A internet não piora a maneira como escrevemos, nem os jovens de hoje têm menor domínio de redação que seus antepassados.
No best-seller “The Sense of Style” (o senso de estilo), o psicólogo, linguista e neurocientista Steven Pinker, 60, critica o conservadorismo dos manuais de redação, ataca regrinhas-clichê do escrever bem e defende uma escrita mais “clara, concisa, precisa, com tom e cadência”.
Professor de Harvard que combina prestígio acadêmico com linguagem cristalina e nada empolada, Pinker diz que escreveu seu manual não por saudosismo dos bons tempos, mas porque “estilo ainda importa”.
“Pode acontecer uma morte na estrada por um sinal mal escrito ou termos um coração partido por uma frase mal colocada naquela mensagem bem-intencionada”, diz à Folha.
“Governos e grandes empresas descobriram que pequenas melhorias na clareza podem evitar vastas quantidades de erros, frustrações e desperdícios, e muitos países têm feito da clareza a lei suprema.”
Ele diz que um dos maiores problemas em qualquer texto hoje é a “maldição do conhecimento” –quando o autor sabe demais e não tem ideia de que nem todo mundo sabe o mesmo que ele.
“Muitos profissionais buscam a cura para o seu academiquês, burocratês, corporatês, legalês, medicalês ou oficialês”, brinca. Vários dos conselhos do livro tentam exterminar o palavreado pomposo.
Para ele, o antídoto é supor que os leitores “sejam tão inteligentes quanto você, mas que por acaso não saibam alguma coisa que você sabe”.
“Conheço vários acadêmicos que não têm nada a esconder nem necessidade de impressionar. Eles fazem trabalhos revolucionários em assuntos importantes, raciocinam bem sobre ideias claras e são honestos, gente com os pés no chão, com quem você gostaria de tomar uma cerveja”, justifica. “Ainda assim, a escrita deles é horrenda.”
O livro esbanja bons e maus exemplos, de textos acadêmicos a romances clássicos, de quadrinhos à cultura pop, para defender a concisão e a elegância.
Escrever mais
Pinker explica que a vontade de escrever seu próprio manual (ele é um consumidor assumido de manuais) também tem relação com o presente, no qual todo mundo é escritor de vez em quando.
“Pesquisas têm demonstrado que os universitários de hoje estão escrevendo bastante mais que seus congêneres de gerações passadas, e que eles não cometem mais erros por página escrita”, diz.
“Não estamos escrevendo pior que antigamente. As pessoas confundem seu envelhecimento com o declínio do mundo ao seu redor. É a chamada ilusão dos bons velhos tempos”, explica.
“Coloquei no livro vários textos de 1889, 1833, 1785 em que os autores se queixavam da “juventude de hoje” que não sabia escrever. Nas tábuas de argila da Suméria antiga já havia reclamações de que os jovens estavam destruindo o idioma”, ri.
Apesar de a obra ter capítulos inteiros sobre a gramática do inglês, onde Pinker defende neologismos e expressões antes condenadas por linguistas, o autor diz que muitas de suas ideias de redação são universais.
“Mesmo em uma cultura que valorize mais a forma indireta e a polidez que nos EUA, como parece ser no português, uma descrição clara, concreta e vívida será mais eficiente que uma vaga, abstrata, oca e turva. É uma discussão relevante em português ou em inglês”, diz.
“Usamos a forma indireta, eufemismos e insinuações quando discutimos temas sensíveis, como sexo, mas muita má escrita, especialmente de acadêmicos, advogados e burocratas, vêm de inaptidão mais que de polidez.”
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Raul Juste Lores, da Folha de S.Paulo