De repente, não mais que de repente, grandes jornais do mundo ocidental entraram em crise financeira aguda. Entre eles o New York Times, ícone do capitalismo ocidental, o El País, símbolo do novo expansionismo ibérico, os poderosos Chicago Tribune e o veterano Christian Science Monitor. Estão sem caixa. Alguns venderam seus prédios, outros buscam injeções de capital, redações foram reduzidas à metade. O Christian Science Monitor deixou de vez a forma impressa, ficando só na internet. Será o começo do fim da era dos grandes jornais?
Ignácio Ramonet apontou, no Fórum de Mídia Livre de segunda-feira (26/1), para a estreita relação, quase que orgânica, entre o capital financeiro e os grandes grupos de mídia. É como se os bancos fornecessem o combustível dos conglomerados midiáticos. Quando advém o estrangulamento do crédito, principal mecanismo desta crise depois do colapso dos grandes bancos americanos e alguns europeus, precipita-se uma situação de insolvência que já vinha tomando forma desde que a internet começou a comandar a dinâmica do jornalismo.
Para Ramonet , o aprofundamento e o espalhamento da recessão econômica, etapa seguinte desta crise, afeta profundamente o modo de produção da grande mídia, principalmente ao reduzir sua principal fonte de financiamento, a publicidade.
São três pauladas sucessivas na grande mídia impressa. Primeira paulada: o esvaziamento de suas funções pela internet, processo de natureza estrutural que deverá se aprofundar. Segunda paulada: o estrangulamento do crédito, fator apenas temporário mas que precipitou decisões radicais, algumas irreversíveis. Terceira paulada: a queda das receitas publicitárias, que está apenas no começo, devendo perdurar pelo tempo das grandes recessões, em geral três a cinco anos.
Ocupar espaços
Os grandes jornais já vinham sofrendo há muito tempo a erosão de suas funções editoriais principais, apontaram nessa mesma sessão do Fórum os jornalistas Pascual Serrano do site Rebelión, e Luiz Navarro, do La Jornada. Na invasão do Iraque, por exemplo, a grande mídia americana tornou-se uma disseminadora de mentiras geradas pelo governo. Com isso, negou sua função jornalística principal de asseverar verdades. Também perdeu sua função mediadora, na medida em que abandonou a mediação dos grandes problemas que efetivamente interessam à população. E mais; perdeu legitimidade, perdeu autenticidade.
Conclusão: mais empresas e grupos midiáticos devem fechar jornais nos próximos meses. O novo príncipe, como Octavio Ianni definiu o poder midiático dos nossos tempos, está em crise existencial.
Bom para a democracia? Talvez não. Ruim com os grandes jornais, pior sem eles. A democracia de massa precisa meios de comunicação de massa para funções de mediação e agendamento do debate nacional e mundial, que a mídia pequena ou alternativa não tem escala para exercer.
O que interessa à democracia é que esse espaço, o da comunicação de massa, seja habitado por uma mídia mais plural, mais comprometida com os valores humanos e menos com os ditames do capitalismo. Vários participantes desse debate apontaram para a necessidade do campo popular disputar a hegemonia da grande imprensa, com projetos de mesmo porte.
Também foram cobradas políticas públicas mais audazes de democratização do espaço midiático por parte dos novos governos da América do Sul. E mais empenho das entidades mais poderosas da sociedade civil na ocupação desse espaço. A hora é agora, quando a crise jogou os tycoons da comunicação na defensiva e as novas tecnologias favorecem o pluralismo no espectro eletromagnético e barateiam a produção dos meios impressos.
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Jornalista e professor da Universidade de São Paulo, autor, entre outros, de A síndrome da antena parabólica: ética no jornalismo brasileiro (1996) e As Cartas Ácidas da campanha de Lula de 1998 (2000)