Esta edição especial do Observatório da imprensa traz um mapeamento inédito do jornalismo em todo território brasileiro.
Para publicar esta primeira edição, tivemos que recorrer à Lei de Acesso à Informação para obter dados da Secom, órgão da presidência da república. Contamos também com dados obtidos através de uma campanha de crowdsourcing em que colaboradores voluntários indicaram a existência de 287 veículos. Contamos também com um levantamento fornecido pela Associação Nacional de Jornais (ANJ).
Criado como um banco de dados aberto ao público a ser atualizado anualmente, o Atlas da Notícia visa produzir um panorama dinâmico da profunda transformação do jornalismo — sobretudo o que produz notícias de interesse público no âmbito regional e local — em meio à chamada revolução digital e a uma persistente crise econômica.
Mesmo limitado a ferramentas estatísticas quantitativas, este primeiro retrato do jornalismo brasileiro revela que quando se trata de apurar e publicar notícias, o território brasileiro repete o padrão histórico de grandes desigualdades socioeconômicas.
Enquanto as regiões sul, sudeste e o Distrito Federal concentram a enorme maioria dos veículos, sejam impressos ou digitais, as regiões mais pobres, como o norte e nordeste são aquelas com o maior número dos chamados desertos de notícias. Nosso levantamento detectou “desertos” em 4.500 municípios brasileiros sem nenhum jornal impresso ou site jornalístico.
Produzido a partir de informações extraídas do Atlas, o mapa que ilustra este texto traz bons exemplos dessa desigualdade: com uma população de 420 mil habitantes, Florianópolis tem 30 jornais impressos e um índice de desenvolvimento humano municipal, o IDHM, de 0,847, além de uma renda per capita de 1.800 reais.
Já Natal, com 800 mil habitantes, tem apenas seis jornais impressos, apresenta um IDHM de 0,763 e uma renda per capita de 950 reais.
O Atlas também indica desertos de notícias em municípios de extrema vulnerabilidade socioambiental. A mineira Mariana, que assim como grande parte de municípios bacia do rio Doce até hoje sofre com o rompimento criminoso de uma represa de rejeitos da mineradora Samarco, em 2015, não conta com nenhum jornal impresso.
Este também é o caso da paraense Altamira, que sedia a represa hidrelétrica de Belo Monte, às margens do rio Xingu. Nosso levantamento revelou três veículos digitais em Mariana, com 54 mil habitantes, e apenas um veículo digital em Altamira, que tem 100 mil habitantes.
Neste primeiro olhar, nosso levantamento não especifica a circulação impressa e audiência dos veículos e tampouco a qualidade da produção jornalística. De caráter mais granular e qualitativo, tais análises requerem levantamentos sucessivos e minuciosos.
De agora em diante, nossa capacidade de manter o Atlas da Notícia atualizado — indicando a criação, fechamento ou migração de jornais impressos para o meio digital — dependerá sobretudo da continuidade de informações obtidas via crowdsourcing.
Por isso, o Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, que mantém o Observatório da Imprensa irá se empenhar na criação de uma rede de colaboradores, idealmente liderada por professores e alunos de jornalismo. Queremos não apenas atualizar, como aperfeiçoar nosso banco de dados.
Mas estamos certos que desde já o Atlas da Notícia representa um acervo precioso para jornalistas, pesquisadores acadêmicos, entidades do terceiro setor e respectivos financiadores, além das empresas de mídia, permitindo a geração de ideias e estratégias capazes de fortalecer a imprensa local e regional.
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Angela Pimenta é jornalista e presidente do Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo — que mantém o Observatório da Imprensa.
Observação: Este artigo foi reeditado às 16h53 do dia 08/11/2017 para tornar mais precisas, no quarto parágrafo, informações sobre o número de “desertos de notícias.” Nosso primeiro levantamento indica 4.500 municípios sem jornais impressos ou sites jornalísticos.