VENEZUELA
Chávez e os estudantes
‘A 20 dias do referendo no qual Hugo Chávez jogará a cartada decisiva para seu projeto autoritário, o presidente da Venezuela demonstra dificuldades em lidar com uma força opositora emergente: as marchas de dezenas de milhares de estudantes na capital, Caracas, e em outras importantes cidades.
A reação de Chávez é a de sempre. ‘São as classes ricas que querem manter sua coesão social; são os mesmos que apoiaram o golpe de 2002.’ Tudo não passaria de uma ‘nova arremetida fascista’ inspirada pelo governo dos EUA. Mas a velha ladainha que atiça o ódio sectário entre ricos e pobres e invoca o fantasma imperialista tem menos chances de prosperar desta feita.
Quem protesta não é a carcomida elite política derrotada por Chávez -nas urnas e na reforma institucional que veio agigantando o poder presidencial. Tampouco é o seu braço midiático, ambos associados à tentativa fracassada de golpe, apoiada por Washington, em abril de 2002.
São estudantes da maior universidade do país -a pública e gratuita UCV (Universidade Central da Venezuela), com um corpo discente (70 mil) comparável ao da USP- que lideram as marchas. Querem adiar o referendo em que Chávez pleiteia a reeleição ilimitada e o poder de decretar estado de exceção por tempo indeterminado, com censura à imprensa.
Protestos assim constituem obstáculos difíceis de contornar até mesmo para regimes truculentos. A repressão contra massas de jovens estudantes tende a produzir estragos na popularidade do caudilho. Apostar no cansaço do movimento também é arriscado e pode redundar, igualmente, em desgaste -ou derrota.
Talvez por isso tenha entrado em ação uma espécie de SA chavista, se é o caso de evocar o fascismo. Grupos de apoio ao presidente despacham pistoleiros montados em motocicletas para espalhar o terror nas manifestações. Pelo menos nove estudantes já foram feridos, três à bala num campus da UCV.
Em vez de condenar o absurdo, Chávez continua incitando ao ódio. Desempenha o papel clássico do líder que empurra uma nação para o desastre.’
CENSURA
Justiça impede jornal de citar Olavo Calheiros em reportagens
‘O deputado federal Olavo Calheiros (PMDB-AL), irmão do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), conseguiu na Justiça de Alagoas liminar que impede o jornal ‘Novo Extra’, de Maceió, de citá-lo direta ou indiretamente em suas reportagens.
A decisão da juíza Maria Valéria Lins Calheiros, da 5ª Vara Cível de Maceió, foi dada a partir de um pedido de reparação de danos protocolado pelo deputado em 15 de outubro. A liminar foi expedida um dia depois.
‘Defiro, em parte, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para vedar a publicação no jornal ‘Novo Extra’ de qualquer matéria que atinja direta ou indiretamente a pessoa do autor’, diz trecho da decisão.
Fernando Araújo, editor-chefe e um dos sócios do jornal, disse que não ter sido notificado oficialmente até ontem. ‘É censura prévia contra o jornal. Não tenho dúvidas disso’, disse Araújo.
O jornal ‘Novo Extra’ circula às sextas-feiras, em Maceió, com tiragem de 6.000 exemplares. Segundo o editor-chefe, há cerca de dois anos intensificaram-se as reportagens contra Calheiros, especialmente de eventuais crimes ambientais e violência contra trabalhadores.
A Folha deixou recado no escritório do deputado, mas nem ele nem a advogada Regina Célia Barbosa de Medeiros responderam.’
YOKO ONO
‘E teve gente que pagou…’
‘O que você espera da performance de Yoko Ono? ‘Nada’, respondem Supla e Tomie Ohtake ao repórter Paulo Sampaio antes do começo do show de Ono, anteontem, no Teatro Municipal. Ambos preferem aguardar ‘uma surpresa’. Na mesma frisa do filho de Marta, Eleonora Mendes Caldeira diz que foi para ver ‘a cara’ da sua geração. ‘É a coisa do corpo que ela representa na minha memória. A coisa do ‘Imagine’.’
