A patética imagem de um presidente da República fazendo gesto de “banana” para jornalistas em vez de responder a seus questionamentos é sintomática para os tempos também patéticos – e por que não dizer sombrios – que vive o Brasil. Os ataques amplos e direcionados contra veículos de imprensa e jornalistas revelam a face de um governo de extrema-direita que jamais foi assim denominado pela imprensa tradicional brasileira. O termo extrema-direita (far right, ultraderecha, extrême droite) utilizado pela imprensa internacional para se referir a Bolsonaro foi inclusive evitado pela Folha de S.Paulo durante a campanha de 2018.
Paula Cesarino Costa, então ombudsman do jornal, escreveu em 14 de outubro de 2018 – portanto, antes do segundo turno das eleições – que “a Folha e os principais órgãos da imprensa brasileira se equivocam em não fazê-lo [chamar Bolsonaro de candidato de extrema-direita] e não parecem preocupados com a dimensão histórica desse entendimento”. A imprensa tradicional aderiu ao pensamento de que Bolsonaro seria enquadrado pela ala militar do governo e pelos ritos e protocolos da Presidência da República. Enganaram-se miseravelmente.
Diante de um levantamento sobre ataques do governo a jornalistas e veículos de imprensa publicado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), o presidente foi a uma rede social debochar, publicando interjeições de gargalhada. A Folha de S.Paulo é alvo preferencial de Bolsonaro. Mas ele também já criticou O Globo, Estadão e tantos outros veículos que somente deveriam publicar elogios ou anúncios de projetos do governo, e nunca críticas ou falhas da gestão. O presidente que não sabe a diferença entre política de governo e política de Estado também desconhece a ideia de imprensa livre.
No portão de entrada e saída do Palácio da Alvorada, jornalistas são tratados com desrespeito por grupelhos de apoio ao presidente – e pelo próprio presidente. É ali que os profissionais de imprensa se esgueiram, pendurando os gravadores e microfones num cercado de aço, e onde são achincalhados dia após dia. Desde 1º de janeiro de 2019, no dia da posse, Bolsonaro fez questão de humilhar jornalistas. Ao assumir o poder, colocou os profissionais num cercadinho, sob a mira de snipers espalhados pelos prédios da Esplanada dos Ministérios, com o recado de que não deveriam fazer movimentos suspeitos, como relatou aqui a jornalista da Folha Mônica Bergamo.
Há quem defenda que os jornalistas deveriam abandonar as coberturas e ignorar as declarações do presidente. Mas é evidente que, como profissionais, eles precisam cumprir seu trabalho, mesmo aos trancos e barrancos. Alvos fáceis das milícias virtuais que caçam qualquer um que se oponha ao governo ou mesmo o critique, os jornalistas sofrem ofensas morais, injúrias, calúnias e difamações. O exemplo mais claro é o caso da jornalista Patricia Campos Mello. Ela é vítima das mais horrendas difamações por ter publicado reportagem sobre os disparos de mensagens em massa no WhatsApp, bancados por empresários, em favor do então candidato Jair Bolsonaro e contra o PT. A matéria foi o estopim para demonstrações de ódio visceral contra Patricia.
Redações parecem incomodadas com o tratamento do presidente em relação aos jornalistas, mas permanecem atordoadas, apáticas, como boa parte da população brasileira. As entidades de classe saem em defesa dos jornalistas após ataques. Uma ou outra voz se levanta contra os arbítrios de Bolsonaro. Entre embates ferozes, humilhações em coletivas e ameaças contra a imprensa, o presidente segue distribuindo bananas. Não poderia ser outra a fruta numa República ridicularizada e impassível como o Brasil.
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Mailson Ramos é relações públicas formado pela Universidade Estadual da Bahia e editor de nossapolitica.net.