Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Imprensa estimula violência juvenil

Nesta manhã de segunda-feira (2/3), ao levar meu neto à escola infantil, entrei em uma farmácia e deparei com um desses jornais-tablóides que circulam, a preços acessíveis, nas mãos da população em geral, com a seguinte manchete na primeira página: ‘Máquina azul faz outra vítima’; e continua : ‘com show do ‘gladiador’ Kleber, que marcou três gols…’; ‘Líder disparado da competição, a vítima desta vez…; sob o comando do atacante Kleber, o gladiador…’. E nesse linguajar de ‘guerra’, de incentivo à ‘violência’ a notícia ocupa duas páginas no jornal.

Como mãe, avó, cidadã, professora e psicóloga fiquei intensamente indignada com tal linguagem jornalística: quer dizer que time de futebol agora é ‘máquina’ de fazer ‘vítimas’ e que jogador não joga mais bola, é ‘gladiador’, ou seja, matador? A linguagem figurada tem limites e não é neutra, ela divulga ideologias e idealizações. E tem que se ter muito cuidado com notícias dirigidas a adolescentes e jovens, em formação. Isso é incitamento à violência e ideologia que alimenta as fantasias e idealizações de uma juventude ávida de ‘emoções’, de ‘reconhecimento social’ e carente de ‘ídolos’ positivos. Taí estampado, como manchete, a ambivalência de um sistema ideológico que, de um lado, condena duramente os jovens que praticam todo tipo de violência nas torcidas organizadas ou em ‘tribos urbanas’, mas por outro lado incentiva e alimenta esta mesma violência.

A mesma hipocrisia, ambivalência e contradição encontramos todos dias na imprensa e na sociedade em geral que incentivam o comércio de bebidas alcoólicas, de soníferos, cigarros, ‘diazepans e fluoxetinas’, ou seja, estimulam as ‘fantasias e paraísos artificiais’ e por outro, condenam os jovens, dependentes químicos, às prisões, onde vão se ‘escolarizar’ na carreira do crime.

Estratégia de segurança

O resultado disso são ‘jovens trabalhadores assassinados covardemente; famílias desoladas e as penitenciárias cheias, não de ‘jornalistas sem ética e responsabilidade social’, que têm diploma de ensino superior, mas de jovens pobres e negros da periferia das cidades. Antes de serem presos são estimulados, mas depois que praticam os crimes ‘viram bandidos que os direitos humanos protegem’. E ninguém questiona ou condena um cotidiano estimulante à violência, uma imprensa de péssimo jornalismo e o ‘Deus-mercado’ que vendem produtos, idéias e ideologias em torno do ‘negócio’ das ‘máfias das torcidas organizadas’ e das drogas.

Cabe a nós, cidadãos, pais, mães, Juizado da Infância e Juventude, Ministério Público, escolas e universidades reagirmos a isso com toda a indignação civil e a responsabilidade que nos cabe diante de escandaloso incentivo à violência juvenil no nosso país.

Com certeza este tipo de mídia deve ser condenada e ser tema de debate em tempos de I Conferência Nacional dos Meios de Comunicação, de Quaresma e de Campanha da Fraternidade, pela justiça e paz!

Certos que o limite à ‘liberdade de imprensa’ tem que ser a ética e sua função social, responsável. Nesse sentido e reconhecendo a importância dos meios de comunicação, não poderíamos contar com eles como estratégia de segurança social e de garantia da vinculação clara e positiva entre informação e cidadania?

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Psicóloga social e participante da Rede Mineira de Educação do Campo