FIM DA GZM
Cristiane Barbieri
‘Gazeta’ pode ir a leilão em até 30 dias
‘A empresa Problem Solver, fiel depositária da marca ‘Gazeta Mercantil’, pedirá na próxima segunda que seja remarcado novo leilão da marca. Segundo o advogado Carlo Frederico Müller, que representa a empresa, a expectativa é que o leilão seja marcado em até 30 dias. Nesta semana, Müller diz ter sido procurado por três interessados no título.
‘Como fiel depositária, a Problem Solver tem o dever legal de zelar pela marca e pretendemos pedir também sua propriedade’, afirma Müller.
Hoje, a marca ‘Gazeta Mercantil’ pertence à Gazeta Mercantil S.A., de Luiz Fernando Levy. Em 2003, foi licenciada à CBM (Companhia Brasileira de Multimídia), de Nelson Tanure, que anunciou nesta semana o rompimento do contrato de uso da marca. A última edição da ‘Gazeta’ sob responsabilidade da CBM circulou ontem.
Os funcionários da Gazeta entraram ontem em férias coletivas. A CBM, que também é dona da editora JB e da Peixes, que edita revistas como ‘Gula’ e ‘Viver Bem’, disse que realocará os empregados em outras publicações. A empresa prometeu pagar mais um mês de salário, após as férias coletivas.
O clima entre os funcionários, com relação ao recebimento de verbas rescisórias, férias e mês extra, é de ceticismo. ‘O histórico de mau pagador da CBM tem sido constante nos últimos anos e acentuou-se nos meses recentes’, diz Guto Camargo, presidente do sindicato dos jornalistas de São Paulo.
Na semana passada, o sindicato entrou com representação no Ministério Público por não recolhimento do FGTS, entre outras supostas irregularidades praticadas pela editora JB, que emprega os funcionários que produzem a ‘Gazeta’.
Apesar de acreditarem ser difícil a volta da publicação, os funcionários tentaram evitar o clima pesado no último dia. Após o fechamento da última edição do jornal, na noite de quinta, houve cervejada na Redação. Segundo jornalistas, o clima era de ‘dever cumprido e cabeça erguida’.
Em reportagem publicada na edição de ontem, a CBM informou que, por cinco anos, adiantou mais de R$ 100 milhões em pagamentos de royalties que seriam feitos à Gazeta Mercantil S.A.. Os recursos teriam sido usados para saldar obrigações de responsabilidade da Gazeta.
Durante a semana, Levy havia dito à Folha que, em caso de rompimento unilateral do contrato, processaria a CBM por perdas e danos. Procurados, nem ele nem a CBM responderam a pedidos de entrevista.’
POLÍTICA CULTURAL
Marcio Aith
Secretário evoca ‘espírito republicano’ de nova lei
‘O secretário-executivo do MinC (Ministério da Cultura), Alfredo Manevy, disse que uma parcela do empresariado entendeu melhor que outra o ‘espírito republicano’ contido na reforma proposta pelo governo à lei de incentivos culturais, a Lei Rouanet.
Em entrevista à Folha, ele afirmou que a resistência privada ao projeto vem menos de empresários, propriamente ditos, e mais de intermediários e advogados que funcionariam hoje como ‘despachantes de projetos culturais’, ‘um grupo que ganhou muito dinheiro com as distorções da lei, muito mais que os próprios artistas’.
Manevy referiu-se à reportagem publicada ontem na Folha mostrando que, nos termos propostos pelo Ministério da Cultura, o projeto deve reduzir o apetite do setor privado por investir em cultura.
Empresas consultadas anunciaram que devem reduzir seus investimentos na área, tanto os incentivados por redução de impostos quanto os feitos com recursos próprios.
Os empresários reclamam de um suposto direcionismo estatal contido no projeto. Eles enxergam, nos termos nele propostos, uma possibilidade de o MinC aprovar ou rejeitar projetos culturais com base em critérios subjetivos.
