Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Errar é humano… e imortal

O fato não foi muito divulgado, mas deveria ser: o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) em sua 5ª edição recebeu correções e aditamentos nesse encarte. Também aqui.

A Academia Brasileira de Letras esclarece que os erros de revisão atingem apenas 0,04% do universo lexical de quase 390 mil palavras. No entanto, são mais de 100 palavras, número nada desprezível. Quanto aos aditamentos, trata-se de outras cento e poucas informações complementares. Para ambos os casos, a ABL pede a nossa compreensão, citando Cândido Figueiredo: ‘[…] raramente haverá trabalho literário que mais susceptível seja de correções e aditamentos do que o dicionário de uma língua’.

Explica, mas não justifica. E demonstra que, afinal, por mais simples que pareça, não é tão fácil lidar com as mudanças geradas pelo Acordo. Para nós, meros mortais, a assimilação tampouco será automática.

Vejamos alguns exemplos de correções e aditamentos.

A palavra ‘bule’ aparecia como substantivo feminino (s.f.), ‘coice de mula’ também, ‘bielorrusso’ estava com hífen (‘bielo-russo’), ‘fonofoto’ tinha sido classificado como substantivo masculino (s.m.), ‘rádom’ saiu sem acento. No vocábulo ‘cuco’ fazia-se uma equivocada referência a ‘mestre-cuca’. A lista de correções pede que substituamos ‘freireano’ por ‘freiriano’. E que leiamos ‘interósseo’ no lugar de ‘interrósseo’. Onde estavam os revisores antes?

Incongruências persistem

Um dos aditamentos causa bastante estranheza. É a exclusão da palavra ‘superávit’. O termo aportuguesado está desaconselhado? No seu lugar devemos empregar apenas a palavra latina superavit? Então por que manter ‘défice’, aportuguesamento de deficit? E (outros exemplos de aditamentos) quem tinha inventado ‘preditar’, ‘juncão’, ‘flor de lisado’, que agora saem correndo pela porta dos fundos?

Ainda outro aditamento, ‘benquerido’, antes tarde do que nunca, mas continuam incompreensivelmente excluídos ‘bem-passado’, ‘megassena’, ‘fio terra’, ‘seminovo’ e ‘lava rápido’.

Vários professores e articulistas observaram falhas ao longo dos últimos meses. Uma referia-se ao verbo ‘soto-pôr’, que antes do Acordo era ‘sotopor’. O problema é que o VOLP atualizado trouxe um incoerente ‘sotoposto’, sem hífen. Ora, o Acordo define claramente que o prefixo soto-, entre outros, exige união por hífen entre os dois elementos. O novo Dicionário Houaiss ignorou, acertadamente, a indicação do VOLP, que pede desculpas por mais este erro.

Persistem incongruências quanto ao Acordo. Uma das mais gritantes fere o bom-senso… É a própria locução ‘bom-senso’, com hífen, segundo o VOLP, mas sem hífen no Dicionário Houaiss e em outras fontes.

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br