Badalado pela mídia brasileira, o Orkut tem seu outro lado: ele reúne comunidades virtuais nazistas, racistas ou que cultivam ódio a crianças, velhos, argentinos, nordestinos. Há quem entre no site para declarar seu desprezo pelos pobres. Para divulgar idéias como ‘matar baianos’ ou estuprar uma criança de 4 anos. Não são somente pessoas isoladas, mas grupos com dezenas ou até milhares de pessoas mostrando no site da vez o que a sociedade brasileira – ou aquela que tem acesso à internet – possui de pior.
Uma das comunidades contra baianos chama-se ‘Baiano Bom é Baiano Morto’. Contra velhos, há a ‘Odeio Velhos’ e a ‘Odeio Velhos Gordos’. A comunidade ‘No Escuro’ mantém um tópico com a defesa da pedofilia. Grupos separatistas ou contra nordestinos são comuns. A comunidade ‘Pedofilia – a Banda’ trazia até o início de agosto uma foto em que um bebê aparecia numa montagem ao lado de um pênis, levando uma chuva de esperma.
Os grupos nazistas no Orkut somam mais de mil integrantes – a maior parte brasileiros. No ‘White Pride Skinheads 14’, o moderador ensina a criar células de uma organização nacional-socialista. No ‘Nazismo’, ilustrado pela suástica, um estudante de Juiz de Fora define a ação na Alemanha como ‘um baita serviço de preto, porque já que eles se propuseram a exterminar uma raça maldita porque não cumpriram o objetivo de forma decente’.
O presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo, Jayme Blay, já enviou representação ao Gradi (Grupo de Repressão e Análise dos Delitos de Intolerância), da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo. ‘O racismo, a pedofilia, o anti-semitismo, são todos crimes, não importa se é um cartaz colado no poste ou no Orkut’, diz o advogado Walter Vieira Ceneviva, especialista em Direito das Telecomunicações.
Frases racistas são emitidas por pessoas com nome e sobrenome. Comunidades com até milhares de pessoas permitem a proliferação do sadismo. Na comunidade ‘Eu Odeio Crianças’, com 367 membros, uma jovem de 19 anos conta com prazer como viu um bebê de 2 anos cair no Parque da Mônica.
A designer de multimídia Marília Alves tentou defender a criança de 4 anos que participa de comercial da Embratel. Foi ameaçada de estupro. Isso ocorreu na comunidade ‘Eu tenho medo da Anã (sic) Paula Arósio’, com 4.822 pessoas. A miniatriz também foi ameaçada de estupro ‘cruel’. ‘O que me assusta é as pessoas continuarem ali depois disso’, diz Alves.
As comunidades que humilham a imagem da menina, à margem do Estatuto da Criança e do Adolescente, somam mais de 7 mil pessoas. No grupo ‘Eu Odeio a Menininha do 21′ o moderador, um argentino, diz que quer reunir pessoas com vontade de dar ’21 socos na cara dela’.
Mundo pequeno
O círculo do ódio dá voltas. Um norte-americano criou uma comunidade para discutir a presença brasileira no Orkut e provocou reações desproporcionais, apesar de declarar que o objetivo não era cultivar o ódio. No Brasil os grupos antiargentinos, como o ‘Eu Odeio a Argentina’, somam mais de 800 inscritos. Em um deles o moderador pergunta quem tem vontade de ‘dar um tiro na cabeça de um idiota usando a camisa da seleção Argentina’.
Há algumas contrapartidas, como a comunidade ‘Argentinos Brasileiros Unidos’, com 1.400 membros, ‘Diga Não à Pedofilia’, com 212 pessoas, ‘A Aninha Arósio é Muito Fofa’, com somente 61 integrantes, ou uma contra o criador da ‘Eu Odeio Baianos’, com 30.
Segundo o promotor de infância Vidal Serrano Junior, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, a Constituição garante a liberdade de expressão, desde que não haja conflitos de direitos, como no caso do racismo, mas não o anonimato, recurso permitido pelo Orkut.
Conforme a Polícia Federal, o Orkut não pode ser punido por ser hospedado nos Estados Unidos. Nas regras do próprio site está prevista a exclusão de material que promova o ódio ou divulgue material ofensivo baseado em raça, etnia, religião, gênero ou orientação sexual.
A opção é denunciar à Polícia e ao Ministério Público, por carta, telefone ou e-mail cada indivíduo que cometer abuso. ‘No caso do Orkut é mais difícil encontrar a pessoa, mas não é impossível’, diz Luiz Fernando Cunha, do Serviço de Perícia em Informática do Instituto Nacional de Criminalística da PF. Ele também está no Orkut.
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Editor e repórter da Agência Repórter Social