Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O Estado de S. Paulo

INTRANET
Ana Paula Lacerda

Empresas criam seus próprios ´orkuts`

‘O sucesso das redes de relacionamento pela internet, como o Orkut e o MySpace, fez com que algumas empresas começassem a oferecer um novo tipo de serviço a seus clientes: redes de relacionamento exclusivas.

A academia Companhia Athletica criou para seus alunos o GenteCia, uma rede onde os alunos podem criar seu perfil, exibir fotos, criar comunidades e até postar anúncios. ‘Dos 30 mil alunos da rede, 6 mil já estão participando´, conta o diretor de marketing da academia, Marcos Nisti. O número pode estar longe dos 30 milhões de brasileiros presentes no Orkut, ou dos 620 mil no MySpace, mas para Nisti é um ótimo resultado. ´São 20% de alunos conectados. Para uma empresa que tem como missão promover o bem-estar físico e fazer amigos, estamos no caminho certo.´

Um recurso muito utilizado no GenteCia, segundo o diretor, é a ferramenta de busca de profissionais. ´Um aluno que é pediatra ou personal trainer, por exemplo, pode colocar informações profissionais no site´, diz. ´E é muito melhor você encontrar um profissional que freqüenta o mesmo lugar que você – no caso, a academia – do que um desconhecido, não?´

O projeto da Companhia Athletica exigiu um investimento de R$ 80 mil e foi realizado pela Focusnetwork. ´Criar uma rede de relacionamentos foi uma ótima estratégia, porque os alunos têm gostos parecidos, são em geral jovens de classe A que gostam de exclusividade´, diz Rafael Kiso, diretor de tecnologia da Focusnetwork. ´Não estão no ´ambiente comum` do Orkut, mas podem se relacionar com pessoas semelhantes.´

Segundo ele, nem toda empresa precisa ter uma rede de relacionamentos própria. ´Não vou dizer que dá certo para todas. Mas há mais empresas buscando esses recursos.` A obrigação é, no mínimo, conhecer as ferramentas e saber a opinião das pessoas sobre a empresa nesses ambientes. Ele dá como exemplo as comunidades do tipo ´eu adoro` e ´eu odeio´, tão comuns no Orkut. ´É importante saber se há mais pessoas adorando ou odiando a sua empresa, e por quê.`

Nesse sentido, as redes são fontes de informação riquíssimas. ´Você descobre do que seus clientes gostam. Fica mais fácil atendê-los.` A Companhia Athletica começou a oferecer mais simulações de esqui após detectar que muitos alunos pensavam em viajar para praticar o esporte.

A rede de escolas de idiomas Yázigi também criou um site de relacionamento, chamado Meet Mates, para alunos de 11 a 14 anos. Há espaço para criar perfil, postar fotos e vídeos e fazer diários. ´A idéia inicial era criar um site para a realização de cursos à distância´, explica a diretora de tecnologia do Yázigi, Gina Bononi. Mas, após observar o quanto jovens gostavam de participar dessas comunidades, veio a decisão de criar uma parecida, até como ferramenta para praticar o idioma.

´Os moderadores são os professores da escola, e os alunos escrevem em inglês.` Todo o site é na língua inglesa, idioma oficial dos fóruns. O Yázigi investe, anualmente, de R$ 800 mil a R$ 1 milhão em desenvolvimento e manutenção de recursos de internet.

Marcelo Coutinho, diretor de análise do Ibope Inteligência, diz que ´comunidades` na internet montadas por empresas ainda são incipientes, mas vão crescer. ´Elas estão percebendo que a publicidade mudou e a melhor maneira de chegar a um consumidor é pela indicação de um amigo. Afinal, você confia mais em um anúncio ou em um amigo?´’

 

LITERATURA
Ubiratan Brasil

Para minhas queridas, com ternura

‘O escritor Otto Lara Resende festejava quando recebia, pelo correio, alguma notícia de Clarice Lispector. ´Ler as cartas de Clarice é como saborear garrafas de champanhe espumante´, dizia ele. De fato, como viveu diversos anos fora do Brasil (diplomata, o marido Maury Gurgel Valente serviu em outros países), a escritora manteve uma ativíssima correspondência com amigos e parentes. Muitas cartas já foram publicadas em livro e justamente o que faltava, as que Clarice trocou com as irmãs Elisa e Tânia, chega agora no volume Minhas Queridas, que a Rocco lança na próxima semana.

