Ninguém viu, se viu não reparou, se reparou não se espantou e sequer se deu ao trabalho de vibrar. No alto da capa do domingo, 8 de Novembro, uma chamada curta e rara em nossa imprensa:
“O Globo errou. Lulinha não foi citado na delação premiada de Fernando Baiano.”
A informação errada foi publicada um mês antes, nas primeiras aparições da badaladissima coluna de Lauro Jardim (p. 2). O jornal assumiu o erro do jornalista. É obrigação.
Na sexta, seguinte, 13/11, foi a vez da “Folha” reforçar o novo paradigma reconhecendo na capa seu erro em texto sobre mortes causadas pela PM paulista (publicado dias antes, em 9/11). A errata do jornalão paulistano – explicitada e destacada em página interna quase inteira — foi mais enfática no interior do jornal do que a do jornalão carioca, mas o “Globão” foi mais apelativo ao chamar mais atenção para o próprio equívoco. O que é muito bom, sobretudo quando se torna regra geral e aplicada tanto a figuras de pés-de-chinelo como a filhos de ex-presidentes.
Não se pretende aqui comparar as diversas maneiras de pedir desculpas ao leitorado, muito menos de verificar o grau de acerto de dois tipos de denúncias, a brasileiríssima modalidade do jornalismo investigativo em pílulas & colunas e o propriamente dito, formatado como o resto do jornal.
O que se pretende aqui é apenas o registro da estranha multiplicação de um procedimento antes tão raro e a frequência com que de repente passou a ser usado. No caso do vistoso mea-culpa do “Globo” chama também a atenção o silêncio das publicações que costumam acompanhar cegamente as informações veiculadas pelos grandes veículos. Quantas colunas especializadas em pílulas denuncistas espalhadas pelo país reproduziram sem qualquer verificação a informação da recém-inaugurada coluna do “Globo” e quantas tiveram a decência de admitir o erro?
A incipiente moda destes vistosos mea-culpa tem certamente origem na sanção presidencial (em 11//11) do PL/141 oriundo do Senado que oficializa o Direito de Resposta. Percorridos todos os trâmites legislativos agora só poderá ser questionado no STF.
As entidades corporativas da indústria da comunicação já começaram a esbravejar e espernear, em alguns casos com razão porque o Direito de Resposta previsto em artigo da Constituição Federal só poderia ser corrigido através de uma Emenda Constitucional.
A legalidade da tramitação do PL 141 também poderia ser questionada porque na sua recente passagem pela Câmara Federal teve ostensivos empurrões do presidente da casa, Eduardo Cunha, companheiro de partido do autor do PL, senador Roberto Requião (PMDB-PR), tão admirador da nossa imprensa quanto aquele.
O encadeamento de mal-entendidos a respeito do Direito de Resposta começaram em Abril de 2009 quando o STF acolheu o pedido para a revogação da funesta Lei de Imprensa, considerada a última porção do lixo autoritário herdada da ditadura militar. Encaminhada a questão ao colegiado alguns magistrados insurgiram-se contra sua anulação total lembrando os riscos de um vácuo legal. O Ministro Marco Aurélio de Mello, chegou a declarar que a supressão imediata e integral da Lei de Imprensa produziria “uma Babel”. Este observador foi um dos que, na ocasião, advertiu para os perigos da pressa, sobretudo quando seus apóstolos pareciam concentrados ao lado das corporações de empresas de mídia. Venceu a impaciência aliada à obsessão pseudo-liberal, anti-reguladora. Venceu o “simbolismo” de fingir que a ditadura foi definitivamente varrida.
Seis anos depois, eis a Babel formalmente instalada no auge de uma das mais graves crises institucionais desde o fim da República Velha, onde partidos e parlamentares – inclusive o deputado Eduardo Cunha, um dos padrinhos do P/L 141 –, acossados por denúncias formais de corrupção e quebra de decoro, só pensam em impor limites ao incomodo trabalho da imprensa.
Porém, ao qualificar o novo Direito de Resposta como “mordaça” jornais e jornalistas, só aumentarão o caos – ou a Babel – estimulando indignações deletérias e reacendendo debates neste momento impertinentes e secundários.