Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quando o info-entretenimento oculta um mau jornalismo

O apresentador do Bom Dia São Paulo entrevista ao vivo o representante da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que administra o trânsito no município de São Paulo. O entrevistado afirma que o índice de congestionamento na cidade diminuiu. Mas o apresentador rebate e usa o seguinte argumento: “É a minha opinião, eu acho que não diminuiu e cada um tem a sua opinião.” Segue dizendo que a resposta da CET é a opinião da CET, muita gente tem outra opinião.

Aí acontece algo do outro mundo. O entrevistado toma a palavra novamente e diz que não se trata de opinião, não. A CET tem dados que mostram a diminuição dos índices de congestionamento na cidade de São Paulo. Há medições. Os números resultantes destas medições foram obtidos por uma empresa de fora do Brasil por meio de GPS. Explica como o trabalho é feito e arremata: “Então, não é uma questão de opinião.”

Ora, ora. O entrevistado acaba de lembrar a um apresentador do noticiário matutino da maior rede de TV brasileira que existe telejornalismo informativo. Ora, ora. O entrevistado acaba de lembrar a um jornalista que telejornalismo informativo se faz com informações, dados, medições de GPS e coisas do tipo. Numa palavra, com objetividade. Ora, ora. O entrevistado abre um sorriso de orelha a orelha no ar e diz textualmente: “Não é uma questão de opinião.” O cara está feliz, ele sabe do que está falando, domina o assunto e enfrenta o jornalista  com a maior tranquilidade.

Pois é, apresentar telejornal preparado apenas com a própria opinião, aliás sem embasamento, dá nisso. Qual seria a saída? No telejornalismo informativo clássico, uma saída seria confrontar a fonte especializada com outra fonte especializada. E sempre fazer a lição de casa para não deixar uma única fonte, ainda mais oficial, falar sozinha no ar.

Info-entretenimento mascara a falta de profissionalismo

A gente aprende como levantar outras fontes, fontes especializadas independentes sobre o mesmo assunto, nos primeiros passos de qualquer curso de telejornalismo sério. Mas o que acontece é que estamos deixando de lado as regras básicas de como fazer o bom telejornalismo, e também o bom jornalismo em geral, porque queremos ficar próximos do entretenimento.

Só que desconfio deste argumento fácil. Porque até para fazer entretenimento é preciso fazer um trabalho sério. Ou alguém vai dizer que o entretenimento também não é uma indústria? Olha que Walt Disney vai se revirar no túmulo.

Acontece que o info-entretenimento é uma palavra que está sendo usada para, na verdade, mascarar a falta de profissionalismo. E isso desqualifica não apenas o jornalismo, mas também o sério mundo do entretenimento, que movimenta bilhões de dólares todos os anos.

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Débora Cristine Rocha é jornalista, professora doutora em Comunicação e Semiótica, docente da Universidade Anhembi Morumbi