Trata-se de 120 cartas enviadas por Clarice no período de 1940 a 1957, quando acompanhou o marido em suas missões no exterior. Durante esses anos, eles viveram em Nápoles, Berna, Torkay (Inglaterra) e Washington. Passaram ainda por cidades como Casablanca, Cairo, Roma, Lisboa, Florença, Paris e Filadélfia. Sua produção, nessa época, foi pequena se comparada às décadas seguintes, quando voltou a morar definitivamente no Rio em 1959. Mesmo assim, Clarice escreveu dois romances: A Cidade Sitiada (1949) e A Maçã no Escuro (1961), sendo que O Lustre (publicado em 1946) estava terminado quando ela se mudou para Nápoles.

Também produziu pequenas narrativas, incluídas nos volumes Alguns Contos (1952), Laços de Família (1960) (que absorveu os seis contos do livro anterior somados a sete inéditos) e A Legião Estrangeira (1964). Foi também durante esse período em que nasceram seus dois filhos, Pedro e Paulo.

Foi, no entanto, um período difícil para a escritora. Vivendo em uma Europa já desgastada pela 2.ª Guerra Mundial, cujo final se aproximava, Clarice e Maury foram obrigados a viver em hotéis e consulados brasileiros durante muitos meses. A impossibilidade de montar sua própria residência e, principalmente, o fato de viver longe das irmãs, com quem manteve uma extremada relação de amor e ternura, fizeram com que Clarice sofresse, prejudicando o próprio trabalho da escrita.

Organizadas pela biógrafa Teresa Montero, as cartas de Minhas Queridas revelam uma mulher que, ao viver longe de seu país, se descobre desnorteada por uma desenraizamento súbito. Mas principalmente uma escritora que sofre por não estar no ambiente propício para a criação.

´Eu vivo à espera de inspiração com uma avidez que não dá descanso´, escreveu ela em 1942, quando ainda estava no Rio de Janeiro – seu périplo europeu começou dois anos depois. ´Cheguei mesmo à conclusão de que escrever é a coisa que mais desejo no mundo, mesmo mais que amor.´

As cinco primeiras cartas do livro mostram Clarice e Elisa morando com o pai, Pedro Lispector, em uma vila na Tijuca. Com a morte dele, em 1940, as duas irmãs passam a morar com Tânia, então casada com William Kaufmann. ´Elisa, a irmã mais velha, era dotada de um temperamento reservado´, observa Teresa Montero, no prefácio do livro. ´Nas cartas, Clarice mostra-se mais à vontade com Tânia para discorrer sobre os problemas pessoais.´

A viagem de Clarice e Maury começa por Belém, onde faz uma parada até chegar à África. Lá, conheceu as vilas de negros em Fisherman´s Lake, na Libéria; as pirâmides do Egito; a cidade de Casablanca tomada por soldados ingleses, franceses e americanos; e o deserto do Saara.

Quando chega a Nápoles, onde vai viver durante um ano e nove meses, Clarice descobre os horrores da guerra. ´É verdade que se culpa a guerra de muita coisa que sempre existiu aqui´, escreveu ela, em janeiro de 1945. ´A prostituição, por exemplo, sempre foi aqui um grande meio de vida. A guerra é boa talvez no sentido de chamar a atenção para certos problemas. Talvez incorporem estes na resolução de outros propriamente de guerra.´

Para se sentir mais útil, Clarice trabalhou como voluntária no trabalho com os soldados feridos da Força Expedicionária Brasileira. Mesmo assim, sente-se incomodada por viver no consulado,´onde nenhum minuto se respirava sozinha´. O que lhe mais doía, porém, era não conseguir se sentir à vontade para escrever. Sobre O Lustre, por exemplo, que já estava terminado, Clarice não se sentia satisfeita. ´Não sei como fazer o livro amadurecer mais. Se livro fosse como maracujá, punha-se na gaveta e ficava em vez de ´maracujá de gaveta´, livro de gaveta.´

A situação complicou com a obra seguinte, A Cidade Sitiada, de difícil gestação. ´Creio que nuns dois meses posso dá-lo por encerrado. Acontece que vou encerrá-lo porque já tenho nojo dele´, escreveu para Tânia, em 1947. ´Foi o trabalho que mais me fez sofrer. Já são três anos que viro e mexo, abandono e retorno. E faz apenas uns 3 meses que sei afinal o que eu estava querendo dizer nele…´

