A compra da Time Warner Cable Inc. pela Charter Communications Inc. por US$ 55 bilhões deu a John Malone, o magnata americano da TV a cabo, o prêmio que ele perseguia há dois anos.
A aquisição feita pela Charter, que tem a Liberty Broadband Corp., holding de Malone, como seu maior investidor, vai alçar a operadora de TV a cabo ao nível das maiores companhias de banda larga e televisão por assinatura dos Estados Unidos.
A Charter e Malone estão apostando que uma escala maior vai ajudar a empresa a enfrentar as turbulências do setor, como a debandada de assinantes frustrados com os serviços de TV paga, a ascensão de empresas de streaming de vídeo, como Netflix e Apple Inc., e esperados conflitos com redes de TV sobre quais canais incluir nos pacotes.
“Ninguém entende mais do mundo multicanal do que John Malone”, diz Leo Hindery, executivo veterano do setor de TV a cabo e sócioadministrador da firma de private equity InterMedia Partners. “É óbvio que ele vê na Charter e na Time Warner Cable uma forma de perpetuar um legado sem paralelo.”
Em 2013, a Charter, que tem 5,9 milhões de assinantes em mais de 25 Estados americanos, fez várias ofertas para comprar a Time Warner Cable, mas elas foram recusadas. A Charter acabou realizando uma oferta hostil no ano passado que foi superada por uma proposta mais alta, de US$ 45,2 bilhões, da Comcast Corp. A rival, porém, acabou desistindo do negócio um mês atrás, em face da resistência dos reguladores dos EUA.
Desta vez, a Charter optou por uma abordagem mais branda, que contou com um envolvimento maior de Malone, dizem pessoas a par da situação. Ele telefonou para o diretorpresidente da Time Warner Cable, Rob Marcus, no início das negociações para sinalizar que queria um acordo mais amistoso.
A Liberty vai ajudar a financiar o negócio ao comprar US$ 5 bilhões em novas ações da Charter. Como parte da transação, a Charter também vai se fundir com a pequena operadora Bright House Networks, numa operação avaliada em US$ 10,4 bilhões. A combinação das três empresas terá mais de 23 milhões de clientes, ficando atrás somente dos 27 milhões da Comcast entre as operadoras de cabo.
Malone terá a companhia da família Newhouse entre os maiores acionistas da nova companhia. Quando a Charter inicialmente concordou em comprar a Bright House, antes de o negócio com a Time Warner Cable ser fechado, a transação daria à família Newhouse que controla a Advance/Newhouse, dona da Bright House uma participação acionária maior que a de Malone, mas uma fatia menor do capital votante.
Os acordos anunciados ontem darão à Liberty o controle de um total de quase 25% dos votos, incluindo a representação, limitada a 7%, que a Advance/Network vai conceder à Liberty.
Prêmio de 14%
Dependendo de quantas ações forem distribuídas como parte da transação, a Time Warner Cable será dona de até 44% da nova empresa, a Liberty Broadband de até 20%, a Advance/Network de até 14% e a Charter do restante.
A companhia combinada será liderada pelo diretorpresidente da Charter, Tom Rutledge, que também será presidente do conselho de administração.
O negócio marcará o retorno de Malone como uma força respeitável no mundo da TV a cabo dos EUA, colocandoo em posição de influenciar a transição do setor para uma mídia dominada por streaming de vídeo e internet de banda larga. Desde que comprou uma grande fatia da Charter no começo de 2013, ele vem pregando o evangelho da consolidação aos investidores e enfatizando como as operadoras de cabo não estão mais colaborando entre si como faziam no início. Por isso, elas estariam perdendo oportunidades de lutar contra o Netflix e outras ameaças da concorrência.
O executivo de 74 anos ajudou a moldar a indústria de cabo nos seus primórdios. Com pouco mais de 30 anos, ele assumiu o controle da endividada TeleCommunications Inc. e conduziu a companhia por um período de incertezas e realizou centenas de aquisições nos anos 70 e 80 que a tornaram a maior operadora de cabo dos EUA.
Em 1998, ele vendeu a TCI no seu auge para a AT&T, por US$ 48 bilhões, e se voltou para investimentos na Europa. Na sua trajetória, Malone ganhou uma reputação de ser um negociador implacável com bancos e programadores de TV. Mas, em momentos cruciais da indústria de cabo como quando o governo criou leis para regular o setor, em 1984 e 1992, e quando as redes abertas e de TV a cabo começaram a exigir uma parte das tarifas mensais , ele foi visto como um líder e defensor dos interesses das operadoras.
O mercado de TV a cabo que Malone ajudou a construir está agora totalmente maduro na verdade, está começando a se contrair. Assinantes frustrados com tarifas cada vez mais caras estão abandonando a TV paga em favor dos relativamente baratos serviços de streaming de vídeo.
Agora, Malone será testado num momento igualmente crucial para as operadoras a cabo. A nova gigante formada pela fusão entre a Charter e a Time Warner Cable, que elas esperam concluir no fim de 2015, será muito maior que a TCI, que tinha 11 milhões de assinantes, e terá pela frente obstáculos consideráveis.
“Há um monte de desafios desta vez, mas não há um visionário melhor para enfrentálos”, diz Hindery, que dirigiu a TCI para Malone por muitos anos.
Para serem bemsucedidas nos próximos anos, as operadoras de cabo terão que recorrer pesadamente ao seu negócio de banda larga para gerar lucros, enquanto tentam conter o encolhimento da área de TV. Isso significa investir em infraestrutura de banda larga, serviços de streaming de vídeo e outras tecnologias.
A união entre Charter e Time Warner Cable pode ser objeto de uma análise rigorosa por reguladores, dizem analistas. Eles observam, no entanto, que o negócio não levará a uma participação dominante no mercado de banda larga, o maior motivo que levou os reguladores a se oporem à compra da TWC pela Comcast.
A oferta da Charter corresponde a cerca de US$ 195 por ação da TWC, um prêmio de 14% sobre a cotação de fechamento da ação da TWC na sextafeira. Incluindo dívidas, a transação é avaliada em US$ 78,7 bilhões.
A ação da Charter subiu 2,5% ontem [terça, 26/5], fechando a US$ 179,78, enquanto as da TWC avançaram 7,3%, para US$ 183,60. (Colaboraram Shalini Ramachandran e Dana Cimilluca)
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Sarah Rabil, Joe Flint e Chelsey Dulaney, do Wall Street Journal