Eleonora discorda dos que acham que Ono não passa da viúva de Lennon. ‘Imagina! Ela conseguiu criar uma personalidade própria. Pensa nas mulheres dos outros Beatles. Mesmo a do Paul, coitadinha, como é o nome dela? Aquela da Kodak… (Linda Eastman)’ Como Supla e Tomie, Eleonora foi à apresentação ‘ver o que é’.
A cantora Adriana Calcanhoto, não. Diz que é fã faz tempo da japonesa, e que o hit ‘Devolva-me’ foi feito ‘a partir de uma instrução para cinema’ de Yoko, que ela descobriu em uma viagem a Tóquio.
O show começa. A artista entra de terno branco, manda um beijo com as duas mãos para a platéia, tira a roupa e fica toda de preto. Improvisa um atrapalhado pas-de-deux com uma cadeira de botequim. Palmas. Nova entrada: de gatinho, enroscada num véu branco, ela se arrasta durante um minuto e sai. Silêncio. Yoko agora recita ‘Listen to your heart, just intuition, make a manifestation’. Repete. Muitas palmas e gritos de ‘Uhu!’. A banda toca um samba e Yoko saltita com os braços levantados e plumas nos ombros. O teatro vem abaixo. O povo começa a se levantar. Acabou? Para muitos, sim.
‘E teve gente que pagou pra vir. Coisa de doido’, diz a socialite Andréa Moroni, convidada. ‘Havia uma milionária em Nova York que adorava ópera, mas cantava terrivelmente. Então, de vez em quando ela pagava para se apresentar em um teatro. Chamava 500 pessoas. Ficava todo mundo assim, ó (de boca aberta), sem acreditar’, diz o designer Attilio Baschera.
A performance da Yoko ajuda a entender o significado exato da expressão ‘fala sério’, diz a fotógrafa Vânia Toledo. Nem tudo são espinhos. A artista plástica Patrícia Franco achou tudo ‘lindo, dramático, mistura de clown (palhaço) com butô (representação japonesa)’. E Adrianha Calcanhoto: ‘Vim pra gostar. Gostei’.’
Fabio Cypriano
Com atuação simplista, Yoko Ono cria performance constrangedora
‘A ótima exposição que será inaugurada hoje, ‘Yoko Ono, uma Retrospectiva’, no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo, e mesmo a carreira da própria artista, uma das pioneiras da arte conceitual, parecem muito deslocadas em relação ao que foi visto anteontem, no Teatro Municipal, em ‘Uma Noite com Yoko Ono’.
Enquanto no CCBB estão algumas peças históricas, como as ‘Instruções’, e mesmo trabalhos recentes bastante significativos, a performance da última quinta foi de um simplismo estarrecedor.
Com um terno branco, Yoko entrou no palco e imediatamente tirou a roupa, revelando um conjunto de bermuda e camisa pretas. Contudo, uma ação que pretendia-se simbólica, como mudar a roupa glamourosa para outra escura e simples, foi vazia.
Em seguida, Yoko atravessou a moldura de um espelho, sem ele, que estava sobre um pequeno tablado coberto de tapetes. Mais uma ação de simbolismo frágil, como as várias que se repetiriam ao longo dos 55 minutos do espetáculo: entrar com o rosto coberto por um saco preto, arrastar-se dentro de um saco branco…
Às vezes, uma nostalgia profunda era vislumbrada, especialmente pelas imagens projetadas no imenso telão, como as de John Lennon, seja com o filho Sean, seja em manifestações de protesto.
Foi com os trabalhos daquele período, aliás, que o espetáculo teve alguns bons momentos. ‘Freedom’ (1970), um vídeo tipicamente feminista, de uma mulher que se debate para tirar o sutiã, com trilha de John Lennon, ao menos trazia um caráter histórico importante na vida da artista. Mas momentos assim foram raros.
