Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Era do conectivismo

Quem já leu ou ouviu falar sobre behaviorismo, cognitivismo e construtivismo, sabe que são teorias pedagógicas reconhecidas e adotadas internacionalmente. Usam metodologias diferentes de ensino –, resumidamente, behaviorismo estuda o comportamento, cognitivismo aborda o pensamento e construtivismo foca o experimento – mas as três convergem para o mesmo ponto: aprendizagem individualizada.

Esta é uma característica pedagógica que está ficando cada vez mais ultrapassada no mundo atual hiperconectado. O impacto da hiperconectividade da internet está gerando uma grande transformação social e cultural no mundo numa velocidade estonteante. Nesse sentido, além do tráfego monumental de informações em todos os campos de atividades humanas, as redes sociais estão desempenhando um papel superinovador de relações humanas instantâneas e coletivas. Elas protagonizam o fenômeno mcluhaniano da retribalização. Convocam, organizam e mobilizam multidões em protesto como nas recentes manifestações contra o governo da presidente Dilma Rousseff.

Assim, o que antes da internet era apresentado, explicado e julgado pelos meios de comunicação tradicionais, principalmente os jornais, em fluxo unilateral, agora tem milhões de novos olhos e de novas vozes descrevendo a realidade, em fluxo multilateral. Agora, cada indivíduo que acessa a internet ganha milhares de visões e análises de outros indivíduos do que acontece no mundo político, social, urbano, econômico, científico, religioso, artístico, desportivo etc.

Virou coisa do passado o desenvolvimento do indivíduo passivo, doutrinado quase exclusivamente pela Escola, pela Família e pela Religião, sem qualquer questionamento. Para o indivíduo da aldeia global hiperconectada, existem a conexão e o intercâmbio de informações e de ideias com milhões de outros indivíduos no mundo. Ou seja, Escola, Família e Religião permanecem importantes no desenvolvimento da inteligência do indivíduo, isoladamente, mas já não são preponderantes, pois agora ele dispõe de modernas e velozes ferramentas de comunicação que o fazem participante ativo, protagonista, na formação do seu próprio capital de conhecimento.

“Amanhã não seremos o que somos”

Como os jornais, as escolas também estão afetadas pela internet. Assim como os leitores estão insatisfeitos com os jornais e preferem ler as notícias na internet, os estudantes também estão insatisfeitos com o ensino engessado das escolas e preferem aprender tudo na internet. O aprendizado deixou de ser individual – como nos processos do behaviorismo, cognitivismo e construtivismo – para ser coletivo, solidariamente coletivo. Isso significa que o indivíduo passou a ter o controle do próprio processo educativo, do seu próprio desenvolvimento intelectual, independentemente de Escola, Família e Religião.

Dessa forma, “aprender, mais do que um exercício de transferência de dados, está transformado num processo de conexão e de colaboração com os outros, com os quais se rastreiam todas as possíveis fontes de conteúdo”. É como define essa mudança o principal estrategista do Technology Enhanced Knowledge Research Institute (Tekri), no Canadá, George Siemens, criador do conceito pedagógico chamado conectivismo, um novo paradigma de ensino-aprendizagem, centrado na inteligência coletiva virtual. Seu interesse pela exploração das possibilidades pedagógicas com a internet levou-o ao conectivismo.

Siemens sistematizou o paradigma conectivista no livro Knowing Knowledge (2006), uma exploração de como o contexto e características do conhecimento mudaram e o que isso significa no mundo de hoje. Segundo ele, com a internet, o conhecimento passou a ser composto e disseminado por uma rede, que alimenta organizações, instituições e pessoas que, por sua vez, alimentam a rede, construindo-se assim, neste fluxo, a individualidade no meio da universalidade.

De acordo com Siemens, o ponto de partida do conectivismo é, também, o indivíduo – como no behaviorismo, cognitivismo e no construtivismo – mas ele garante que, com as transformações aceleradas que ocorrem na atual sociedade hiperconectada, a aprendizagem já não é mais uma atividade interna, pessoal, individualista, nem submetida à passividade, como se fosse apenas assistente, apenas espectador.

Pelo contrário, é participativa ao som do tambor do aldeião; resulta das conexões que o indivíduo estabelece em rede global. Daí, o papel das novas tecnologias de comunicação e sobretudo das redes sociais, que fazem intensa retribalização, ser fundamental para compreensão dos modelos de desenvolvimento do saber e do conhecimento na era digital que, certamente, vão produzir uma grande e radical mudança no nível de consciência da humanidade, confirmando Ovídio: “Amanhã não seremos o que fomos, nem seremos o que somos”.

***

Jota Alcides é jornalista e escritor