Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Escolhe direito, rapaz !

Não raro e o sujeito que mal entrou no banco escolar de um curso de Jornalismo acaba de desistir. Simplesmente larga a universidade. Não avisa, não abre a vaga para outro, não nada. A faculdade é que era ruim, avisa em casa. Dos 30 dias em que esteve na universidade, faltou em meia dúzia, chegou atrasado em um punhado de dias e ainda tinha tempo para, em meio às classes, consultar a rede social do momento.

Mas, mãe, pode apostar que a faculdade era ruim mesmo” repete o sujeito.

Um dos grandes dramas neste momento nas carreiras de Jornalismo diz respeito justamente à evasão. As instituições, com razão, preocupam-se mais e mais com este item, sejam elas confessionais, pertencentes a holdings educacionais ou públicas. O menino (ou a menina) passa no passa no processo seletivo e vai para a sala. Dá de cara com um professor cuja carreira no mercado foi frustrada e que descarrega no garoto toda sua negatividade para com a profissão que fez pouco dele. Momento seguinte e a adolescente que sonhava em ser apresentadora de televisão se vê diante de um laboratório-sucata. Bom, a manhã ainda não acabou e tem mais uma matéria: Teorias da Comunicação. E a menina só queria mesmo era continuar tendo tempo para ler um romance qualquer, em vez desses livros de autores que até agora ela não entendeu direito para que servem, já que a bagagem cultural dela é curta e o docente também não ajuda.

É claro que esses fatores não ajudam. Ou melhor, ajudam sim – a aumentar a evasão. Mas eles não estão no epicentro do problema. Não mesmo. O sujeito escolheu errado. Ou pior, não escolheu: a decisão se deu de maneira um tanto aleatória, já que ele, na primeira semana no curso de Jornalismo, finalmente aí descobre que repórter bom mesmo é aquele que toma sol e chuva na cabeça tanto quanto precisar. Eliane Brum é a prova disso. Caco Barcellos também. Martín Fernandez idem. Ou a equipe do El País Brasil. Tinha o dever esse garoto de descobrir isso antes de marcar o X na lista de opções de carreiras universitárias? Pode soar como fatalismo dizer que sim mas, vá lá, ficamos com um muito provavelmente. É o mínimo que se pode fazer quando se está diante de um momento crucial na vida, o da escolha da profissão a ser trilhada.

É fato que, em 30 dias, não é possível ter uma visão consistente de um curso de Jornalismo nem da área em si. Em um mês enfurnado em alguma sala é possível perceber, no máximo, que o professor pode não ser grande coisa mas, certamente, sabe bem mais do que todos os que estão sentados diante dele – e que também cabe à plateia buscar extrair o melhor daquele profissional. Em 30 dias, enfim, não dá para dizer que o professor não tem didática, um chavão bem chavão que costumamos ouvir volta e meia.

O curso errado

Alguém pode pensar que, ao escrever tais linhas, estou sendo corporativista, jogando a responsabilidade para adolescentes que mal estão descobrindo o mundo – e ainda por cima através de uma tela de celular. É possível que eu esteja sendo um pouco corporativista. Mas, espere, que vou te dizer algo: conheço um punhado de (agora) professores que fizeram seus cursos nas piores condições técnicas possíveis – quatro míseros gravadores para 270 alunos; uma ilha U-Matic que mais fazia crec-crec toda vez que algum botão era girado do que qualquer outra função; e três computadores da família Pentium (lembra deles?) que muitos preferiam chamar de Lentium. E essa gente toda foi para o mercado e se deu bem. E, neste instante, vários deles são professores de alto nível, mundo afora.

Sim, há muitos docentes difíceis de aguentar. Sim, há muitos laboratórios de chorar. Sim, o mercado não anda muito aquecido. Mas, sim, também aluno bom vira jornalista dos bons, do primeiro nível, aquela esfera composta por repórteres cujos olhos brilham quando farejam uma bela história.

Agora, se esse não é o seu caso, rapaz, provavelmente você está no curso errado. Sorte sua se descobrir isso nos primeiros 30 dias da faculdade. E sorte de quem herdará sua vaga, caso você tenha a decência de ir até a secretaria da instituição e desistir oficialmente. Da próxima vez, escolha direito. E, antes disso, leia escritos de Augusto Nunes, Maria Martín, Clóvis Rossi, José Carlos Fernandes e/ou Lucas Mendes, dentre outros tantos, para ver se você terá condições de um dia, deixar de ser gandula e jogar no time deles.

Res ipsa loquitur.

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Marcio Fernandes é chefe de gabinete da reitoria da Unicentro