Como ampliar o acesso a meios e tecnologias que viabilizam a produção própria de conhecimentos dentro de um quadro de comunicação altamente concentrado? Esta foi a pergunta que inaugurou os debates do Fórum Mundial de Mídia Livre, realizado em Belém nesta segunda e terça-feira como evento preparatório ao Fórum Social Mundial 2009. Nas discussões, foi reafirmada a necessidade de ampliar a prática do midialivrismo, reconhecendo-a como modalidade de expressão que ultrapassa os limites do corporativismo de quem é apontado pela Academia como produtor de conteúdo. Mas se foi perceptível a receptividade das diversas pessoas, coletivos e entidades presentes a este conceito-prática, os caminhos apresentados para sua ampliação foram vários e, muitas vezes, antagônicos.
Para parte dos presentes ao evento, a ampliação das vozes pretendida pelo midialivrismo deve estar relacionada à busca por uma inserção na arena midiática contemporânea. Para o integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Jonas Valente, é importante que as iniciativas de mídia livre articulem-se para fortalecer uma alternativa ao avanço dos meios comerciais que difundem um discurso conservador e interditam o ‘debate sobre uma comunicação mais democrática’.
Dentro do conceito de comunicação contra-hegemônica, o representante da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), José Sóter, defendeu a importância da comunicação comunitária como forma de mídia livre. ‘Isso estimula a promoção da identidade (de uma comunidade). Promove o crescimento da consciência crítica’, disse. Altamiro Borges, editor do Portal Vermelho, advogou que se evitasse uma ‘ética da pequenês e da distorção’, que relegasse a mídia livre apenas a existência dispersa de iniciativas individuais de produção de conteúdos.
Multiplicação
Por outro lado, houve também vozes que apontaram o caminho da promoção das experiências sem a obrigação necessária de integrá-las. Para a diretora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ivana Bentes, é preciso que se pare com ‘o discurso da catástrofe’ sobre o poderio dos grandes conglomerados comerciais de mídia. Para ela, o movimento de midialivristas tem que demandar políticas públicas, mas, acima de tudo, tem que formar os seus próprios mercados baseados nos princípios da solidariedade e do compartilhamento horizontal, bem como na formação de novas linguagens que contemplem toda a criatividade possível dentro do que é livre. ‘A gente tem que pensar no movimento para além da fragmentação destas linguagens. Como fazer redes tao poderosas quanto ao dos grandes conglomerados?’, questionou.
Para Sérgio Amadeu, professor da faculdade Cásper Líbero, o movimento de mídia livre deve centrar suas atenções nas possibilidades da internet e lutar contra as tentativas de limitação de liberdade dentro da rede digital através da criminalização de internautas. ‘Sou defensor da comunicação anônima na internet. Não é porque não é um nome verdadeiro [que assina uma produção para a rede] que a informação não tenha qualidade. Não devemos nos curvar diante da sociedade do controle’, disse.
Outro ponto que merece atenção é a busca por audiência no novo ambiente digital. ‘No velho paradigma, a briga era para falar. Na rede, o difícil é ser ouvido. No digital, vai haver um grande confronto entre estes ativistas e os grandes conglomerados’, sentenciou Amadeu.
Desafios
Diante da diversidade de opiniões, emergiu como desafio encontrar um fio condutor que ligue todas as perspectivas apresentadas: da garantia do acesso às novas tecnologias e da construção de redes horizontais à articulação de experiências de porte com condições de competir na arena midiática. Neste quadro, o acesso às novas tecnologias ainda é um problema que aumenta de proporção quando o assunto esbarra com o tema propriedade intelectual e a criminalização de midialivristas.
Para a representante do portal Overmundo, Oona Castro, haverá sempre a tentativa de se controlar a ação dos que promovem mídia livre. ‘É necessário que todos tenham a possibilidade de participar, sem intermediações’, enfatizou.
Financiamento surgiu como outra questão que merece a atenção do movimento. A necessidade da auto-sustentação é um consenso, mas também há o debate sobre o papel do Estado na garantia de uma mídia pública e livre, seja na liberação de verba publicitária estatal para meios livres, seja na promoção de políticas públicas que levem a uma maior democratização da comunicação brasileira. ‘Para sermos livre, precisamos da intervenção do Estado, pois ele media os conflitos da sociedade’, argumentou Sóter, da Abraço.
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Do Observatório do Direito à Comunicação