O jornal Estado de Minas se livrou, por enquanto, da obrigação imposta por um juiz federal de publicar em seis páginas, mais chamada na primeira página, de direito de resposta da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) a uma série de reportagens com denúncias. Não é a primeira vez que um juiz dá esse tipo de sentença contra o jornal. Uma das vezes foi em 1989, a pedido do então governador Newton Cardoso, mas ele teve direito a menos de uma página das muitas que queria ocupar para refutar denúncias de enriquecimento ilícito, numa série de reportagens que deu ao jornal um Prêmio Esso.
Dessa vez, o que chamou a atenção do presidente da OAB, César Britto, segundo notícia do próprio jornal, na segunda-feira (30/3), foi que o juiz da 4ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, Ronaldo Santos de Oliveira, determinou o uso da polícia para cumprir sua ordem. Para Britto, isso é uma anomalia.
O jornal buscou a opinião de ‘políticos e juristas’ e publicou que, ‘para eles, a determinação atenta contra a liberdade de imprensa e não tem precedentes no Estado democrático’.
A liminar que suspendeu a ordem do juiz de primeira instância foi concedida sábado (28) à tarde pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, desembargador Jirair Aram Meguerian, poucas horas após receber o pedido feito pelos advogados do jornal. Meguerian considerou ‘teratológica’ a decisão do juiz obrigando a publicação de ‘matéria de cunho difamatório ao próprio jornal’.
Recurso negado
Ao relatar essa decisão, o diário diz que ‘a UFMG optou pelo caminho judicial depois de deixar sem resposta a série de matérias publicadas pelo Estado de Minas que mostram irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União no relacionamento da universidade com a Fundação de Desenvolvimento de Pesquisa (Fundep)’.
O jornal publicou texto assinado pelo vice-presidente e responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão da ANJ, Júlio César Mesquita, rejeitando a ‘forma como a Reitoria da UFMG age, tentando impor uma versão unilateral, a ser publicada em bloco e recheada de ataques ao jornal’, além de a criticar por não ‘abrir democraticamente seus arquivos para o devido esclarecimento dos fatos’.
Segundo o Estado de Minas, a primeira sentença foi dada na noite de uma sexta-feira, dia 20 de março. ‘A intimação ao jornal só ocorreu depois de encerrado o expediente na Justiça Federal, o que impediria recurso no mesmo dia. Os embargos declaratórios foram feitos no sábado, com pedido de suspensão da sentença, que previa multa diária de R$ 1 mil ao jornal. O juiz Ronaldo Santos de Oliveira teve, portanto, a semana inteira para analisar o recurso’.
Acrescenta que só na noite de sexta-feira (27/3), como ocorrera na semana anterior, o jornal voltou a ser notificado. ‘Mais uma vez, com comportamento truculento, estranho à boa conduta judicial. Um oficial de Justiça foi à sede do Estado de Minas avisar que haveria, ainda naquela noite, uma sentença sobre os embargos declaratórios, que foram rejeitados. Só mais tarde outro oficial chegou com a decisão, que antes não havia sido anexada ao processo’. Além de negar o recurso, ‘o juiz elevou de R$ 1 mil para R$ 100 mil a multa diária e determinou que a Polícia Federal fosse acionada para garantir o cumprimento da sentença’, escreveu o Estado de Minas.
Motivações
Os leitores mais atentos devem estar se perguntando o que motivou o jornal do grupo fundado por Assis Chateaubriand a fazer a série de reportagens que atinge a Reitoria da UFMG, uma entidade sempre tratada a pão-de-ló pelo Estado de Minas.
A série de reportagens contra Newton Cardoso teve uma motivação de cunho econômico – o governador havia suspendido a publicidade oficial para o jornal e outros veículos associados no estado. Foi provavelmente a primeira e última vez que o ‘maior jornal dos mineiros’ rompia com o Palácio da Liberdade.
Desconheço o motivo, desta vez. A UFMG é uma universidade ligada ao governo federal, mas o Estado de Minas não tem se destacado como opositor a Lula, mesmo porque Aécio Neves não veria com bons olhos uma campanha contra o presidente da República. Sua diretoria só autoriza ataques a governos, entidades e empresas após uma análise profunda de custos-benefícios. Uma análise que, raramente, leva em conta o interesse público.
