As edições de terça-feira (31/3) dos jornais brasileiros considerados de circulação nacional autorizam a afirmar que a imprensa está desperdiçando uma grande oportunidade para promover mudanças históricas no modo de fazer política no Brasil.
O escândalo que envolve a empreiteira Camargo Corrêa, e simboliza os vícios que nascem nas campanhas eleitorais e se propagam através da corrupção por todas as esferas do poder público, representa essa oportunidade. Mas os jornais preferem entrar no jogo partidário em vez de assumir a grandeza do papel que a sociedade espera deles.
Como disse o poeta Vinícius de Moraes, o ser humano precisa encarar o problema das colocações morais e estéticas. No caso do Brasil contemporâneo, que tenta se consolidar como democracia, o desafio é fazer escolhas morais e éticas nos negócios públicos. A tarefa se cumpre diariamente, nas decisões de cada cidadão, mas eventualmente a História apresenta oportunidades para mudanças mais amplas e profundas em toda a sociedade.
A imprensa já aproveitou uma dessas oportunidades, no final dos anos 1980, durante os debates para a nova Constituição. Naquela ocasião, traumatizada pelos 21 anos de ditadura, a sociedade aceitou alegremente uma constituinte plena de direitos teóricos, mas vaga em deveres e pouco pragmática. Muitos dos nossos problemas parecem derivar desse descompasso, desse salto na imposição de regras para uma cidadania quase determinada pelo Estado.
Apesar das distorções, porém, poucos discordariam da tese de que, mesmo as medidas mais controversas, ainda são melhores do que a ausência de liberdade que caracterizava o regime anterior.
Desafio a enfrentar
Há duas décadas, a imprensa cumpriu o papel de esclarecer a necessidade das mudanças para a sociedade. Mas hoje, diante de escândalos que revelam a necessidade de novas correções na vida institucional, os jornais demonstram que não querem uma reforma. Querem apenas preservar sua fatia de poder.
O noticiário sobre o escândalo que tem como epicentro a Camargo Corrêa mistura deliberadamente doações legais com a velha e conhecida propina, confunde advogado com lobista, tenta enfiar no mesmo saco todos os políticos para não ter que destacar os acusados que são simpáticos à imprensa.
A sociedade brasileira precisa da imprensa para enfrentar o desafio das colocações morais e éticas. É por aí que poderemos saber se a política pode ser minimamente moralizada ou se o Brasil deve se conformar com a imersão da vida pública na privada.
Mas a imprensa está preparada para essa tarefa?
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Revisando a História
Ao contrário de seus vizinhos, que enfrentaram com dignidade e clareza a tarefa de julgar as ditaduras militares que infestaram a América do Sul, o Brasil tenta varrer suas idiossincrasias para debaixo do tapete da História.
Esse comportamento seria parte da nossa ojeriza a encarar os problemas reais que infestam nossa vida institucional, como a corrupção e a falta de representatividade do Congresso Nacional.
O tema foi requentado recentemente pelo editorial da Folha de S.Paulo que aplicou o trocadilho ‘ditabranda’ ao regime militar que dominou o Brasil a partir de 1964.
Quanto das medidas autoritárias tomadas naquele período ainda envenenam a vida pública brasileiras, determinando o funcionamento dos partidos e mantendo no poder velhos coronéis da política?
O debate prossegue na edição de terça-feira (31/3) do Observatório da Imprensa na TV.
Alberto Dines:
O regime militar instalado há exatos 45 anos foi uma ditadura como todas as outras em todas as partes do mundo ou foi uma ‘ditabranda’, regime de exceção, porém amaciado? Será que não está na hora de examinar tudo o que aconteceu antes, durante e depois do golpe de Estado de 1964 que continuou durante 21 anos? Será que o autoritarismo foi extinto e o vale-tudo definitivamente expurgado da nossa vida política?
O Observatório da Imprensa na TV de terça (31/3) talvez responda a algumas dessas indagações. Às 22h40 pela TV Brasil em rede nacional, ao vivo. Em São Paulo, também pelo Canal 4 da Net e 181 da TVA.