O que representa para você o desfile cívico? Para alguns pode ser uma representação do patriotismo, um resgate histórico para outros, ou até mesmo algo que faz recordar os tempos de criança, quando se ensaiava dias, e até meses, antes do grande dia da honra de festejar a independência do Brasil.
Mas antes disso sempre nos foi ensinado, pelo menos a mim, que a cena as margens do Riacho do Ipiranga eram apenas uma das facetas de dominação, teatralidade dita feita pelo então Príncipe D. Pedro, no fatídico dia 7 de setembro de 1822.
Porém, o que significaria o termo Independência? Somos nós independentes? Estamos ainda presos a alguém ou algo? Analisaremos.
O viés piegas do grito
Começamos pelo fato relevante, ao ponto que se deu o famoso ‘’Grito do Ipiranga as margens plácidas’, como reverbera o grande símbolo, o Hino Nacional Brasileiro. Ligeiramente, nada mudou após o ato no país. Tudo continuou uma dificuldade só. De mudança apenas a psiquê dos ex-colonos, naquilo que batiza Laurentino Gomes, em seu artigo, de ’moda tupiniquim’. Uma delas seria se vestir apenas com o algodão brasileiro e usar um penteado estranho, partido ao meio, como um caminho cruzando a cabeça, ao qual tinha a simbologia de “estrada da liberdade”.
O caso, ’Independência ou morte’, foi apenas uma saída política para o grande clamor, que se ouvia inclusive bem antes em todo o continente, do povo que não aguentava mais a ideia de ser a eterna colônia. Entra em destaque aí o nosso famoso jogo político de gritar em cima de palco, no qual contempla o público com os sentimentos aflorados e com os ouvidos aptos. Porém, ao final de tudo, os avanços são sempre mesquinhos ou inexistentes.
Construção da imagem
Pieguismo a parte, destacamos o termo independência como: ‘Estado, condição, caráter do que ou de quem goza de autonomia, de liberdade com relação a alguém ou algo’. Como vemos nesta definição livre, a palavra faz referência a um estado de soltura.
O que analisamos é que, a comemoração em uma data como essa, seria a simples constatação do apego a costumes – que coloco de forma alienante, em fazer referência e indexar ao nosso direito nato em usufruir a soberania, àqueles que forçosamente nos mostrou a possibilidade sermos sim, desapegados da grande metrópole, mesmo que simbolicamente, independentes.
Após o grito do Príncipe, com sua majestosa coragem – ao subir em cima de uma mula – acompanhado do seu exército no alto das colinas as margens do Riacho do Ipiranga, se fixou o mito de que a partir dali estávamos libertos do pai, pelo filho.
Militarismo na mente e no poder
Alguns anos se passam e a imagem que ficou em nossas mentes é a do quadro pintado por François-René Moreaux, de um guerreiro e de seu exército lutando pela autonomia da nação. Mais adiante, se torna fidedigna a ideia de que os militares são a força e o poder, ou os que fornecem a liberdade, ou pelo menos a farsa por imagem à ela.
Essa imagem dos militares seria fortalecida na mente da população com a vinda dos proclamadores da república, com a sequência dos militares no poder. Do primeiro, e logo a apropriação da presidência pelos ditos Marechais, Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. No contexto histórico tivemos ainda encontro com os governos militares na década de 1930, General Augusto Fragoso, e a partir de 1946, com o Gaspar Dutra, que se alinhou com o Governo Americano na Guerra Fria.
Em 1964 veio então a impiedosa ditadura militar com seus marechais, almirante, brigadeiro e generais.
Analisando sobre outro aspecto, destacamos ao longo da nossa história largos períodos sobre a governança de militares. Enfatizamos também houve ainda uma segunda independência. Com o fim da Ditadura Militar, em 1985, recuperamos o que ficou perdido por mais de 20 anos, uma suposta liberdade.
Ensino como arma e orgulho da guerra
O ensino imposto pelos militares nas escolas se caracteriza por valorizar os ditos ‘grandes nomes’ ou ‘heróis da pátria’. A educação foi uma das principais preocupações dos governantes do regime. Uma das disciplinas que tinham um papel alienante, introduzido na grade curricular foi a Educação Moral e Cívica (leia artigo sobre isso).
A memorização de datas e feitos e a taxação de ícones e heróis estavam impregnados no ensino de Estudos Sociais. Atualmente temos aversão à essa prática no ensino.
O que é bem certo é que nascemos como república, fascinados pelo militarismo. Nossos primeiros presidentes, não eleitos pelo voto popular, foram os marechais.
Quando saímos as ruas para mostrar a nossa soberania com apego a uma postura altivez e exibicionismo bélico, ou mesmo autoritário com grandes exércitos, não estamos comemorando um conquista, mas sim nos orgulhando da guerra.
Os que defendem o patriotismo, destacam em antemão o desfile de 7 de setembro como um ato simbólico do mesmo. Vale ressaltar ao enxergar assim, que reforçamos a ideia do apoderamento da liberdade pela força, quando deveria ser o contrário. Nenhum ser ou nação é livre se existe pressão física ou psíquica para manter ditatorialmente a ordem, exemplo disso são feitos pelos regimes autoritários.
Comemorando o povo
Comemoramos a nossa independência marchando, mas digo que poderíamos comemorar sambando, cantando ou até mesmo debatendo sobre os próximos desafios a serem vencidos. Alienamos em ritos militares, nos fazendo amantes ocultos da força pela força.
Outros países, também soberanamente fortes, comemoram a data através da valorização das culturas dos povos que edificam as nações. Dos que verdadeiramente constroem o país. No caso da Argentina, que não foge, em paridade ao destino do Brasil, que teve sua independência nas mãos dos generais, existe hoje uma valorização menor aos militares.
Nos EUA, (veja fotos), que teve sua independência quase meio século antes do Brasil, 1776, as comemorações têm como valores enaltecer a soberania da nação. As pessoas vão às ruas para mostrar a alegria e orgulho de ser americano.
Em países onde existe um maior número de conflitos os desfiles são feitos destacando o poderio de armas e exércitos. Como é o caso do Estado Israel, Argélia, Líbano, Kuwait, Afeganistão. Em países da América Latina se sobressaem a as armas e os soldados, em sua grande maioria na: Venezuela, Colômbia, Paraguai, Peru e outros.
O Patriotismo ou devoção a pátria como muitos defendem quando vão as ruas em datas como esta, deve ser encarada não com uma visão isolada sobre o militarismo, pelo qual julgam está a nossa força como nação. Porém o que deve ser exaltado é a cultura, as características que nos valorizam como Povo Brasileiro, sem distinção de raças e de região de origem. A soberania da Nação é a união em prol de mais igualdade, mais educação e respeito pelo nosso território, guardando e zelando pelo bem estar da população e o meio ambiente.
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Francisco Julio Xavier é jornalista e poeta