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NOTA DA REITORIA
Por que a UFMG recorreu à Justiça pelo direito de resposta
A Universidade Federal de Minas Gerais esclarece que recorreu ao direito de resposta contra série de matérias publicadas pelo jornal Estado de Minas, conforme assegura o artigo 5º da Constituição Federal. A UFMG entende que o jornal mineiro lançou-se em campanha, desde o início de janeiro deste ano, com objetivo de macular a imagem da Instituição e de membros de sua comunidade. O direito de resposta da Universidade versa sobre matérias publicadas nos dias 7, 8, 9 e 11 de janeiro e, 1º de fevereiro e, busca esclarecer ao leitor do Estado de Minas os erros recorrentes e deliberados cometidos pelo jornal que, no intuito de manchar o nome da instituição e de membros de sua comunidade, continuou a praticá-los em edições posteriores.
A resposta da UFMG congrega seis páginas, além da capa de uma edição dominical. Entretanto, o Estado de Minas produziu, de forma seriada, conteúdo que supera 25 (vinte e cinco) páginas, excetuando-se o material publicado na versão online do jornal na Internet. Essas matérias foram capas no Caderno Gerais e manchetes ou chamadas de capas em 12 edições, sendo cinco delas dominicais.
É preciso esclarecer que a Administração Central da Universidade (Reitoria), adotando postura que marca a história e a tradição desta Instituição, colocou-se à disposição da equipe de repórteres do jornal mineiro para esclarecer todas as questões. Essa disponibilidade exigiu da administração da UFMG e de integrantes de sua comunidade a concessão de longas entrevistas e esclarecimentos, pessoalmente, por telefone e por meio de mensagens eletrônicas. Apesar desta conduta respeitosa e transparente, as notícias publicadas invariavelmente deturparam as informações prestadas e omitiram dados e fatos de extrema relevância para a compreensão das questões tratadas.
É preciso salientar que outros veículos de imprensa se debruçaram sobre o tema central – o conteúdo do acórdão do TCU –, mas sempre o fizeram, ao contrário do Estado de Minas, de forma isenta e idônea. Por exemplo, no dia 9 de janeiro, após todos os ex-reitores da Universidade divulgarem manifesto em apoio à atual gestão da UFMG, este veículo mineiro de imprensa publicou em sua capa a seguinte manchete ‘Ex-reitores apoiam gestão sob suspeita’ e no interior da edição foi publicada a matéria ‘Reitores se unem contra o TCU’. Apenas para efeito de comparação, um outro veículo de imprensa mineiro publicou matéria sobre o mesmo assunto e o título da reportagem foi ‘Reitores prestam solidariedade’.
A Universidade esclarece, também, que procurou entregar o pedido de Direito de Resposta diretamente ao jornal mineiro; entretanto, o Estado de Minas se negou a recebê-lo, alegando, na ocasião (no dia 6 de março de 2009) que o diretor geral do jornal estava em Brasília e que nenhum diretor ou funcionário do Estado de Minas estava autorizado a receber e protocolar o pedido de resposta da UFMG, conforme nota publicada no site de notícias da Universidade no dia 8 de março de 2009 sob o título ‘Jornal mineiro nega direito de resposta à UFMG‘. Em razão da postura do jornal Estado de Minas, a Universidade decidiu entrar com o pedido de direito de resposta na Justiça, como é assegurado pelo Estado de Direito.
A UFMG reconhece e ressalta a importância dos órgãos de imprensa na construção de uma sociedade republicana, democrática, igualitária e justa, entretanto discorda da forma como o jornal Estado de Minas tem abordado as questões relacionadas à Universidade. E, por acreditar e respeitar, divulgou em seu próprio site, nota à comunidade que informa que o jornal mineiro obteve liminar suspendendo a publicação do direito de resposta no último domingo [29/3] ‘Estado de Minas recorre e obtém liminar suspendendo decisão da 4ª Vara Federal‘.
Ressaltamos que a Universidade acredita, defende e sempre defenderá a liberdade de imprensa e, também, que mídia e jornalistas devem exercer este direito com responsabilidade e dentro das regras do Estado Democrático de Direito.
[Reitoria da Universidade Federal de Minas Gerais, 30 de março de 2009, às 20h18]
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Jornalista, Belo Horizonte