Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A minissaia da discórdia

A reação desproporcional dos alunos da Uniban perante a minissaia ou mini-vestido trajado por uma estudante traz à tona (mais uma vez) um angustiante questionamento: que conceitos de moral, ética e cidadania têm os jovens de hoje? É de assustar a reação em cadeia, quase unânime, que se alastrou pelo campus da Uniban em São Bernardo do Campo, decorrente de uma peça do vestuário feminino. É bom frisar: falamos apenas de uma peça do vestuário feminino. O que está em debate não é o gosto duvidoso da estudante, nem tampouco a violação de regras de conduta ou coisas do gênero; mas sim, a origem da revolta, asco ou fobia pela tal peça.

A formação intelectual do homem dito moderno (pode-se dizer ‘formatação’ ou ‘configuração’) está atrelada diretamente ao espectro da comunicação de massa. Independente de suas origens, este novo modelo de ser humano, forjado na caldeira da globalização, é educado, condicionado e finalmente seduzido para o consumo. Suas atividades (condução da vida pessoal e profissional) miram o consumo. Seja para coisas mínimas, como comprar o sabonete da sex-appeal da telenovela, ou para as coisas mais complexas, como constituir um modelo de religiosidade que reconforte o espírito perante as aflições e angústias. Hoje, se compra Jesus Cristo nas igrejas como se compram caramelos na confeitaria.

Um mundo plástico e antropofágico

Medido pelo que consome, e não pelo o que produz em benefício da coletividade, o ser humano chamado moderno já não sabe exatamente de que origem vem, também pouco se importa com o impacto de suas atitudes e atuação no mosaico da sociedade e, pior, não faz a menor idéia de seu próprio papel nos chamados relacionamentos interpessoais. Se este ser humano dito moderno entender que a minissaia é inconveniente, cabe a agressão, a ofensa, a violência, a estupidez. Criatura híbrida que é – afinal, seus pares da Aldeia Global consomem os mesmos bens culturais –, o homem moderno não faz o exercício da empatia, nem tampouco exercita sua já remota e difusa alteridade.

Se os bárbaros high-tech do século 21 não aceitam a minissaia, tão cultuada nos anos de 1970 e 1980, o que será das chamadas minorias? Que tipo de intolerância é esta que agride uma mulher que usa minissaia? Graças à má aplicação da tecnologia das comunicações no processo educacional e no próprio mass media, o mundo caminha para uma sociedade de paus e pedras onde debates sobre minissaias (a exemplo) terão mais importância do que discussões sobre a capacidade do homem de apontar o norte para sua sobrevivência harmoniosa e justa perante seus pares. Neste mundo novo, plástico e antropofágico, só se espera o triunfo da indústria cultural e de suas frivolidades.

******

Jornalista, Belo Horizonte, MG