Clarice conta que teve de não pensar no livro, tamanha náusea que lhe provocava. ´Não evoluí nada, não atingi nada. Continuo com os pés no ar, continuo vaga e sonhadora, deslocando de algum modo o sentido da vida.` Em seguida, uma pista para explicar tal desorientação: ´Em todo esse período de três anos, desempenhou grande papel minha desadaptação.´

A sensação de viver longe dos entes queridos (ela chega a dizer que ´não existem lugares, existem pessoas´) a afasta daquelas que considera as quatro musas eficientes para um escritor: saúde, sossego, paciência e inspiração. ´Tenho receio de ficar permanentemente fatigada´, escreve de Florença, em 1945. ´Eu procuro fazer o que se deve fazer, e ser como se deve ser, e me adaptar ao ambiente em que vivo – tudo isso eu consigo, mas com o prejuízo do meu equilíbrio íntimo, eu o sinto.´

Clarice busca minimizar a distância escrevendo compulsivamente para as irmãs, pedindo, exigindo até, idêntica atenção. A alegria provocada pela chegada de uma carta é tamanha que ela chega a cômicos exageros – como em 1946, quando vivia em Berna e, ao ir ao cinema, carrega a recém-chegada correspondência das irmãs no sutiã. ´Porque assim sinto o calor da amizade de vocês´, justifica.

A amargura, no entanto, não é preponderante nas cartas. Clarice revela-se também uma observadora bem-humorada, tanto de cidades como de pessoas. Sobre Eva Perón, a carismática líder argentina, ela escreveu em 1947, quando Evita passou por Berna, na Suíça: ´Nas ruas, ela recebeu um tomate de um cidadão – o tomate lançado com violência não chegou porém a atingi-la. Em Lucerna, jogaram uma pedra. Ela é muito bonita mesmo, e deve andar ligeiramente desgostosa em ver que nem todo mundo gosta dela.´

Ainda em Berna, Clarice descobriu o existencialismo de Jean-Paul Sartre, cuja obra recomendou para as irmãs. No Cairo, foi a um cabaré egípcio e viu a dança do ventre. ´Acreditem ou não, a música da dança era Mamãe Eu Quero, em ritmo adequado…´, brincou. Durante sua estada em Washington, aproveita para conhecer Los Angeles e Hollywood, onde conhece pessoalmente o comediante Danny Kaye e o ator Peter Lawford, ambos ´uma uva´.

Acima de tudo, estava a escritora preocupada com seu ofício. Aos poucos, percebe-se que as reclamações de Clarice têm fundamento. Para ela, escrever era a atividade mais importante de sua vida. Mais que a desaprovação externa, Clarice temia a própria autocrítica. E jamais pretendia se tornar uma escritora comum, como observou em uma carta para Tânia: ´Fazer crônicas de estilo ligeiro tem muito perigo. O perigo de tomar gosto na facilidade de escrever. O perigo de cair no que Antonio Candido chama de literatura infernal.´

Frases

´Infelizmente sou um espírito cansado e blasé. Pouca coisa me entusiasma, eu bebi demais na literatura.´

´O mundo me parece uma coisa vasta demais e sem síntese possível.´

´Temos ido como sempre ao cinema e saio meio tonta do cinema, de tal forma estou sempre disposta a perder a consciência das coisas e a me entregar à inconsciência.´

´Eu sempre disse a mim mesma que o amor que os outros têm pela gente cria mais deveres que o amor que a gente tem pelos outros.´

´Berna é de um silêncio terrível: as pessoas também são silenciosas e riem pouco. Eu é que tenho tido acessos de riso. O último foi com Maury (o marido) no cinema e tivemos que sair.´

´O meio diplomático é composto de sombras e sombras. É considerado mesmo de mau gosto ter um gosto pessoal ou falar de si ou mesmo falar de outros. Ninguém se dá propriamente com um diplomata; com um diplomata, se almoça. Isso tudo – e mais o conforto, as facilidades e a instabilidade – faz com que eles se considerem à parte e acima dos outros.´

Mais Conversas Com Clarice

CORRESPONDÊNCIAS (Rocco, 2002) – Cartas trocadas com outros escritores, artistas, intelectuais e familiares.