Pior foi o final, quando o grupo de músicos que acompanhou a artista -ela cantou bastante, passou a tocar samba, provocando passos desequilibrados. Poderia ser charmoso, mas apenas culminou o roteiro de constrangimentos da noite. Ao final, Yoko arrancou muitos aplausos, como, aliás, já havia conseguido cada vez que entrava ou saía do palco. Afinal, era mito que o público queria e para quem quer mito, a mera presença já é suficiente, mesmo que embaraçosa.
Avaliação (performance): ruim’
PIRATARIA
Questão de Juízo
‘Efeito ‘Tropa de Elite’: o produtor Diller Trindade passou a gravar em cada cópia do longa ‘Juízo’, de Maria Augusta Ramos, o nome completo de quem a receberá e a data da entrega. A tarja fica na tela durante toda a exibição e não pode ser apagada.
‘É uma forma de responsabilizar o dono da cópia e evitar que seja pirateada’, diz.’
MÚSICA
Caetano, Osesp e Daniela Mercury levam Grammy
‘Caetano Veloso ganhou o Grammy Latino de melhor cantor e compositor pelo disco ‘Cê’, em cerimônia que aconteceu anteontem, em Las Vegas, nos Estados Unidos. O cantor derrotou, na categoria, o uruguaio Jorge Drexler, os cubanos Silvio Rodríguez e Amaury Gutiérrez, e o espanhol José Luis Perales.
Em uma categoria reservada a artistas brasileiros, Caetano levou ainda o Grammy de melhor canção brasileira, por ‘Não Me Arrependo’.
A Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) levou o Grammy de melhor álbum de música clássica, pelo CD ‘Beethoven Abertura Consagração da Casa Sinfonia nº 6’, sob regência do maestro John Neschling.
O Grammy de melhor álbum de música regional ou de raízes brasileiras foi para Daniela Mercury, por ‘Balé Mulato Ao Vivo’.
Também foram premiados os brasileiros Cauby Peixoto (melhor álbum de música romântica), Lenine e seu ‘Acústico MTV’ (melhor álbum pop contemporâneo) e Lobão (melhor álbum de rock), entre outros.’
ENTREVISTA/ GILBERTO GIL
‘Preciso de tempo para continuar fazendo o que mais gosto na vida: cantar’
‘Depois de cinco anos como ministro da Cultura, Gilberto Gil decidiu deixar o cargo. Ele concluiu que o ministério e a carreira artística não são mais conciliáveis. Não porque a segunda prejudique a primeira, como insinuam seus críticos, mas o inverso. Gil abolirá a rotina de discursos e audiências da agenda ministerial, para curar um dano diagnosticado em sua voz.
‘Até eu ter enfrentado isso, estar no ministério era uma questão aberta. Podia sair como podia ficar. Mas aí me defrontei com isso -a perda de qualidade vocal permanente, constante’, conta Gil.
Gilberto Gil conversa com a Folha como ministro da Cultura, em atividade oficial, em Belo Horizonte. Ele participa, na capital mineira, da ‘Teia – Tudo de Todos’, um encontro de manifestações da cultura popular incentivadas, segundo define, por ‘programas [do MinC] que vão além do jarro de flores clássico das elites, porque esse é um país feito de povo, com 70% de gente pobre, historicamente excluída, que precisa agora ter uma cara no mundo’.
Mas, ao descrever a decisão de deixar a pasta que assumiu em 2003 (com a condição expressa de que pudesse manter em paralelo sua atividade artística), Gil remonta às suas últimas férias no ministério.
Em turnê pela Europa no último mês de julho, o cantor Gilberto Gil conviveu com o temor do silêncio.
‘Pela primeira vez em muitos anos, tive de fazer uma excursão sob pressão da perda vocal. Isso me afligiu muito. Tive de me desdobrar em disciplina. Aí fui ao médico, quando voltei’, afirma.
‘Volta lenta’
Os exames demonstraram que, na corda vocal direita de Gil, onde um calo havia sido diagnosticado há dez anos, reincidiu um pólipo. O ministro o retirou numa cirurgia, há um mês, e está em tratamento desde então.
