Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Margareth Sullivan

À medida que o Times abre caminho no mundo da mídia digital, ele vem tentando novas maneiras de divulgar as notícias, de interagir com seus leitores e obter novas receitas de faturamento. Algumas dessas experiências dão certo de imediato, outras fracassam e algumas ficam numa categoria entre uma e a outra.

Essa última categoria inclui, por exemplo, o aplicativo móvel NYT Now, que começou a funcionar no ano passado e tem por objetivo atrair jovens a pagarem um preço mais baixo do que aquele que é cobrado pela edição digital completa do Times. A iniciativa foi bem-sucedida no sentido de trazer novos leitores para o jornal, mas não tanto no sentido de aumentar a receita – atualmente, o NYT Now ainda funciona, mas é gratuito.

Uma outra oferta que se pode encaixar nessa categoria é a que começou como Times Premier, que propunha matérias sobre os bastidores do jornalismo do Times, acompanhadas de palavras cruzadas e acesso aos vídeos TimesTalk. Atualmente, a iniciativa passou a ser chamada Times Insider e oferece aos leitores mais intransigentes a oportunidade de ver o processo e as pessoas por trás do jornalismo: uma ideia de como a coisa é feita. Nas últimas semanas, o Times Insider ganhou divulgação na primeira página do jornal e nas outras plataformas digitais. O jornal oferece uma experiência de várias semanas antes de passar a cobrar de seus assinantes 8 dólares por mês. Essa experiência não inclui apenas artigos escritos por jornalistas do Times, mas também um arquivo digital de som preparado pela editora Susan Lehman. Sua entrevista com A.O. Scott, por exemplo, explorava como ele desenvolve seu trabalho como crítico de cinema. O repórter Adam Nossiter escreveu sobre a cobertura de estupros em massa na Nigéria. Jodi Kantor e David Streitfeld descreveram como fizeram sua reportagem sobre a cultura vigente no ambiente de trabalho na empresa Amazon.

O que perguntar a um repórter do Times?

Mas o Times Insider mexe com alguns leitores da forma errada ao fazer com que se sintam como intrusos diante da oferta de algo a que sua assinatura básica – que já é cara – não dá acesso. Mike Chessler, de Los Angeles, escreveu dizendo que a iniciativa é “confusa e equivocada”. Assim como outros consumidores de mídia, ele se sente soterrado pelas informações. “Para mim, o papel de uma boa fonte de notícias é orientar e, portanto, eu presumo que se existe algo por trás do muro do Insider, é supérfluo. Preferiria pensar que se alguma coisa fosse importante e merecesse ser noticiada, simplesmente seria publicada no jornal.”

Outro leitor, Bill Settlemyer, disse que, embora tivesse ficado contente com o fato do Times ter superado um marco de assinantes recentemente, preocupava-se ao ver os editores começarem, de maneira “deliberada ou inconsciente, a canibalizar o conteúdo da versão digital” para empurrar os leitores para uma assinatura do Insider. Alice Herb, de Nova York, chamou a cobrança adicional de revoltante e aética porque acredita que o Times “deixou de publicar informações fundamentais” para seus assinantes comuns.

Na semana passada, falei sobre essas preocupações e sobre os objetivos com Susan Lehman e com Francesca Donner, diretora do Times Insider. Perguntei, por exemplo, se existe, de fato, um número suficiente de leitores dispostos a pagar mais que justificasse este esforço. (Lembrei-me do comentário do escritor e professor David Eisenhower, de que os jornalistas não são, nem de perto, tão interessantes quanto pensam que são.)

Tanto Susan Lehman quanto Francesca Donner responderam rapidamente que o Times Insider não representa notícias, e sim, nos termos de Francesca Donner, “uma espiada por trás da cortina” e uma oportunidade de compreender como foi feita uma matéria ou uma cobertura. Ou, como disse Susan Lehman, quais as respostas “àquilo que você poderia perguntar a um repórter do Times se o encontrasse num coquetel.

Promoções disfarçadas de jornalismo

Francesca Donner fez uma clara distinção entre uma cobertura jornalística – da qual os assinantes do Times “continuarão a receber 100%” – e as ofertas do Times Insider, que são “uma olhadela em como fazemos as coisas”.

“É um produto muito especializado para leitores entusiásticos do Times”, disse Francesca Donner. “Enriquece. Trata dos bastidores, e não da matéria.” Por exemplo: um dos textos mais populares do Times Insider é a descrição feita por Margalit Fox de como são selecionados os obituários do Times e outra é a que fez Sam Sifton sobre a origem das receitas publicadas no Times. Mas o maior sucesso, até agora, foi o texto de David Dunlap sobre a primeira vez que Donald Trump apareceu no Times, em 1973.

Em sua primeira fase, gratuita, o Times Insider era como uma faixa gratuita num CD, ou o acesso temporário a um canal fechado da TV por assinatura. E, para quem não estivesse interessado, bastava olhar para o outro lado. Francesca Donner não me revelou as metas para o Times Insider ou quantas pessoas já fizeram a assinatura ou quantas assinaturas poderiam ser consideradas um sucesso. Mas a receita não é o único objetivo, disse ela. “Procuramos satisfazer as necessidades de um grupo básico de apoiadores para quem o Times é mais que um hábito; é parte de suas vidas”, disse ela. O sucesso será avaliado, em parte, pelo envolvimento dos leitores: quantos comentários enviados, quantos deles abertos e quantos com uma carta enviada por e-mail, e quantos leitores leem os artigos ou vêm discutir nos debates que estão planejados.

Independentemente de tudo isso, em minha opinião, há um outro elemento do valor do Times Insider para o jornal que vai além de uma receita imediata ou das insaciáveis necessidades dos leitores. É o que, na profissão, chamamos “construir a marca” – a batida repetida de que o jornalismo do Times é o melhor jornalismo e vale o que custa.

Nas últimas semanas, os leitores notaram uma tensão de autopromoção no Times por ocasião da comemoração de um milhão de assinantes do jornal digital, com destacadas matérias sobre seu jornalismo, algumas escritas por seus principais editores. Um leitor, Ted Clement, disse, desconfiado: “Tradicionalmente, o Times e outras organizações jornalísticas fazem uma divulgação crítica (às vezes, rigorosa) de si próprios.” Mas estes artigos “mais se parecem com releases do que com artigos jornalísticos. Embora seja estimulante receber boas notícias do Times, pergunto-me se esses artigos não serão, de fato, promoções disfarçadas de cobertura jornalística”.

Mostre, não diga

Respondi a Ted Clement que esperava que o frenesi de auto-complacência (que nada tem a ver com o Times Insider) passasse dentro de pouco tempo. Quanto ao Times Insider, frequentemente ele produz textos e ideias interessantes; se os apoiadores decidirem pagar um custo adicional, irão encontrar, com certeza, diversão e isso pode aprofundar seu sentimento de lealdade e posse.

Os líderes da empresa deixaram claro que o futuro depende, antes de tudo, de encontrar um número crescente de pessoas dispostas a pagar consideravelmente caro por um jornalismo de boa qualidade.

Minha esperança é de que os leitores se convençam dessa qualidade menos pelo fato de isso lhes ser dito incansavelmente e mais pelo fato do jornalismo – justo, independente e inflexível – falar por si próprio. Afinal, uma das diretrizes do bom jornalismo é simples: mostre, não diga.

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Margaret Sullivan é ombudsman do New York Times