CARTAS PERTO DO CORAÇÃO (Record, 2001) – Correspondência com Fernando Sabino, trocada entre 1946 e 1969.

OUTROS ESCRITOS (Rocco, 2005) – Além de diversos textos inéditos da escritora, o livro traz a transcrição da entrevista concedida para os amigos Affonso Romano de Sant´Anna e Marina Colasanti, arquivada no MIS do Rio.

ENTREVISTAS (Rocco, 2007) – Entre maio de 1968 e outubro de 1969, Clarice Lispector manteve uma seção na revista Manchete, na qual publicava entrevistas com figuras importantes da cultura do País, como Nelson Rodrigues, Ferreira Gullar, Emerson Fittipaldi, Oscar Niemeyer e Vinícius de Moraes.’

 

TELEVISÃO
O Estado de S. Paulo

Fim de ano especial

‘Antes mesmo de a cidade arrematar a sua decoração de Natal, a Globo já anuncia a programação especial de fim de ano.

Além do tradicional show de Roberto Carlos, o Show da Virada e a Retrospectiva 2007 e Video Show Retrô, a emissora exibe, pelo terceiro ano consecutivo, seis edições do Estação Globo, comandado por Ivete Sangalo. No especial, a cantora vai receber convidados como Maria Rita e Jota Quest e interpretar canções pedidas por fãs famosos, como Reynaldo Gianecchini e Lázaro Ramos.

E como fim de ano também é época de novas apostas, Xuxa ganha uma outra tentativa. Além do seu Especial de Natal Xuxa 2007, a loira estréia a atração Conexão Xuxa, uma espécie de gincana para adultos e crianças.

Entre as sitcoms haverá a continuação da saga dos quatro amigos de Os Amadores 3, com Cássio Gabus Mendes, Otávio Muller, Murilo Benício e Matheus Nachtergaele. E os inéditos Guerra e Paz, com Danielle Winits e Marcos Pasquim, e Faça Sua História, com Mariana Ximenes, Malvino Salvador, Stepan Nercessian, entre outros.

Estão ainda na programação Casos e Acasos, com Taís Araújo, Antônio Calloni e Danton Mello, e Dicas de Um Sedutor.’

PERSONAGENS
Marcelo Rubens Paiva

Arte e maniqueísmo

‘Dois personagens apropriados da ficção saíram das telas para intervir no mundo real. Aconteceu nesta semana no interior do Estado.

Em Presidente Prudente. O ajudante-geral Vandeir Máximo da Silva, o Vlad, é acusado de vampirismo por ter mordido com seus dentes caninos lixados e pontiagudos e bebido o sangue de 17 discípulos que seduziu pela internet. Conhecido como o ´vampiro de Presidente Prudente´, gótico assumido, ele explica que há vampiros do mal e do bem. Felipe, de 15 anos, uma das suas vítimas, ficou decepcionado, porque Vlad mordeu o seu pescoço e não virou vampiro.

Em Palmeira, cidade de 2 mil habitantes. Riquelme Wesley dos Santos, de 5 anos, salvou a filha de Lucilene Córdova dos Santos, Andrieli (de 1 ano e 10 meses), vizinha cuja casa pegava fogo. As labaredas assustavam a mãe. Até o menino vestido com o uniforme do Homem-Aranha aparecer: ´Não chora, tia, fica tranqüila que eu salvo a sua filha.` Ele atravessou as chamas e puxou Andrieli pela perna, porque ´o Homem-Aranha não tem medo de nada´, disse. A família quis recompensá-lo, mas o super-herói que arriscou a vida não aceitou.

A arte não imita a vida apenas, mas serve para intervir nela. É exemplo e inspira, para o bem e para o mal. Apropria-se da invenção, para modificar o real: a realidade reloaded. Santo Apolo, quando Batman aparecerá em Brasília, para acabar com tantos Curingas?

A Culpa É do Fidel, de 2006, foi um filme pouco comentado da última Mostra de Cinema. Não estava na lista dos mais badalados, nem as suas sessões lotaram. É o primeiro longa dirigido por Julie Gavras, de 37 anos, filha do cineasta Costa-Gavras, autor de filmes que carimbaram um período, como Z, Estado de Sítio e Desaparecido.