‘A volta da qualidade vocal está sendo muito mais lenta do que foi há dez anos, por questões de anatomia. As cordas vocais já não são as mesmas. Estou com 65 anos. Elas estão mais relaxadas, seu fortalecimento e robustez é mais difícil’, descreve Gil.
Surgiu então a incompatibilidade entre a prescrição de ‘dieta vocal’ e exercícios fonoaudiológicos, fundamentais para a recuperação, e o intenso uso que Gil faz de sua voz, em discursos, palestras, audiências e conversas ministeriais.
‘Preciso de tempo agora para continuar fazendo o que mais gosto na vida, que é cantar’, afirma ele.
O ministro definiu que deixa o governo em 2008, mas não fixou uma data para sua saída. Ele já prevê reações à imprecisão de seu anúncio.
‘Relativismo’
‘Vão dizer: ‘Ah, mas essa indefinição. Lá vem ele com os relativismos dele’.’ E antecipa sua réplica: ‘Não é relativismo. É relatividade’.
Gil afirma que ainda não tratou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre possíveis nomes que poderiam substituí-lo, mas está certo de que o futuro ministro da Cultura receberá a pasta com ‘projetos encaminhados e uma visão contemporânea e abrangente de cultura, razoavelmente compreendida e bastante absorvida pelos setores da classe média, da elite dirigente, da elite econômica e do povo’.
Em outras palavras, o ministro considera que avançou no objetivo anunciado em seu discurso de posse de ‘tirar o Ministério da Cultura da distância em que ele se encontra, hoje, do dia-a-dia dos brasileiros’.
Uma das principais metas de sua gestão, contudo, permanece por fazer -a reformulação da Lei Rouanet, de incentivos fiscais, que destinou cerca de R$ 2 bilhões à realização de projetos culturais, de 2002 a 2006.
Voluntarismo impositivo
Gil diz que a reforma da lei, prometida desde o primeiro mandato, está ‘sendo feita parcialmente, aos pouquinhos, submetendo o desempenho da lei à discussão pública’ e não foi plenamente realizada porque é ‘complexa’.
O ministro avalia que uma atuação mais incisiva da pasta nessa questão poderia desencadear uma crise semelhante à da Ancinav -’a grande discussão, a grande polêmica, o grande deflagrador de paixões e atitudes’ de sua gestão, ocorrida em 2004, quando o MinC tentou criar a Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual, submetendo ao Congresso um projeto de lei cujo impacto não havia sido previamente discutido e negociado com os setores atingidos.
Atitudes assim, diz Gil, podem ‘parecer voluntarismo impositivo, verticalização, vontade própria do governo, e não da sociedade’. No caso da Ancinav, ‘não era voluntarismo impositivo, mas ficou parecendo’, afirma o ministro, que faz sua autocrítica no episódio. ‘Houve precipitação nossa, no sentido de acreditar que a nossa boa-fé seria compreendida. Uma coisa que aprendi: na política, boa-fé é artigo escasso.’
Atualmente, o MinC lida com uma investigação interna e em curso também na Polícia Federal para apurar fraude nos processos de aprovação de projetos na Lei Rouanet. Uma funcionária da pasta está envolvida, além de um grupo de empresários.
O ministro diz que ‘todas as instituições se confrontam o tempo todo com desvios de conduta, infrações à regra’ e defende o desempenho do governo Lula no combate à corrupção. ‘Esse governo faz mais do que os outros no prestígio às instituições de controle e investigação. Não é igual. Faz mais, pelo menos pela minha memória histórica. E olhe que venho acompanhando governos pelo menos desde Juscelino [Kubitschek (1956-61)].’ Para Gil, ‘esperar que um governo tenha a capacidade de extinguir a corrupção é pedir muito, seja a quem for’.
