O escritor Rubem Fonseca, que, brincando, pediu Lygia Fagundes Telles em casamento, depois que ela também ganhou o Prêmio Camões, celebrou 80 anos quarta-feira passada.
A imprensa brasileira acompanha seus passos desde a estréia, em 1963, com Os Prisioneiros, os contos lançados por Gumercindo Rocha Dórea, cujas iniciais estão no nome da editora GRD. Encontrei Lygia dias antes, nos autógrafos de Ivan Junqueira, e mal sabe que foi o assunto da fila para várias pessoas que lhe elogiavam a beleza, o porte, o sorriso, a alegria que exala do alto dos seus 82 anos. Não se deve dizer a idade das mulheres, mas chega um tempo que esse cuidado vira coisa sem nenhuma importância.
De tudo o que li agora na celebração dos 80 anos do escritor, passados 42 anos da promissora estréia, uma das matérias mais originais foi a de Mauro Ventura. Só lamentei, assim que li a reportagem que ele assinou em O Globo, que os entrevistados, ouvidos durante horas, comparecessem ali com duas ou três pequenas frases – mas isso, me disseram, são ossos do ofício.
Outras palavras
Não o conhecia, nem tinha ligado o nome à pessoa, mas, dias antes de me entrevistar, soube tratar-se do filho de Zuenir Ventura. Queria muito atendê-lo, afinal defendi duas teses e escrevi três livros e vários textos avulsos sobre Rubem Fonseca, mas havia uma condição: ele tinha que me entrevistar na Barra da Tijuca. ‘Não tem problema, marque dia e hora, e aí estarei’.
Antes de entrar em minha sala, dei uma olhada nas garças que todos os dias vêm pousar à beira daquelas águas que circundam o campus Tom Jobim, na Universidade Estácio de Sá. São minhas velhas conhecidas e sempre penso que são as mesmas que me acompanhavam no Pantanal quando pesquisava para escrever um romance sobre a Retirada da Laguna, no começo dos anos 1990. Mas devem ser outras. Essas têm guarda própria: um bando de pássaros pretos as rodeia ao entardecer.
A tarde estava cheia de trabalhos, mas pareceu que ia começar um antigo recreio escolar quando de repente vi diante de mim um menino humilde, sagaz, armado de perguntas diferentes das que comumente são feitas em tais efemérides.
Lembrei-me das palavras do escritor Ricardo Ramos, dirigindo seu automóvel pela avenida Paulista e confidenciando que era muito difícil ser filho de Graciliano Ramos. Clara Ramos me disse o mesmo com outras palavras, mas por escrito, em carta que jaz em meus guardados junto com um autógrafo de duas páginas!
A semana, a quinzena
Um dia alguém há de fazer uma boa matéria sobre escritores filhos de escritores. Luis Fernando Verissimo jamais se queixou de ser filho de Erico Verissimo. Fez outros caminhos cruzados, tratou de outros incidentes, bem longe das míticas Antares e Santa Fé, e, não contente em ser um de nossos melhores cronistas, vem cometendo um romance melhor do que outro.
Vou começar a espalhar por aí que Zuenir Ventura não está com nada, bom mesmo é o Mauro Ventura. Ninguém vai acreditar na primeira afirmação, é claro, mas na segunda, sim.
A semana foi dos escritores. Festejei o prêmio de Lygia Fagundes Telles na companhia de Marina Colassanti e Eliana Yunes, em Curitiba, onde a PUC organizou um evento esplêndido, intitulado Saberes, que inundou de livros o teatro universitário, coordenado por uma guerreira audaz, a professora Marta Morais da Costa.
Depois vi e li o João Ubaldo Ribeiro todo sorridente na Veja, em entrevista imperdível, dizendo que o presidente Lula não deve ‘se gabar, se vangloriar da própria ignorância, da própria falta de formação’.
Tudo isso aconteceu fora da Bienal do Livro, que se realiza no Rio. Quer dizer, a nova semana e a quinzena serão de livros, autores e leitores, uma tríade que sempre se entendeu bem.
[Este artigo foi também publicado no Jornal do Brasil, em 17/5/05]