Fui um dos poucos brasileiros que não recebeu com ufanismo destrambelhado a notícia dos Jogos Olímpicos no país. Não se trata de falso ceticismo politiqueiro. Como praticante regular e amante dos esportes, minhas preocupações sempre foram outras. A principal delas diz respeito ao descaso para com os nossos atletas olímpicos em sua universalidade. Este sempre fora um problema crônico e ainda hoje, após conquistas inéditas e dignas de nota, como da equipe de ginástica, nos deparamos com vexames como o do caso da atleta Jade Barbosa.
Definitivamente, é gratificante a realização de um evento do porte dos jogos – principalmente para a politicada ter capital publicitário futuro –, os investimentos nas regiões que os receberão tendem a ser benéficos, se não para toda, ao menos para uma parte significativa da sociedade, mas é preciso atentar para os prós e contras de tal empreendimento. No caso do Pan em 2007, muitas instalações encontram-se quase às moscas, enquanto temos futuros talentos perdidos por falta de infra-estrutura adequada para desenvolvê-los ou condenados a treinar em ruas de empoeiradas e repletas de ‘obstáculos naturais’ – como buracos.
Não entrarei nem no mérito da violência do Rio de Janeiro, além dos problemas estruturais, como pudemos acompanhar nas últimas semanas. Temos urgências nacionais em diversas áreas e meu ceticismo alerta que, ao ficarmos bestificados com a ‘grandeza’ do Brasil, capaz de ser credor do FMI e receber Copa do Mundo e Jogos Olímpicos nos próximos sete anos, poderemos lançá-las para debaixo do tapete, optando por maquiar a realidade, ao invés de enfrentá-la como deve ser.
Ufanismo bocó
Muito me animaria ver os responsáveis pelo poder público investindo no esporte desde a tenra idade nas escolas. Mas um investimento real, visando aos crescimentos físico, psicológico e social do atleta. Não bastam somente quadras esportivas – o que também não raro falta. É necessário um comprometimento amplo.
Um país com as dimensão e potencialidade do Brasil não pode se contentar em ser mero participante – e agora, anfitrião – dos Jogos Olímpicos, ganhador de algumas medalhas em modalidades previsíveis. Devemos e podemos ir muito mais além, estar na ponta da tabela. Para isto se realizar teremos que ir além do ufanismo bocó em momentos específicos ou esforços abnegados de poucos.
Por fim, vale a pena ler a entrevista do ex-judoca Aurélio Miguel no site Terra Magazine. Sintetiza bem o meu ceticismo para com os Jogos Olímpicos por aqui.
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Servidor público, graduando em Ciências Sociais, Vila Velha, ES