíduos e o Estado. Manter tal aberração anti-humanista no âmbito legal do município é ceder ao populismo racial, ao apartheid de aparência benigna e à mentira clientelista, que pode contemplar interesses mesquinhos e garantir alguns empregos públicos para quem se toma por tutor da comunidade negra. Mas certamente tais expedientes e interesses não condizem com as reais demandas dessa comunidade ou com o avanço da consciência dos negros brasileiros sobre sua história, que é parte significativa da história de todos os brasileiros. Nem contribui para sua impositiva e altiva inserção em todos os setores da nossa sociedade.
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Filósofo e jornalista, Porto Alegre