‘A proposta em consulta amplia faixas de renúncia e mantém autonomia da escolha’, disse Manevy. ‘Não vamos escolher nada. O que o projeto faz é incluir critérios na etapa anterior, do MinC. Quem avalia não é o governo, são os pares, artistas e produtores. A palavra critério não existe na lei atual. Foi justamente a ausência de critérios que permitiu abusos amplamente divulgados.’
Segundo o secretário, alguns empresários já perceberam que o objetivo do governo é melhorar a lei, tornando-a mais democrática, como é o caso do grupo Gerdau. ‘Outros, talvez por incompreensão, não pegaram o espírito da reforma, que é justamente desestatizar o mecenato privado’, afirmou.
Manevy relatou que, desde a apresentação do projeto, em março, o MinC já aceitou algumas contribuições feitas pela sociedade civil. Uma delas diz respeito justamente a necessidade de critérios públicos nas decisões empresariais. ‘As empresas podem adotar comportamentos públicos, é disso que trata a reforma.’
Pelo projeto inicial, estes critérios seriam definidos após a aprovação da lei. ‘Assimilamos que a própria lei já deve conter esses critérios’, afirmou.
Dinheiro público
Manevy diz ainda que, ao aprimorar a figura da renúncia fiscal, o projeto do governo não viola em nada o interesse de empresas sérias, interessadas em usar a lei para alavancar seus próprios orçamentos privados em cultura e não apenas usar dinheiro público.
‘Mecenato privado é assim no mundo todo, tem dinheiro privado’, disse Manevy. ‘O que não pode é o uso sem critérios de projetos 100% incentivados, como a lei atual define. Com o tempo, as empresas suprimiram os recursos próprios. E ficaram só com o velho e bom dinheiro do contribuinte. A queda atual é pela crise, não pela consulta pública.’’
Johanna Nublat e Larissa Guimarães
Projeto libera criar empresa para captação
‘Anteontem, Alfredo Manevy, em evento em Brasília, afirmou que uma das modificações que entrará no texto final do projeto da nova Rouanet será a possibilidade de o artista obter recurso da lei como pessoa física pelo Fundo Nacional de Cultura, sem a necessidade de montar uma empresa. ‘Hoje, a lei obriga todos os artistas a serem empresários, e fica caro’, disse.
Segundo ele, a proposta também vai desburocratizar o processo. A ideia saiu da consulta pública sobre a lei, já encerrada. O governo quer fechar o texto final da nova Rouanet em duas semanas. Depois, a proposta seguirá para o Congresso.
O ator Odilon Wagner, presidente da APTI (Associação dos Produtores Teatrais Independentes), afirma que a ideia da não necessidade de o artista ser pessoa jurídica pode não ajudar muito. ‘No ideal, é muito bonito, mas a prática do MinC é de uma burocracia extrema, que impede que os projetos sigam adiante.’’
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Clóvis Rossi
Ideias, apenas ideias
‘SÃO PAULO – O cientista político espanhol Antonio Elorza resgatou ontem, em coluna para ‘El País’, editorial de quase 50 anos atrás do jornal cubano ‘Prensa Libre’.
Para protestar contra o fechamento, pelo recém-inaugurado regime castrista, do ‘Diario de la Marina’, aliás adversário ideológico de ‘Prensa Libre’, o editorial dizia: ‘Se se começa perseguindo um jornal por manter uma ideia, se acabará perseguindo todas as ideias’. Vale, até certo ponto, para a Venezuela de Hugo Chávez, se seu socialismo do século 21 se mantiver na recaída cada vez mais intensa em uma das mais abomináveis características do socialismo do século 20, a perseguição a ideias.
O mais recente exemplo foi o constrangimento imposto ao escritor peruano Mário Vargas Llosa, instado a não emitir ideias sobre política venezuelana. Antes, Álvaro, o filho de Mário, sofrera idênticos constrangimentos. Diga-se que Álvaro Vargas Llosa é coautor do ‘Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano’, no qual se busca desclassificar todos os que têm ideias diferentes das dos autores, chegadinhos ao mais puro e duro liberalismo.
