Terceirização de serviços de vigilância (O Globo, 11/3); limpeza (Folha de S.Paulo e Agora S.Paulo, 18/3); formação de professores e produção de material didático (Amazônia Jornal, Diário do Pará, 11/3, O Liberal, 18/3, Folha de S. Paulo, 13/3, entre outros); aluguel de computadores e prédios (Valor Econômico, 10/3, e Folha S.Paulo, 13/3); contratação de fundações empresariais para oferta de ensino à distância e capacitação de professores (O Globo, 15 e 18/3); e merenda (Folha de Londrina, 13/3; Jornal da Tarde, 18/3). Estas foram algumas das formas de transferência de recursos públicos da educação para a iniciativa privada, noticiadas de diferentes formas em jornais de todo o país no período de 4 a 18 de março.
O tema é bastante polêmico e há pesquisadores que afirmam ser esta a maneira mais lucrativa de privatização da educação: prestação de serviços ao poder público, em substituição à constituição de escolas privadas.
Aluguel de 75 mil computadores
No entanto, há diferenças entre elas que podem gerar interessantes abordagens. No anúncio de contratação de serviços de vigilância e limpeza, por exemplo, é importante falar da relação com a lei de responsabilidade fiscal, que limita os gastos com recursos humanos. Mas também é fundamental ouvir especialistas em administração pública que apontem quais devem ser os critérios para esta opção e os mecanismos de controle social sobre os processos de licitação e qualidade dos serviços ofertados.
O aluguel de prédios privados para a instalação de creches, uma alternativa pautada nas parcerias público-privadas como resposta rápida ao déficit de vagas em geral, mas particularmente às ações no sistema de Justiça sobre o tema, estimula reportagens que expliquem o que são essas parcerias, quais estados da Federação já adotam e qual é o volume de transferência de recursos públicos para a iniciativa privada no curto, médio e longo prazos.
Ainda sobre as diferentes formas de terceirização, interessante notar que apenas o Valor Econômico (10/3) noticiou o aluguel de 75 mil computadores pela SEE/SP, classificado como ‘um dos maiores projetos de terceirização de equipamentos de informática já realizados pelo poder público do país’. Importante os jornalistas de jornais regionais e do interior do estado ficarem atentos para os resultados dessa iniciativa para além das escolas da capital.
R$ 4,63 milhões para assessoria técnica
No caso da contratação da Fundação Roberto Marinho para a implantação do Telecurso no Rio de Janeiro (O Globo 15 e 18/3), além dos aspectos financeiros envolvidos e não informados nas reportagens, há também aspectos pedagógicos. Neste caso, é preciso ouvir pesquisadores/as da educação e administração pública sobre a pertinência do ensino à distância na educação básica e o impacto de sua adoção, como política pública, no ‘mercado’ de formação de professores, que tende a se voltar para os cursos de Pedagogia e reduzir as licenciaturas em disciplinas específicas, a exemplo do ocorrido no Ceará nos anos 1990.
Também é necessário investigar a opção por fundações empresariais, ou empresas, e não pelo estabelecimento de parcerias com universidades públicas, que desenvolvem ações no campo.
Ainda sobre a contratação de fundações e empresas, notável foi a repercussão dos erros encontrados no material didático distribuído pela Secretaria estadual de ensino (entre 17 e 19/3 Folha de S.Paulo; O Globo, Folha de S.Paulo, Jornal da Tarde, Correio Braziliense e Diário Catarinense).
Nenhuma das matérias citou quanto a SEE pagou pelo serviço, nem o processo de contratação. Este poderia ter sido um foco interessante de investigação, principalmente se considerasse que o governo federal já gasta recursos com a produção de material didático por meio do Programa Nacional do Livro Didático. Além disso, em 1/6/2006, a Fundação para o Desenvolvimento da Educação, do governo paulista, contratou por R$ 4,63 milhões, sem licitação, da mesma Fundação Vanzolini, para assessoria técnica de programa da SEE. Relatório do Tribunal de Contas do Estado julgou irregular a dispensa de licitação.
Cada professor(a) tem sua opinião
É preciso ouvir professores/as e pesquisadores/as sobre os argumentos que sustentam a opção da gestão paulista para a opção de produzir material próprio. De um lado, alega-se a intenção de padronizar os conteúdos da rede pública de ensino, e de outro, a possibilidade de contemplar especificidades regionais. O que há de tão específico nesse material produzido pela empresa/fundação contratada? A existência de um único Paraguai é fato no mundo todo, e não deveria ser diferente em São Paulo.
Os jornais do Distrito Federal (em 8 e 10/3, Correio Braziliense e Jornal de Brasília) saíram a campo para condenar o anúncio de greve dos professores da rede pública em reivindicação de reajuste salarial de 18,9%. Nos primeiros dias da cobertura, chamou a atenção que nem mesmo o sindicato da categoria tenha sido ouvido – os textos foram fartos em publicar a opinião de mães, estudantes e governo, todos condenando o movimento. No dia 11, o Jornal de Brasília ouviu a direção do sindicato e, no dia 15, o Correio Braziliense publicou entrevistas com o secretário de Educação e o presidente do órgão de representação da categoria. A lamentar a ausência de vozes dos professores/as para além das lideranças sindicais. O Jornal de Brasília (12/3), por exemplo, poderia ter incluído professores/as na interessante enquête que fez, com fotos e depoimentos de mães e estudantes. Sempre é bom lembrar que os sindicatos representam, legitimamente, os interesses corporativos, mas cada professor/a tem opiniões pessoais e plurais e é preciso que o público as conheça.
Assinaturas de revistas são para escolas
Destaque para a Folha de Pernambuco (9/3) que publicou reportagem de Yuri Queiroz sobre a ausência de iniciativas para a implementação da lei 10.639 no estado. A entrevista com a procuradora de Justiça Bernadete Azevedo tornou o texto muito especial ao trazer os mecanismos de justiciabilidade que podem ser acessados no caso, e por apontar a omissão das universidades na formação de professores para atuarem com o tema.
Infelizmente, o Dia Internacional da Mulher (8/mar) não estimulou pautas sobre o magistério. São 85% de mulheres e seria muito interessante ter ouvido pesquisadores/as que interpretassem a desvalorização docente na perspectiva das desigualdades de gênero.
Outra ausência significativa foi o silêncio da mídia em relação à polêmica em torno da compra de assinaturas da revista Nova Escola (Editora Abril) para os docentes da rede pública estadual de São Paulo. O tema foi tratado por blogs de jornalistas independentes (ver aqui) e pela rádio CBN – pouca repercussão para um tema que envolve R$ 3,74 milhões, dispensa de licitação e mudança de práticas – usualmente, as assinaturas de jornais e revistas são feitas para escolas, e não individualmente para cada professor/a.
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Da equipe do Observatório da Educação