Em sentença proferida na sexta-feira (29/4), o juiz Frederico Wildson da Silva Dantas, da 7ª Vara Federal em Alagoas, condenou a União a indenizar o jornalista João Marcos Carvalho por danos morais. Ele entendeu que o profissional de imprensa foi vítima de ato arbitrário cometido pelo advogado Fábio Ferrário que, em 24 de maio de 2002, na condição de juiz eleitoral temporário do TRE em Alagoas (indicado pela OAB), exorbitou de suas funções ao mandar fechar o jornal A Notícia, de Maceió, e prender João Marcos, então diretor de redação do semanário. Na ocasião, o jornalista amargou 15 dias de cadeia no presídio de segurança máxima Baldomero Cavalcanti.
Em sua edição de 16 maio de 2002, o jornal publicou matéria segundo a qual moradores da cidade de Junqueiro, no Agreste alagoano, diziam suspeitar que três juízes eleitorais haviam sido subornados para manter no cargo o então prefeito João José Pereira, acusado pela oposição de várias irregularidades. Num rasgo de auto-suficiência jurídica, o magistrado improvisado resolveu ignorar todos os procedimentos legais que o caso requeria para enquadrar um suposto crime de imprensa e, num impulso eivado de arbitrariedades, resolveu determinar que a Polícia Federal invadisse a sede do jornal, recolhesse os computadores, lacrasse a Redação e prendesse seu editor, além de proibir que todas as gráficas de Alagoas rodassem o jornal.
Na época, o caso ganhou repercussão nacional e internacional. A Associação Brasileira de Imprensa e a Federação Internacional de Jornalistas lideraram os protestos, secundadas por entidades da sociedade civil, como a OAB nacional, a CNBB e sindicatos de jornalistas. Na área política, o governador Ronaldo Lessa, a senadora Heloísa Helena, o ex-vice-prefeito de Maceió Alberto Sexta-Feira, os deputados Paulão, Délio Almeida, Cícero Amélio e os vereadores da capital Judson Cabral, Thomás Beltrão, João Luiz e Robert Manso fizeram pronunciamentos públicos condenando a atitude discricionária de Fábio Ferrário. Segundo Ronaldo Lessa à época, ‘trata-se de inaceitável atentado contra a liberdade de imprensa’.
Vitória do jornalismo
A indignação de políticos dos mais diversos segmentos ideológicos contra o ato truculento do advogado-juiz foi reforçada por Évio Lima, que na ocasião presidia a CUT alagoana. ‘Em tempos de democracia, a sociedade não pode admitir que juízes rasguem a lei para atender a interesses estranhos. Esse ato representa uma agressão ao Estado Democrático e de Direito que nos remete aos obscuros tempos da ditadura militar’, lembrou o sindicalista.
Ao tomar conhecimento da decisão do juiz federal que condenou a União a indenizá-lo, o jornalista João Marcos Carvalho declarou que independentemente do valor indenizatório que for arbitrado, o importante é saber que o Judiciário não tolera atos despóticos que violam a Constituição e as leis ordinárias.
‘Espero que de agora em diante a OAB-Alagoas possa selecionar melhor os advogados que ela indica para operarem no TRE como juízes temporários. Caso contrário fatos como este podem se repetir, prejudicando a imagem e a credibilidade instituição’, disse João Marcos, que acrescentou: ‘Esta também é uma vitória do jornalismo investigativo contra a censura prévia e o corporativismo de alguns magistrados que se julgam dotados de poderes divinos. Se esse crime contra a liberdade de expressão ficasse impune, qualquer rábula de porta de cadeia se sentiria no direito de sair por aí fechando jornais, rádios e emissoras de TV toda vez que interesses de seus superiores ou clientes fossem contrariados’.
A sentença
Na sentença que condenou a União Federal a indenizar o jornalista João Marcos Carvalho por danos morais, o juiz Frederico Wildson da Silva Dantas considerou que a prisão do então diretor de redação do A Notícia foi indevida e que a decisão do juiz Fábio Ferrário em prendê-lo foi ‘teratológica’, configurando-se o erro judiciário.
‘Não vejo com rejeitar a pretensão do autor [João Marcos], pois a decisão que importou a decretação de sua prisão preventiva constitui erro grosseiro por qualquer ângulo em que seja examinada’, diz o magistrado no item 25 de sua sentença.
No item seguinte, o juiz acrescenta: ‘(…) a privação da liberdade do autor foi determinada com base em meras premissas e conjecturas, sem sequer evidenciar-se a autoria dos delitos…’, para emendar no item 29: ‘(…) não se vislumbra qualquer motivo que justifique um decreto de encarceramento, visto que o réu, em liberdade, não representava séria ameaça, quer ao processo, quer a ordem pública’.
Mais adiante, no item 33, o magistrado federal registra: ‘Com maior razão, a prisão preventiva indevida, porque injusta e ilegal, é bastante em si para configurar o dano moral’, adicionando no item imediato: ‘Sobejamente demonstrada, portanto, a ocorrência de dano moral imputável à União Federal, pois que decorrente de prisão ilegal, motivada em infração não comprovada e em situação de absoluta desnecessidade do decreto cautelar, nos termos já expostos’.
Por entender que o jornalista foi preso indevidamente e submetido a situação ‘extremamente humilhante e vexatória’ através do ato ilícito praticado por Fábio Ferrário, quando juiz do TRE, o juiz Frederico Dantas acolheu o pedido da vítima, condenando a União a indenizá-la nos termos do artigo 269 do Código de Processo Civil.
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Jornalista em Maceió