Em vez de proibir o livro, a melhor reação seria escrever um texto tipo ‘O Manual do Perfeito Idiota Neoliberal’ -livro, aliás, que a presente crise mais que justificaria. Louve-se, aliás, Chávez por ter seguido essa linha ao propor um debate entre intelectuais de direita e de esquerda. Ideias se combatem com ideias, não com a censura, a prisão ou o banimento de quem as difunde.
Aplicada a proposta ao Brasil, os intelectuais chapa branca repetiriam a safada teoria da conspiração que inventaram quando as notícias não eram agradáveis ao chefe? Nem ele acreditou, tanto que pediu desculpas publicamente pelos deslizes do PT. Mas foi a única ideia que essa gente produziu.’
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Juíza de 1º grau condena Folha a indenizar ex-dirigente da Anac
‘A juíza Maria Lucia Boutros Buchain Zoch Rodrigues, de Porto Alegre, condenou a Folha e a jornalista Renata Lo Prete, editora do ‘Painel’, ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 139.500,00 a Milton Zuanazzi, ex-presidente da Anac (Associação Nacional de Aviação Civil). Cabe recurso da sentença.
Zuanazzi alegou que teve sua honra ofendida. Na edição de 20 de julho de 2007, o ‘Painel’ informou que parlamentares do governo e da oposição, inclusive o relator da CPI do Apagão Aéreo, Marco Maia (PT-RS), viam promiscuidade entre as empresas aéreas e a Anac, fato evidenciado pela pressão para liberação da pista reformada do aeroporto de Congonhas, onde ocorreu o acidente com o Airbus da TAM.
Segundo a coluna, ‘no próprio governo, avalia-se que a Anac é a agência mais rendida aos interesses empresariais do setor que supostamente deveria regular’.
Zuanazzi sustentou que a pista fora liberada pela Infraero, e que o jornal lhe imputara o crime de corrupção passiva, ao acusá-lo de representar os interesses de uma companhia aérea.
Segundo a juíza, a coluna, ‘em vez de apenas narrar fatos verídicos’, ‘utilizou-se de um sensacionalismo barato, da pior espécie, que causou ao autor [Zuanazzi] um profundo dano moral’. A juíza afirmou que não lhe cabia ‘avaliar se houve, ou não, falhas na atuação dele’.
A Folha sustentou que não acusou o autor da ação de corrupção, e que os fatos são verídicos e incapazes de gerar a sua responsabilização, por conterem informações prestadas por parlamentares, ministros de Estado e assessores, cujos nomes não seriam revelados.
‘A jornalista e o jornal irão recorrer da decisão, tendo em vista que não houve ofensa, mas apenas expressão da opinião da jornalista, baseada em declarações oficiais e fatos comprovados’, afirma a advogada Taís Gasparian, que representa a Folha. ‘A manifestação do pensamento é livre no país, e não foi feita qualquer acusação. Confio na reforma da sentença’, diz a advogada.’
CIBERTERRORISMO
Andrea Murta
Obama terá ‘ciberczar’ para ‘guerras virtuais’
‘Após dizer que as redes digitais dos EUA são ‘bens nacionais estratégicos’, o presidente Barack Obama anunciou ontem a criação de um departamento específico na Casa Branca para ação em ‘guerras virtuais’. O órgão será coordenado por um ‘ciberczar’, cujo nome ainda não foi selecionado.
O novo cibercomando conduzirá não apenas operações de segurança mas também ofensivas contra ‘computadores inimigos’. Membros do governo não quiseram detalhar as potenciais operações ofensivas, mas afirmaram ver o ciberespaço como algo comparável a campos de batalha tradicionais.
Obama disse que tecnologias virtuais já são usadas em conflitos reais. ‘No ano passado, vislumbramos a próxima face da guerra. Enquanto tanques russos entravam na Geórgia, ciberataques prejudicaram sites do governo georgiano; os terroristas que semearam tanta morte e destruição em Mumbai se apoiaram não apenas em armas e granadas, mas também em sistemas GPS e telefones que usavam voz pela internet.’
Hoje, ações de segurança virtual nos EUA estão descoordenadas e distribuídas entre vários órgãos, como a Agência Nacional de Segurança (NSA) e o próprio Pentágono. Para Obama, o status quo não é eficiente: ‘Não estamos tão preparados como deveríamos, nem como governo nem como país. O ciberespaço é real, assim como as ameaças que derivam dele’. O novo ‘ciberczar’ integrará as políticas governamentais de cibersegurança e coordenará respostas a eventuais ataques virtuais.
