Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A remuneração dos magistrados brasileiros

No dia 21 último, tomei conhecimento de matéria divulgada, com base em fundados documentos de prova, pelo blog do jornalista Paulo Henrique Amorim (Conversa afiada), dando conta dos ganhos auferidos por membros da magistratura federal, especialmente da Seção Judiciária do Paraná, situação em que se inclui, para a minha surpresa, o juiz Sérgio Fernando Moro, titular da 4ª Vara Federal de Curitiba. A matéria sob comento indica remuneração auferida em um só mês, pelo respeitável magistrado, da ordem de R$ 77.000,00 (setenta e sete mil reais). É sabido que a Constituição Federal veda, expressamente, que servidores públicos, inclusive do Poder Judiciário, percebam remuneração superior à dos ministros do Supremo Tribunal Federal, hoje em torno de R$ 34.000,00.

Esclareça-se, em nome da verdade e da justiça, que parte da verba percebida pelo respeitável magistrado que preside os processos relacionados à assim chamada Operação Lava Jato seria, em princípio ao menos, inalcançável pelo limite constitucional, vale dizer, são excluídas dos rendimentos do servidor, para efeito de aplicação do teto remuneratório. Há outras verbas, porém, sob os mais diversos títulos, que mesmo sob o mais torturado esforço poderiam ser incluídas dentre as exceções definidas na Lei Maior, para fins desse cálculo, sendo, pois, absolutamente questionável sua legalidade e sua constitucionalidade, por mais generosa a disposição de quem as examine: auxílio-moradia, auxílio-livros, auxílio-taxi, auxílio-educação… e vão por aí, em um sem-fim de parcelas que frontalmente agridem normas esculpidas na Carta Magna, pois que: a) implicam, em concreto, que foi excedido o limite constitucional acima aludido (ainda que se rotulem sob o disfarce enganoso de verbas indenizatórias); e b) não resultam de lei, ferindo, destarte, o princípio da reserva legal. Se a lei, e em especial a Lei Maior, obriga todos cidadãos, independentemente do seu ofício, do seu poder econômico e da sua posição social, eis que “todos são iguais perante a lei” – creio, muito modestamente, que aqueles a quem cabe distribuir a justiça deveriam dar o exemplo mais eloquente da sua fiel observância.

O silêncio unânime da mídia

O deferimento de quaisquer vantagens adicionais e parcelas da remuneração de servidor público situa-se, como já assinalado, no campo do que se costuma chamar reserva legal, ou seja, somente pode ser objeto de concessão, por disposição de lei. Assim, penso eu, filho de velho e modesto magistrado de província que sou, que o pagamento de parcelas e vantagens ainda que derivem de normas infralegais expedidas pelo organismo a que diretamente se vincule o beneficiário, e ainda que se realize à revelia deste último, não o exime da obrigação de efetuar a imediata devolução ao erário. E, com maior razão, quando a vantagem, para além de não prevista em lei, resulte em ser ferido o outro dispositivo constitucional, que determina o teto dos ganhos a serem percebidos pelo servidor e define as exceções ao seu cômputo.

Assim, os fatos em questão deveriam ser objeto do mais rigoroso escrutínio da imprensa, uma vez presente a hipótese de afronta flagrante a mandamento da Constituição, envolvendo autoridades que deveriam, mais que qualquer outro cidadão, demonstrar, de forma inquestionável e exemplar, a exata observância da lei. Infelizmente, contudo, não é isso o que nos foi dado observar no caso vertente. Pelo contrário, o silêncio da grande mídia foi unânime, avassalador, revoltante. E nos dá bem a ideia da atitude viciosa, parcial e descompromissada das grandes empresas de comunicação do país com o seu dever de servir à sociedade, prestando-lhe a informação correta e fazendo ecoar a sua voz de repulsa ante aos abusos que são cometidos por quem mais tem a obrigação de defendê-la.

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João Carlos Bezerra de Melo é economista