TV Brasil
Defensor da atenção governamental às ‘novas mídias e futuras’, desde seu primeiro mandato, Gil afirma que ‘pode ser experimental’ a programação da TV Brasil, emissora pública federal prevista para estrear em dezembro, para a qual o secretário do Audiovisual Orlando Senna foi designado diretor.
‘Quem disse que a televisão vai ser superada? Sem a TV, a internet seria apenas um correio eletrônico’, diz Gil.
Na opinião do ministro da Cultura, ‘o grande atrativo da internet foi poder trazer a imagem dentro dela. Foi um golpe que a televisão não esperava sofrer tão cedo. Mas sofreu e teve que entender que a televisão é um microssistema nas comunicações. Não é tudo. Acabou a fase de uma coisa ser tudo. Acabou! Agora é democracia. É diferente’.
Nos cinco anos de gestão Gil, a superposição das atividades do ministro e do artista ensejou questionamentos sobre eventuais conflitos de interesses. No mês passado, a Comissão de Ética Pública, vinculada à Presidência da República, considerou ‘impróprio’ o uso de uma composição de Gil em comercial do banco Itaú. A propaganda reedita comercial de 1997.
Gil diz que o parecer da comissão não o incomoda, porque ‘é da atribuição da Comissão de Ética fazer juízos desse tipo. Mas a questão do juízo é outra coisa. Aí posso discordar, como discordo’. Para o ministro, ‘a suposição do conflito [entre sua atividade de ministro e seus interesses artísticos] é que leva a Comissão de Ética a dizer que não é adequado [o episódio do comercial]. É uma pressuposição. O fato mesmo é que tudo foi transparente e normal’, conclui Gil.’
TV NOS EUA
Greve dos roteiristas caminha para impasse
‘Em Los Angeles, a atriz America Ferrara, estrela de ‘Betty, a Feia’, junta-se aos manifestantes que fazem piquete em frente à produtora Raleigh, onde o seriado é gravado. Tem o crachá pendurado no pescoço e, a exemplo de todos ali, um cartaz na mão. Sandra Oh e Ellen Pompeo, atrizes de ‘Grey’s Anatomy’, também emprestam solidariedade aos grevistas em outra manifestação.
Em Nova York, um aviso na entrada do teatro Ed Sullivan informa que está suspensa a venda de ingressos para o talk-show ‘Late Show with David Letterman’. Lá perto, no Rockfeller Center, outro piquete.
Desde o início da semana, com a greve decretada pelas divisões Leste e Oeste do Writers Guild of América (WGA), o sindicato norte-americano dos roteiristas, cenas como essas modificaram a paisagem nas regiões onde se concentram escritórios e estúdios das produtoras de TV e cinema dos EUA.
Mais do que isso: já alteraram a rotina das operações no mundo do entretenimento, principalmente na TV. Talk-shows como o de Letterman e o de Oprah Winfrey foram afetados, pois boa parte dos programas é ocupada por comentários e piadas sobre notícias recentes. Sem roteiristas, nada feito.
Ontem, o astro Arnold Schwarzenegger, governador da Califórnia, declarou que agirá nos bastidores para tentar ajudar a resolver o impasse. ‘Eu acho que é muito importante resolver isso o mais rápido possível, porque a greve tem um enorme impacto econômico em nosso Estado’, afirmou.
A situação seria diferente com telefilmes e seriados, pois as produtoras teriam em estoque os roteiros necessários para as gravações que ocupariam a grade até o início de 2008. Séries como ‘The Office’ e ‘Two and a Half Men’ já tiveram sua escala de trabalho interrompida porque os produtores executivos, também roteiristas, paralisaram as atividades.
Outros, como ‘24 Horas’ e ‘Lost’, tiveram seu planejamento alterado e temporadas provavelmente serão reduzidas. A Fox e a CBS Paramount resolveram ontem jogar pesado e informaram oficialmente os produtores em greve de que não terão direito a nenhum de seus rendimentos se os programas sob sua responsabilidade não forem gravados de acordo com os cronogramas originais.
