Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mário Magalhães

‘ANTEONTEM foi mais um dia daqueles. Os leitores ditos comuns, os que em ‘última análise’ ‘sustentam’ o jornal, na definição do ‘Manual da Redação’, foram alijados de mais da metade do ‘Painel do Leitor’.

Dois executivos contestaram reportagem sobre leite. Uma assessora respondeu a artigo a respeito do Plano Diretor. Um deputado divergiu de colunista. Uma vez mais, danaram-se os leitores.

Tem sido assim há tempos. A seção perpetua uma desigualdade ofensiva: enquanto os ‘anônimos’ penam para publicar suas cartas -apenas 9% das mais de 30 mil tentativas até o fim de outubro foram bem-sucedidas-, políticos, empresários e assessores de imprensa emplacam uma mensagem atrás da outra.

É o que constata levantamento que fiz com meu assistente Carlos Murga sobre o trimestre concluído mês passado. No ‘PL’ de agosto, 19% foram ocupados por quem foi objeto de notícias e 8% por quem se sentiu atingido por opinião (em colunas, artigos, editoriais e no próprio ‘Painel do Leitor’). No total, 27%.

Em setembro, a soma alcançou 28%. Em outubro, 21%, incluindo tréplicas de jornalistas. Em 53 dias, leram-se manifestações dos que se consideraram injustiçados no jornal. Em 11, os leitores não afamados não tiveram acesso nem a 50% das duas colunas na página A3.

É um ‘Painel do Leitor’ descaracterizado o que serve de plataforma ao ‘outro lado’, como se classifica o direito de replicar as informações veiculadas na Folha.

O território de intervenção dos leitores foi apropriado por quem já dispõe ou deveria dispor de outras editorias para se pronunciar. O erro decerto não é das pessoas e instituições cuja palavra o jornalismo plural e transparente assegura. Quem se engana é o jornal.

Em 17 e 25 de agosto, o ‘Painel do Leitor’acolheu protestos do senador Renan Calheiros contra notas do ‘Painel’(o político, em Brasil). É prerrogativa sua a de retrucar.

Mas por que as declarações dele não saíram no ‘Painel’ da página 4? Por que os leitores foram punidos com supressão de espaço para suas missivas? Se a informação apareceu em seção noticiosa, por que a contestação entrou na de cartas?

Pior: o senador José Sarney e o deputado Fernando Gabeira, que não podem reclamar da atenção que o jornal lhes dispensa no noticiário, também freqüentam o ‘Painel do Leitor’. O escárnio é que ambos são colunistas da Folha.

O leitor perde sempre. O reconhecimento de erros é procedimento admirável. Como o ‘Erramos’ também está no canto da página 3, contudo, quanto mais correções, menor o ‘Painel do Leitor’, cujo tamanho médio no período pesquisado foi de 75 cm. (Não calculo a versão alongada do ‘PL’ na Folha Online, espécie de consolação aos preteridos no jornal impresso).

Outro desequilíbrio: à correspondência dos não favorecidos impõem-se dimensões reduzidas; a dos tratados com deferência se espicha.

Neste ano, acumularam-se 155 queixas, o dobro das 75 de 2006, contra cartas não publicadas e a invasão do ‘PL’ por autoridades e assemelhados. Os lamentos se sucedem ombudsman após ombudsman, sem sensibilizar a Folha.

É provável que tantos ‘outros lados’ resultem de empenho jornalístico anêmico para ouvir as partes. Mas não se atenua a fraqueza mudando o caráter do ‘Painel do Leitor’.

A Folha poderia lançar uma seção de direito de resposta. Ou garantir a defesa dos incomodados, com cartas ou declarações entre aspas, nas editorias responsáveis pelos textos controversos. Opções não faltam. O que falta é determinação editorial: resguardar o interesse dos leitores em se expressar no painel que em tese é seu.

Você ainda considera dos leitores o ‘Painel do Leitor’? Desse jeito, como ele merece se chamar? Tem sugestões sobre o que fazer com as cartas dos Vips? Responda, que eu encaminharei sua mensagem ao ‘PL’ e à Redação. Como está é que não dá para ficar.

Resposta da Redação

Recebi da Secretaria de Redação a seguinte resposta: ‘A Folha não quer dividir os leitores em duas categorias: as autoridades e o leitor comum. Por isso, não divide o ‘Painel do Leitor’, um espaço democrático e plural. A seção é uma das mais lidas do jornal, reunindo opiniões do cidadão comum, de representantes de empresas e de governos. De fato, por razões de espaço, nunca será possível publicar todas as manifestações recebidas (em torno de cem diariamente). Por isso, o jornal passou a editar mais mensagens recebidas na Folha Online’.’

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‘Uma semana ruim’, copyright Folha de S. Paulo, 11/11/07.

‘A semana começou mal para a Folha. Na segunda-feira, falha humana foi a única hipótese citada como causa da queda de um Learjet domingo em São Paulo.

Nos dias seguintes, o óbvio se impôs: outras possibilidades, como pane mecânica, começaram a ser investigadas. Ao ignorá-las no primeiro dia da cobertura da morte de oito pessoas, o jornal só se referiu ao eventual erro de quem não podia se defender: os pilotos.

Na terça, a edição não trouxe notícia que estava na internet desde a véspera: o DEM acusa o ministro da Defesa, com o qual a Folha tem demonstrado boa vontade, de se divertir no feriadão na Bahia em avião da FAB bancado pelos contribuintes (Nelson Jobim disse que viajou a trabalho). A informação ficou para a quarta-feira.

Ainda na terça, em semana vibrante, com Santos e Palmeiras pelejando por vaga na Libertadores, e o Corinthians fugindo da Segundona, os leitores não receberam a tabela de classificação do Campeonato Brasileiro.

Em compensação, não faltou a do Campeonato… Inglês! Bola quicando, emendei: a nota da minha crítica que tratou da opção se intitulou ‘Um jornal a serviço da Inglaterra’.

Na quinta, publicou-se a tabela do Brasileiro. Na edição Nacional, ela estava errada, atrasada, em rodada antiga.’

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‘Muito ruim’, copyright Folha de S. Paulo, 11/11/07.

‘Na quinta, após ter exposto em suas capas versões a favor e contra o religioso Lancelotti, o jornal omitiu da Primeira Página a notícia de Cotidiano ‘Polícia conclui que padre Júlio sofreu extorsão’.

A página mais nobre, porém, trouxe a chamada irrelevante ‘Nu do travesti Rogéria cancela exposição no Congresso’. Indaguei: ‘É mesmo a Folha?’.

No mesmo dia, nas proximidades do feriado de 15 de Novembro, Turismo e Primeira Página destacaram um passeio simpático no rio São Francisco. Um senão: a viagem só estará disponível aos turistas em… fevereiro.

Na sexta, o título alarmista ‘Inmetro manda recolher brinquedo que vira ‘ecstasy’ lembrou o falecido diário ‘Notícias Populares’.

Também anteontem, um furo histórico, a versão de um oficial do Bope para a morte do seqüestrador do ônibus 174, não saiu na Primeira Página. A Folha escondeu o que teve de bom na semana.’