Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os delatores, a imprensa e o bate-boca político

O artigo de Luiz Claudio Cunha “Dilma, Kissinger, os delatores e o bate-boca” – vide link https://www.observatoriodaimprensa.com.br/conjuntura-nacional/dilma-kissinger-os-delatores-e-o-bate-boca/ – faz uma crítica relevante aos excessos do que ele chama de imprensa pequena, alternativa, progressista, esquerdista, governista, petista e/ou legalista. Em certo momento do artigo, ele decide, para não ferir suscetibilidades e por achar mais saudável definir esta “torcida organizada” da imprensa como mídia alternativa que, no seu entender, “erra, e erra muito, quando é desonesta ao defender até os equívocos e bobagens do governo, transpondo os limites do bom senso e atropelando a inteligência do público”. Jornalisticamente, e ele nunca se coloca fora desta condição, sua reflexão, neste particular e mesmo em toda a sua análise, é de um rigor raramente encontrado fora da chamada mídia alternativa, excetuado, é claro!, nomes consagrados como Jânio de Freitas, Luiz Fernando Veríssimo e outros de igual quilate que são mantidos na grande mídia por seus inegáveis talentos e, suponho – jacobino que sou – , também para dar aos jornalões um tom pretensamente democrático e aberto a todas as vozes da sociedade.

Luiz Claudio Cunha estabelece assim a linha divisória de sua crítica que começa “quando a mídia alternativa defende os equívocos e bobagens do governo, transpondo os limites do bom senso e atropelando a inteligência do público”. Até aí, tudo bem. O governo atual cometeu “erros e bobagens” ao adotar o modus operandi existente desde sempre na história política brasileira e deve pagar por isso. Como devem todos os que cometeram erros e equívocos iguais ou maiores e isso está sendo escamoteado pela grande mídia. Acontece que este governo não cometeu só os equívocos e as bobagens apontadas, com muita propriedade por ele. Como ele próprio aponta, o papel histórico da grande mídia sempre foi contra qualquer governo que avance no terreno social, econômico e político. E, queira ou não, o governo do PT avançou. Como avançaram os governos de Getúlio Vargas e de Jango Goulart que, também, foram atacados pelos mesmos que agora atacam o PT usando a mesma tática de carregar a bandeira da corrupção. Na falta de outra bandeira, esta se constitui na “bala de prata” da direita. Portanto, estamos diante de situações de governos que foram ou são atacados mais pelas virtudes do que pelos defeitos.

Sinto- me constrangido de ter de fazer crítica a um jornalista respeitado e sério que, ao contrário do usual, tem o mérito de apontar, por igual, o que ele chama, para não ferir suscetibilidades, de “erros e equívocos” do governo, da grande mídia e da oposição, em especial, a tucana. A posição mais cômoda seria apenas elogiar alguém que se contrapõe tanto ao pensamento único da grande mídia como ao maniqueísmo da esquerda. A gravidade do momento exige dos jornalistas reflexão serena e racional, como a de Luiz Claudio Cunha, que esclarece muitos pontos com rigor e isenção. Como cidadão com pretensões a pertencer a uma corrente ideológica progressista e democrática, sinto- me na obrigação de um engajamento que nunca deve ser cobrado de um jornalista. Deste deve ser cobrado isenção, objetividade e imparcialidade e estes quesitos estão perfeitamente assegurados neste brilhante artigo de Luiz Claudio Cunha. Portanto, a minha crítica é mais ideológica que jornalística. É mais um acréscimo que eu faria. Não passa pela minha cabeça exigir de outro o mesmo pensamento ideológico.

A capacidade de influência do público

A primeira questão que coloco é quanto à falta de apontamento dos méritos, dos acertos, deste governo que, bem ou mal, fez avançar a agenda progressista e democrática com programas como Bolsa-Família, sistema de cotas, financiamento de universidade para jovens com baixa renda, regulamentação dos direitos das empregadas domésticas. Enfim, programas que, junto a outras medidas governamentais, significaram elevação da condição cidadã e da capacidade de consumo de parcela significativa da população. Sei que de um jornalista devemos cobrar o papel de guardião dos deveres dos governantes. O relativo aos direitos dos cidadãos é mais dependente do compromisso ideológico que um jornalista pode ter ou não. Apenas penso que, já que seu artigo é sempre extenso o bastante para permitir um aprofundamento raro hoje em dia, não custaria comparar atos de governos de agendas antagônicas (tucanos e petistas) para assim termos um quadro mais amplo e completo, não só de uma conjuntura, mas de uma história que não começa nem acaba no aqui e agora.

Outra questão que depreendi da leitura do artigo de Luiz Claudio Cunha diz respeito à equivalência, ao equilíbrio, que aparentemente estabelece o autor, entre a grande mídia e a mídia alternativa. Equilíbrio que, no meu entender, inexiste. A capacidade de influência na sociedade brasileira da grande mídia, ainda que em fase de decadência pelo advento de novas ferramentas tecnológicas da internet, é muito maior do que a mídia alternativa. Colocar ambas como iguais em capacidade de influência do público leitor, telespectador e ouvinte, é exagerar na dose. É como colocar em igualdade de concorrência o “mercadinho da esquina” com as grandes redes monopolistas de supermercados.

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Jorge Alberto Benitz é engenheiro e c