‘A Al Qaeda e outros grupos terroristas já falaram de seu desejo de lançar ataques virtuais aos EUA. Atos de terror podem vir não só de extremistas suicidas, mas também de toques em um computador -uma arma de abalo em massa.’
A Casa Branca estima que nos últimos dois anos a atuação de criminosos virtuais custou mais de US$ 8 bilhões aos americanos. Só em 2008, dados digitais roubados somam valores de até US$ 1 trilhão em todo o mundo. O próprio presidente sofreu consequências dos ataques -sua campanha à Casa Branca teve os computadores invadidos e espionados.
Suspeita-se que parte dos ataques não seja ação de hackers isolados, mas sim espionagem por parte de governos estrangeiros, como o da China.
‘Por todas essas razões, está claro que a ameaça cibernética é um dos mais sérios desafios econômicos e de segurança nacional que nosso país enfrenta’, resumiu Obama.
Escalada
Obama se esforçou para apaziguar temores de que abusará das liberdades civis e privacidade digital no país. Ele afirmou que impedirá o governo de monitorar regularmente ‘redes do setor privado’ e que haverá um cargo no novo departamento específico para essa proteção.
Esse é um ponto delicado, principalmente após polêmicas do governo de George W. Bush relacionadas a escutas de comunicações sem mandato judicial e espionagem de e-mails.
Além da questão da privacidade, a iniciativa de ontem do governo gerou também temores de respostas externas agressivas. ‘Sem dúvida, a ação vai levar a uma escalada de estratégias para ataques e incidentes por adversários, incluindo Rússia e China, que verão a política dos EUA como um aumento de ameaças e legitimação dessas táticas’, disse ao ‘New York Times’ Ron Deibert, cofundador do relatório Monitor de Guerras de Informação e diretor do Laboratório Cidadão da Universidade de Toronto. ‘Podemos esperar ataques mais debilitantes em serviços e sites.’’
BIOGRAFIAS
Ruy Castro
O biografado vivo
‘RIO DE JANEIRO – Às vezes, me perguntam por que não escrevo biografias de gente viva. Respondo que o biografado vivo não é confiável -porque ele terá de ser ouvido e, ao ser entrevistado sobre si mesmo, mentirá para o biógrafo. Pior ainda, obrigará seus amigos a mentir sobre ele. Uma pessoa importante o suficiente para ser biografada em vida terá poder suficiente para fazer isso.
O biografado vivo é também impraticável, porque sua história ainda não terminou. Digamos que o ilustre já tenha para lá de 80 e sua vida pública esteja, para todos os efeitos, encerrada. Nem assim o biógrafo estará a salvo. De repente, com o oba-oba provocado pela biografia, o herói resolve voltar à ativa e, até por estar fora de forma, revela-se um tardio Drácula ou Jack, o Estripador. Pronto, lá se foi o livro para o vinagre.
Com o biografado morto e com a conta fechada, não há esse risco. Sabendo-se que uma boa biografia exige pelo menos dois ou três anos de trabalho, há poucas chances de qualquer coisa na vida do fulano, por mais grave, não vir à tona -nesse espaço de tempo, alguém deixará escapar até o segredo mais bem guardado. Não quer dizer que, quanto mais tempo leve o biógrafo, melhor ficará a biografia. Ao contrário: se levar tempo demais, o livro pode azedar.
Todas essas convicções perigam caducar com o lançamento em Nova York de uma biografia de Gabriel García Márquez pelo americano Gerald Martin. É um livro de 600 páginas, que o autor levou incríveis 18 anos para fazer e dos quais, segundo ele, só falou com García Márquez durante um mês. Não é uma biografia autorizada, diz Martin. No máximo, ‘tolerada’.
A ver. O ‘New York Times’ gostou, o que é bom sinal. Mas parece que García Márquez, vivo, aos 82 anos, também gostou. O que não é bom sinal.’
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