Costa-Gavras não realizou um cinema de vanguarda, nem inovou a linguagem, como tentaram muitos cineastas que cruzaram arte e política. Sempre com uma narrativa linear e didática, sem negar Hollywood – até usou Jack Lemmon e Sissy Spacek -, mostrava ao público de ressaca dos anos 60 e que se embalava em discotecas, para o corpo ficar Odara, os abuso, absurdos e conseqüências cometidas por ditaduras na Grécia, no Uruguai e no Chile, peças da polaridade ideológica da guerra fria. Ele apontou a grande contradição da luta geopolítica: para combater o comunismo, em defesa do mundo livre, os Estados Unidos não se acanhavam em derrubar democracias e apoiar regimes que torturavam. O cineasta grego chamou o mundo à razão. O discurso político dos seus filmes estava na ação. Exibiam o que acontecia por trás da cortina de fumaça da censura e contrapropaganda.

Desaparecido, de 1982, mudou o apoio da opinião pública e a política externa norte-americana para o Chile, ao mostrar o desaparecimento de um jovem americano, Charles Horman, que tinha provas do envolvimento da CIA na derrubada do governo socialista de Salvador Allende. Estado de Sítio foi o primeiro filme a falar da tão negada cooperação entre militares argentinos, uruguaios, chilenos e brasileiros, na caça de inimigos de esquerda, a Operação Condor. Se alguém se pergunta se a arte serve para alguma coisa, pense em Costa-Gavras, que interveio na história.

A Culpa É do Fidel se passa entre 1971 e 1973 em Paris. Como foi exibido com legenda eletrônica na Mostra, suspeito que não entre em cartaz. Lembra Minha Pequena Miss Sunshine, por ter uma protagonista pré-adolescente cativante (a atriz Nina Kervel-Bey), um humor simples e inteligente.

Anna de la Mesa, de 9 anos, tem uma vida pacífica e comum, dividida entre a escola católica e a família, que mora numa grande casa com quintal. Mas os pais alienados decidem fazer algo pelo mundo, depois da prisão e morte do tio espanhol, um comunista convicto perseguido pelo regime franquista. Ajudam o regime socialista e democrático recém-implantado no Chile. Tornam-se engajados políticos.

Ativistas barbudos que fumam e discutem política o tempo todo começam a freqüentar o pequeno apartamento para onde o casal se muda e que vira um ponto de encontro. A mãe (Julie Depardieu, filha de Gerard Depardieu) se envolve com feministas que lutam pela liberação do aborto, enquanto a conformista Anna, apelidada de reacionária (´múmia´) pelo pai, tenta explicar aos intrusos de esquerda que, sem o lucro (mais-valia), ela jamais se interessaria em melhorar os produtos da sua empresa.

Anna é proibida pelos pai de assistir a aulas de catecismo, o que ela amava. Através das babás, uma cubana anticomunista ferrenha e uma vietnamita exilada pelos comunistas, ela convive com algumas vítimas desses regimes. Ela tem a sua vida confortável virada do avesso. Engajamento político, altruísmo e solidariedade levam uma família à desordem: troca de babás, novos rostos e discriminação.

É uma maneira bem-humorada e realista que a filha de Costa-Gavras teve para contar a sua versão da história e exibir os ridículos de uma época polarizada. Quem não teve amigos que não bebia Coca-Cola, para não dar dinheiro aos imperialistas?

O maniqueísmo ridículo (bem versus mal) continua no Brasil, com a birra entre PT e PSDB: quando um está no poder, o outro o boicota, como no caso da CPMF, e o Brasil pára. Não há debate vertical sobre o imposto. Um partido não quer que o outro tenha R$ 40 bilhões a mais no orçamento. Um quer que o outro não administre com folga, nem melhore o País.

O duelo é sem sentido, já que ambos nasceram na mesma época e berçário – a luta contra a ditadura e o projeto de uma nova esquerda socialista, pacifista, democrática, distante das influências do antigo PCB – e se aliam a frentes antagônicas para se degolarem.

Não é segredo que José Serra tem mais afinidades com parte do PT do que com parte do próprio partido, como no caso da CPMF. Assim como Lula tem mais afinidades com a esquerda do PSDB do que com a maioria do seu ministério. Tal conflito político revela uma faceta da contradição humana: nos aliamos ao inimigo, para combater nosso amigo próximo. Será que é assim em outras atividades? Nos aliamos aos que odiamos, para competir com quem amamos?

Lula defende a democracia de Chávez. ´Por que también non te callas?´’

 

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O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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