Endurecimento
Os produtores-roteiristas alegam que não há como desempenhar uma função se a outra está impedida. E já haviam sinalizado que voltariam ao trabalho se as duas partes (o WGA e o sindicato dos produtores) retomassem negociações ‘amistosas’. O endurecimento dos estúdios caminha no sentido do impasse.
Segundo o WGA (que já acionou seu fundo de amparo aos grevistas, prevendo ampla paralisação), os estúdios nem responderam as propostas do sindicato desde julho. Ponto central: aumento das alíquotas que cabem aos roteiristas provenientes de vendas em DVD e downloads pela internet.
De acordo com o dissídio coletivo que vigorava até 31 de outubro, as emissoras de TV pagavam no mínimo entre US$ 20 mil e US$ 30 mil por roteiro para o horário nobre. No caso dos que trabalham também como produtores, o salário anual pode chegar a U$ 5 milhões. Em Hollywood, o WGA estima que o rendimento médio anual dos roteiristas é de US$ 200 mil.’
Cinema vai demorar mais para sentir efeitos da paralisação
‘A greve decretada na segunda-feira pelo WGA corresponde à quarta paralisação dos roteiristas norte-americanos desde 1981. A mais longa, em 1988, durou cinco meses e gerou à indústria prejuízos estimados em cerca de US$ 500 milhões (mais de R$ 860 milhões).
A insatisfação canalizada pelo WGA está relacionada ao fato de que os cachês de atores e diretores teriam sido inflacionados nos últimos anos, provocando discrepância significativa em relação aos salários dos roteiristas, o que é mais sensível em cinema do que na TV.
De acordo com o dissídio coletivo que vigorava até 31 de outubro, os seis principais estúdios de cinema pagavam no mínimo US$ 106 mil (R$ 184 mil) por um roteiro original de longa-metragem. O prestígio do autor e o apelo do material podem levar o valor a US$ 4 milhões (R$ 6,9 milhões).
O impasse entre produtores e roteiristas deverá ser resolvido, como nas ocasiões anteriores, a partir do impacto sobre a televisão. A atividade cinematográfica demora mais a sentir os efeitos da greve devido a seus cronogramas mais longos de produção.
Diferentemente do que já ocorreu na televisão, as filmagens em andamento de longas para cinema não precisam ser interrompidas, uma vez que os roteiros estão concluídos. Nas situações em que cenas e diálogos precisem eventualmente ser reescritos, produtores e diretores podem assumir a função, como já costumam fazer.
Os diretores-roteiristas de cinema também não podem usar o argumento dos produtores-roteiristas de televisão, que paralisaram todas as suas atividades porque as consideram indissociáveis. Quando tem início a filmagem de um longa, é improvável que decisões relevantes dependam de algo ainda não escrito.
Além disso, a interrupção de uma filmagem leva a um desastre que todos os envolvidos procuram evitar, pelo estouro do orçamento e pela possibilidade de cancelamento definitivo da produção. Não é por acaso que, desde 1981, os diretores entraram em greve apenas uma vez, em 1987, e a paralisação durou três horas.
Nos grandes estúdios, os principais lançamentos para os próximos dois anos já se encontram em fase de pré-produção, com roteiro finalizado ou perto disso. O impacto de uma greve prolongada será mais sentido na discussão de projetos futuros, sem que o cronograma final seja muito afetado.’
Teté Ribeiro
Hit da temporada conta aventuras de paranormal
‘Ninguém esperava que a grande surpresa do outono norte-americano na TV acontecesse em um canal aberto, com um elenco de desconhecidos e inspiração no filme francês ‘O Fabuloso Destino de Amélie Poulain’ (2001). Pois aconteceu. O seriado se chama ‘Pushing Daisies’ e vai ao ar nos EUA às 20h das quartas, com uma hora de duração.
Criado por Bryan Fuller, ‘Pushing Daisies’ estréia no Brasil no começo do ano que vem, na TV paga Warner. Os primeiros dois episódios foram dirigidos por Barry Sonnenfeld (‘Homens de Preto’), também produtor-executivo e responsável pelas cores ultravibrantes de cenários e figurinos.
