Como artista visual e professor de comunicação, observo discrepâncias entre quem visita museus, galerias de arte e/ou centros culturais e os que têm pouco acesso à informação. Ao considerar o esforço de ultrapassar barreiras, por vezes intransponíveis, a sociedade brasileira tem o direito de acessar a cultura de forma digna.
Desse modo, convido os editoriais de jornalismo, do Brasil e do mundo, para pautar nossa produção cultural com maior destaque. Sim, isso é uma convocatória, um pedido de atenção na cobertura jornalística, em seus editoriais, no apoio incondicional à veiculação de arte, estética e cultura.
Em um país de poucas oportunidades e tamanha desigualdade econômica e social, cultura e educação são instâncias primordiais no desenvolvimento humano. Daí surge a necessidade da cobertura jornalística enfocar o debate crítico-reflexivo que tangencia arte, estética, cultura.
Jornalismo cultural
A produção cultural no Brasil passa por enorme crise acompanhada pelas crises econômica, política, ideológica. Parâmetros neoliberais conservadores provocam discussões inimagináveis, capazes de gerar conflitos e contradições (CANCLINI, 2016). A disputa paradoxal está bastante acirrada.
A diversidade cultural, nesse contexto, desafia artistas e intelectuais, visto que a liberdade de expressão requer espaço para dialogar com o/a outro/a. Muito embora seja imprescindível caminhar, continuar nossa jornada, sobretudo no processo de produção de conhecimento, informação e subjetividade (GUMBRECHT, 2015).
O papel do jornalismo é transformar o fato em notícia. Por isso, o papel do jornalismo cultural seria cuidar das matérias culturais que envolvem a jornada dos acontecimentos no seu entorno.
Instalação XXX_
A instalação XXX_, com curadoria do professor de jornalismo Luciano Maluly (ECA-USP), acontece na Caixa Cultural São Paulo até o dia 22 de março de 2020. Trata-se de meu trabalho como artista visual e pesquisador de experimentações poéticas – entre colagem, desenho, pintura, escultura e fotografia.
O objetivo é discutir o desperdício, com a (re)apropriação de materiais que relacionam arte e sustentabilidade. Tal ressignificação convida o público para “outro/novo” olhar sobre as coisas no mundo.
Preocupado com meio ambiente e consumo, a criação deste projeto de exposição deflagra uma noção de arte contemporânea para pensar. A obra Bola 7 (colagem e foto, 2019), por exemplo, compõe-se de restos de papel jornal impresso, cola, fita adesiva e spray formando bolas, em diversos tamanhos, que estão instaladas como escultura e fotografia.
Sem dúvida, isso não serve para ser entendido diretamente como arte, mas para levantar questões. Logo, evite perguntar: o que é isso? E passe a perguntar: como isso ocorre? A arte contemporânea não é para ser compreendida, uma vez que vale experimentar suas próprias impressões a respeito.
A pluralidade de representações fragmentadas elabora um conjunto de deslocamentos flexíveis (de visualidades e objetos) como produção de efeito. São alternativas de expressões singulares de nossa brasilidade.
Se a informação cada vez mais é comercializada como mercadoria (e vice-versa), destaca-se a dinâmica flexível da contemporaneidade (GARCIA, 2005). Na ordem do dia, o inseparável binômio mercado-mídia desafia a materialidade de qualquer produto/serviço para “vender” sensações.
Cobertura jornalística
O release dessa exposição, inaugurada no dia 25 de janeiro (aniversário da cidade de São Paulo), foi distribuído pela assessoria de imprensa na expectativa de angariar mídia espontânea. Ou seja, não há recurso para matéria paga.
No momento, a cobertura alcançou algumas mídias alternativas: o Jornal da USP; o Celacc; os Jornalistas Livres; o Sampa Online; o Jornal Cruzeiro do Sul; os blogs DevoraDigital, Aterjor, comcultura.wordpress.com, fatecitaqua.wordpres.com, além do Informe Semanal Centro Paula Souza – CPS.
Isso parece razoável, mas pode ser melhor, se for avaliada a circulação da informação na cidade de São Paulo e região. Para além de entretenimento, a ideia é não repetir o comum no próprio ambiente artístico, estético e cultural. Antes, porém, propor alternativas que provoquem reflexão.
REFERÊNCIAS
CANCLINI, N. G. O mundo inteiro como lugar estranho. São Paulo: Edusp, 2016.
GARCIA, W. Corpo, mídia e representação: estudos contemporâneos. São Paulo: Thomson, 2005.
GUMBRECHT, H. U. Nosso amplo presente: o tempo e a cultura contemporânea. São Paulo: Unesp editora, 2015.
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Wilton Garcia é artista visual, doutor em Comunicação pela USP, pós-doutor em Multimeios pela Unicamp, professor da Fatec Itaquá/SP e do PPG em Comunicação e Cultura da Uniso, Sorocaba.