Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mesmo sendo um paraíso, se não tiver internet, não leve os filhos nas férias

Publicado originalmente no blog Histórias Mal Contadas.

A internet é mais importante que o mar para os filhos. (Foto: Agência Governo Paraná)

Bons tempos aqueles em que a família em férias, no extenso litoral brasileiro, escolhia para locar uma casa ou um resort pela proximidade com o mar, pelo acesso ao comércio e pelas belezas naturais ao redor.

Hoje isso ficou em segundo plano. Em primeiro lugar, vem a pergunta sobre a potência da internet, se tem Wi-Fi e se a cidade tem antena de celular 4G. Fora dessas especificações, a possibilidade de transformar as férias em um inferno é muito grande. Citei o litoral do Brasil por ser o endereço mais procurado pelas famílias durante as férias de verão. Aliás, o pouco interesse dos filhos pelo mar não nasceu com a proliferação da internet. Lembro que os adolescentes dos anos 90 voltavam depois de uma temporada na praia sem ter entrado uma única vez no mar. Faziam festa à noite inteira e dormiam o dia todo. Pelos menos não incomodavam, como acontece hoje quando não há internet ou se a que existe tem pouca potência, como é comum nas pequenas cidades litorâneas onde existem os paraísos da natureza.

A situação que descrevi eu já vivi como pai e repórter e cito nas minhas palestras nas redações dos jornais do interior do Brasil e nas faculdades de jornalismo. Essa história vivi em dois períodos distintos de tempo. A primeira foi com as minhas duas filhas, que hoje são adultas, na década de 90. E, na década atual, estou vivendo com os outros dois filhos, um adolescente e outra pré-adolescente. E tenho ouvido relatos semelhantes nas conversas com amigos, pais dos colegas da escola dos filhos e mesmo com desconhecidos. E por qual motivo cito isso nas palestras? Cito para lembrar que todo o ramo do jornalismo é sério. Vejamos. Uma família organiza as suas férias usando as informações das nossas reportagens publicadas nos cadernos especializados. Aqui reforço o seguinte: o lazer para uma família é o investimento de recursos que foram poupados o ano inteiro.

Portanto, quando sugerimos um passeio, temos que escrever de maneira simples, com exatidão e riqueza de detalhes, sobre o que estamos falando. Lembro o seguinte: na metade da década de 90, eu sugeri para a família visitar uma determinada praia do litoral baiano, com base em uma reportagem que havia sido publicada em um jornal de São Paulo. O lugar não era nada daquilo que tinha sido descrito na reportagem. Por detalhes, não levei uma surra da família.

O exagero dos adjetivos nesse tipo de reportagens era decorrência de uma situação que durou por muitos anos nas redações. As empresas de turismo, as prefeituras municipais e os outros interessados em atrair o turismo de férias pagavam a ida de jornalistas para vender o seu peixe.

Na última década, esse tipo de situação começou a ser informada para o leitor com um aviso: no final da reportagem, tem uma frase avisando que o repórter viajou a convite. Mais ainda: houve uma profissionalização maior nas editoriais dos jornais que tratam do lazer. O que resultou em uma maior segurança para o leitor da credibilidade do que foi publicado.

Mesmo assim, é raro encontrar nas reportagens referências à disponibilidade ou não de internet nos imóveis colocados para locação, nos hotéis e nos resorts. Me dei conta disso há uns cinco anos, primeiro no litoral de Santa Catarina e depois em praias do Nordeste. Instalado em um imóvel na beira de uma praia catarinense, no primeiro dia das férias, eu estava saboreando uma cerveja quando fui interrompido por um dos filhos com a pergunta: qual a senha do Wi-Fi? A casa não tinha internet. E o celular 4G não funcionava na região. Resultado: passei dez dias sendo questionado pela família sobre que espécie de repórter eu era se não tinha visto a questão da internet antes de locar a casa.

Em conversas com os vizinhos, pessoas que conheci em um boteco e mesmo com estranhos na beira da praia constatei que não era o único com o problema da internet. Dois anos depois, eu e a família fomos para uma praia no Nordeste. Dessa vez tomei o cuidado de ligar para o hotel para saber da existência da internet. Fui tranquilizado sobre o assunto. Eles falaram que havia internet e que existia um WI-FI por andar. Só não falaram, e eu não perguntei, que a potência da internet era pequena para atender ao número de hóspedes. Daí era o seguinte: em alguns locais do hotel, havia sinal do Wi-FI, e em outros não.

Vejo nesse tipo de situação uma oportunidade de nós, repórteres, sermos relevantes aos nossos leitores. Temos que ter em mente que tem a mesma importância para as famílias em férias ter luz, água, serviços de saúde e acesso à internet. Temos que começar a exigir das imobiliárias que essa informação seja dada aos seus clientes, E que hotéis e resorts sejam transparentes no assunto com os seus hóspedes. Essa é a situação.

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Carlos Wagner é jornalista.