O jornalismo hoje é, como diria o caipira, ‘uma faca de dois legumes’. Se, por um lado, o mundo-cão tem cada vez mais êxito, os ditos ícones cults do jornalismo do país têm em seus maiores representantes um desgaste, quem dirá o público leigo. Em mais uma reviravolta profissional depois de tantas, uma das mais respeitadas profissionais do país deu um tiro à queima-roupa nos pudicos de plantão.
Após ocupar um dos postos de mais prestígio do país, a apresentação do Roda Viva, TV Cultura, sua apresentadora declarou à mídia sua insatisfação: ‘Os entrevistados estão pobres. Quem está sentando naquela cadeira não tem nada a dizer ao telespectador. Fico com vergonha. Aquilo lá está um sonífero. Nem o Markun consegue assistir’, bombástica declaração dada por Lillian Witte Fibe à Folha de S.Paulo em 16/02/2009.
A quem trouxe novidade? O Roda Viva só teve bons momentos em significantes episódios políticos e ao entrevistar grandes figuras. É um formato engessado e muito dependente da qualidade do entrevistado. Pois devem se considerar alguns pontos. A TV Cultura, pelo nome só, já é algo não-atraente nos dias de hoje. Vivemos um momento de aculturação dos mais intensos que já se viu fora de uma ditadura no Brasil.
No Brasil, hoje, ter opinião é pejorativo e não é a toa que o Opinião Nacional, da mesma emissora, saiu do ar. Diferente das décadas passadas, o debate político saiu da mesa de bar, do supermercado, da padaria e dos aniversários. Ser politizado, hoje, é sinônimo de ser chato. Ter raciocínio e opinião própria é quase que uma agressão moral aos acéfalos de plantão. Seja coerente e sincero hoje, por mais de 20 minutos, e vire motivo de chacota. Tenha moral e será tratado como um criminoso que quer tirar a alegria de viver dos aculturados de plantão.
A banalização vigente
Cada vez mais, os que se fazem valer da desistência dos poucos que ainda têm valores éticos em lutar por um mundo distinto da bandalha que tem se tornado a sócio-cultura vigente e o ‘deixa pra lá’ tem se torna não apenas um hábito, mais que isso, a sentença de morte de uma ex-nação.
Há de se pensar algumas coisas, sobre esta fala de Lillian, para que se possa explicar o desinteresse da população em programas do gênero do Roda Viva. Ou nada mais acontece na cena política do país, quiçá estão todos cegos. Creio ser impossível não se ter mais gente que tenha o que dizer em um momento de crise mundial. Dá-me a impressão suave, e talvez equivocada, de que os vínculos com o governo paulista estejam a interferir na pauta do programa. Contra isso, somente posso massificar um pensamento corrente de algumas pseudo-elites intelectuais: ‘O mundo emburreceu e eu, além de não ter emburrecido junto, me esqueci de fazer lobotomia.’
Faço minha sugerência de entrevistado ao Roda Viva: José Saramago. Ele, que já proferiu frases como ‘A lucidez é um luxo a que nem todos se podem permitir’; ‘Sou um sobrevivente por ter conseguido manter alguns valores éticos’; ‘Se começássemos a dizer claramente que a democracia é uma piada, um engano, uma fachada, uma falácia e uma mentira, talvez pudéssemos nos entender melhor’; e ‘Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo’, deve ter algo a dizer talvez. Mas será que o velho ateu-comunista e Prêmio Nobel não seria vetado?
Esperamos que, em caminhos distintos, a grande profissional e o grande programa, em alusão clara ao que já representou ou mesmo apresentou no passado, tenham êxito futuro e não se percam no mar incipiente da banalização vigente que é a atual moeda vigente e deprimente no país.
O fresco e a modernidade
Fernanda Young finalmente tem data de re-estréia e a novidade é a presença de platéia no estúdio. O sarcástico, irreverente, envolvente – e, como todos as irritantes rimas sempre são cabíveis de mais uma – e inteligente programa tem de tudo para lograr êxito nesta nova empreitada.
Uma ótima novidade, mas com um grande pesar. Por que não limam o chatíssimo Programa do Jô da grade da Globo de uma vez, é minha pergunta eterna? Ao menos uma vez por semana, às sextas-feiras por exemplo. Em sua sétima temporada, o Irritando Fernanda Young estréia no dia 26 de abril, no GNT, com uma novidade: o programa terá platéia, que participará da atração.
Ter uma platéia é um passo corajoso a ser dado ao programa que continuará apresentado aos domingos, à meia-noite. Acredito que – desde que não caia na armadilha em que caiu Jô Soares, que se perdeu no bonde da sua própria trajetória – Fernanda que a mim me parece muito mais inteligente, não misturando ser entrevistadora com ser comediante será um dos raros momentos criativos da TV brasileira dos últimos anos.
Pois existe uma grande diferença entre você fazer rir por levar o telespectador a uma reflexão ao invés de metodizar risos por atos tontos e pré-conceitos nulos de raciocínio. O fresco e a modernidade do Irritando é algo inacreditável. Ser cruel sem ser maldoso é um ato difícil dentro do humor. A ironia pode se tornar um riso de alegria se for criterioso a qualquer público.
Irritante exclusão
Em contrapartida ao que muitos dizem quanto a ser muito elitista o humor sagaz do programa é valido lembrar que Fernanda Young foi criadora e roteirista do sucesso popular Os Normais. Este que não prosseguiu apenas porque os atores não o quiseram, pois sentiram desgastadas suas imagens devido ao extremo êxito da serie e posteriormente do filme.
Acredito que excluir as pessoas que não tem acesso a TV fechada de bons produtos um preconceito e por que não uma semitização social e intelectual deletériamente cruel para com estes.
O que muitos poderão falar é que o cidadão de cunho mais popular não se agradaria de um programa de conceito e texto tão elaborados. Eu me pergunto é porque excluir e impor uma abstinência as coisas boas do mundo aos financeiramente menos favorecidos. Como se apenas os mais abastados pudessem ou tivessem o direito as boas coisas do mundo. A mudança de paradigmas é necessária sim, pois como cobrar que um popular de Ibope para Marcias, Ratinho e Sonias Abraao da vida se lhe privarem sempre do acesso a bons formatos e conteúdos? Desejo que essa irritante exclusão um dia cesse.
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Ator, diretor teatral, cantor, escritor e jornalista