A história começa quando o protagonista, Ned (Lee Pace), descobre, aos nove anos, que tem o poder de reviver pessoas e animais com um leve toque. O garoto aprende a lição de um jeito duro: quando seu golden retriever Digby morre atropelado. Chocado, ele encosta no cachorro, que levanta como se nada tivesse acontecido.
Mas o ‘milagre’ tem seu preço. O garoto nunca mais pode tocar no que quer que seja que tenha revivido, ou a pessoa ou animal morre para sempre. E uma última coisa sobre trazer os mortos de volta: se ele não os fizer morrer de novo com seu toque ‘mágico’ em até um minuto, outra pessoa ou animal que estiver por perto morre.
Vinte e um anos mais tarde, Ned é confeiteiro e mora sozinho com o cão Digby, em quem não pode encostar, não namora nem tem amigos. Até que um detetive descobre o seu poder e o convida para ser seu parceiro em casos de assassinato.
A fórmula é simples: eles vão ao necrotério, revivem o morto por um minuto, ele conta quem o assassinou, os dois dividem a recompensa. O problema é que a segunda pessoa que Ned revive é Chuck (Anna Friel), a vizinha de infância por quem era apaixonado. Ele não resiste e a deixa viver. Ela não sabe quem a matou, mas descobre o segredo de Ned e decide ir junto nas investigações seguintes. Os dois ficam cada vez mais apaixonados, mas sabem que jamais poderão se encostar. Ou seja: não dá para parar de ver.’
JORNALISMO
ABI cria Salão do Jornalista Escritor
‘A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) inaugura oficialmente na quarta-feira o 1º Salão Nacional do Jornalista Escritor, no Memorial da América Latina, em São Paulo -iniciativa que abrirá as comemorações do centenário da ABI, em 2008.
‘A proposta é fazer um salão anual, uma vez em São Paulo e outra no Rio’, explica o vice-presidente da entidade, Audálio Dantas, 78. ‘Hoje a produção de livros por jornalistas justifica um evento dessa natureza’, que visa discutir ‘a questão do jornalismo e literatura. Já temos cadeiras de jornalismo literário em várias faculdades’.
O debate sobre o ‘jornalismo literário’ se avoluma num momento em que a literatura está cada vez mais ausente dos jornais, observa Ruy Castro, 59, colunista da Folha: ‘Houve um tempo em que os jornais pululavam de grande crítica literária, folhetins, poemas, contos etc. E, na época, ninguém falava em ‘jornalismo literário’. Hoje, falam tanto nisso e literatura, que é bom, não tem’.
Na opinião do jornalista Mauro Santayana, 75, esse distanciamento foi acompanhado por um declínio do texto jornalístico: ‘Na minha geração, o jornalismo era o caminho para os jovens que sonhavam com uma carreira literária. Por isso havia mais jornalistas-escritores que hoje’. Com o tempo, a competição com a TV e a ênfase na lucratividade ‘reduziram o cuidado com o texto, a fim de privilegiar a urgência’, até que os jornalistas ‘foram vencidos pela pausterização dos textos’.
Para Audálio, essa evolução no sentido de um noticiário mais rápido está ligada à necessidade de reduzir custos: ‘Na revista ‘Realidade’, eu fiz uma matéria na qual demorei 45 dias só na pesquisa do assunto. O custo para se fazer uma publicação dessa natureza é alto’.
O escritor Ignácio de Loyola Brandão, 71, discorda: ‘A ‘Realidade’ estava condenada pela censura, que de todos os lados cortava, vetava, proibia. Era uma das mais lidas e mais bem escritas revistas deste país -e a mais corajosa. Todos os seus temas eram polêmicos, provocativos. E era uma época que não admitia polêmica’. Mas acrescenta: ‘Não sei se ela teria espaço hoje. Talvez fosse séria demais para um país como este. Era uma revista inteligente demais para o país suportar’.’
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