Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A crise no jornalismo caipira

Na esteira da crise por que passa a imprensa brasileira, falida tanto economicamente quanto editorialmente, o jornalismo impresso do interior do país degringola. É certo que a imprensa interiorana sempre teve o vício do provincianismo, além de um fôlego financeiro muito menor do que o dos grandes jornalões do Brasil. Mas a crise intelectual podou no nascedouro qualquer tentativa de se pensar o jornalismo seriamente fora das capitais.

Nem é tanto o provincianismo e o bairrismo que atrapalham os caminhos dos jornais do interior. É a crise de estrutura, e, por conseqüência, de idéias. As redações estão mais do que enxutas, com menos do que o mínimo necessário de pessoal para levar adiante, diariamente, a construção de um jornalismo sequer aceitável. Pressionados comercialmente, aos poucos os jornais matam as tentativas, ainda insípidas fora das capitais, de se fazer um jornalismo investigativo, no sentido de uma apuração mais profunda dos fatos do que a prática ligeira que o cotidiano permite. Posto de lado, apenas o jornalismo dito ‘factual’ sobrevive, ainda assim a duras custas: os fatos nem sempre caem no colo do repórter ou pauteiro no sertão, longe do ritmo frenético das grandes cidades.

A insegurança predomina cada vez mais nas chefias de redação. Tenta-se, diante dos lucros cada vez menores (a maioria dos publishers caipiras pensa que jornal é o mesmo que fábrica de parafuso), ao menos igualar a cobertura à do concorrente. E nivela-se tudo por baixo: no dia seguinte, encontra-se o mesmo conteúdo, quase sempre pobre, nas estantes das bancas de jornais.

Ousar é perigoso

Muito desse jornalismo raso praticado no interior é causado pela má formação que as universidades vêm oferecendo aos estudantes de Jornalismo nos últimos anos. Vêem-se repórteres sem a mínima noção de cobertura de um fato, sem qualidade textual e mesmo com medo de sair do casulo da redação e encarar a rua. E, do outro lado, editores atarefados demais para se dedicar ao ensinamento de seus ‘pupilos’.

Juntando tudo isso, o diagnóstico triste é que jornalismo, no interior, na maioria dos casos virou sinônimo de burocracia. Tal qual cinderela, perdeu o encanto, aquilo que Gabriel García Márquez qualifica de ‘paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade’. Os mais experientes estão cientes da crise. Mas a crise de emprego no ramo os inibe de mudar o que aí está.

Não se investem em novas idéias a mais de 100 quilômetros das capitais. Ousar tornou-se perigoso. Empobrecidos editorialmente, os jornais ‘caipiras’ modorram, vítimas do fatalismo a que Monteiro Lobato, há quase um século, apontava na cultura do Jeca, em Urupês: ‘Se tudo movem cordéis lá de cima, para que lutar, reagir? Deus quis’.

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Jornalista em São José do Rio Preto (SP)