Foram apresentados na terça-feira (13/10) os resultados do mais abrangente monitoramento já feito sobre a cobertura de ciência, tecnologia e inovação na imprensa brasileira. O estudo analisou as notícias publicadas sobre esse tema em 62 jornais ao longo de dois anos. Os resultados permitiram traçar um diagnóstico de como a mídia brasileira cobre ciência e apontar as principais deficiências dessa cobertura e os desafios para aprimorá-la.
O projeto foi realizado pela Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi).
Os resultados foram avaliados em um workshop realizado em Belo Horizonte, com a presença de jornalistas e gestores da área de ciência, tecnologia e inovação. O documento será atualizado a partir das discussões realizadas durante o evento e publicado na forma de livro. Confira um sumário executivo e a versão completa do relatório discutido no workshop.
Para Luiz Guilherme Queiroz Gomes, consultor de comunicação social da Fundep, o estudo é importante porque alimenta a reflexão sobre a comunicação de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. ‘Esse monitoramento aponta onde temos falhado, para que lado precisamos avançar, quais temáticas precisam ganhar espaço e quais fontes precisam ser ouvidas’, avalia. ‘A partir dessa reflexão, podemos elaborar estratégias e recomendações que possam contribuir para avançarmos nessa área.’
Dois anos de ciência nos jornais
O estudo analisou vários parâmetros de uma amostra de 2.599 notícias publicadas em 2007 e 2008 nos 62 jornais usados no trabalho. As matérias foram selecionadas a partir de palavras-chave ligadas ao universo da ciência, tecnologia e inovação. A distribuição dessas notícias foi desigual: os quatro diários de abrangência nacional analisados publicaram um quarto das notícias monitoradas em 2008, com uma média de 2,3 notícias por dia – nos jornais regionais, a média foi de 0,6 por dia.
As ciências da saúde são a área com maior visibilidade, aparecendo com 28% das notícias analisadas, seguidas pelas ciências biológicas (21%) e pelas ciências exatas e da terra (18%). As ciências humanas e sociais aplicadas são as que tiveram menos espaço – juntas, elas respondem por menos de 18% dos textos.
O monitoramento apontou as principais fragilidades na cobertura dos temas analisados. A falta de contextualização das notícias é o calcanhar de Aquiles do jornalismo de ciência: cerca de 86% das notícias avaliadas apresentaram poucos ou nenhum elemento de contextualização que permitisse colocar o fato noticiado em perspectiva.
Da mesma forma, falta à cobertura da área apresentar as notícias sob uma maior pluralidade de pontos de vista. Mais da metade dos textos analisados (55%) foi feita a partir da consulta a uma única fonte. Além disso, apenas 13% dos textos analisados apontaram algum grau de incerteza na atividade científica, e as discussões éticas apareceram em apenas cerca de 12% dos textos.
Outro dado alarmante é a incapacidade do jornalismo de ciência de enxergar as grandes questões da ciência para além das pesquisas pontuais noticiadas. Os textos analisados no estudo se dedicavam na maior parte a noticiar estudos científicos ou avanços tecnológicos específicos; apenas 15% deles promoveram discussões sobre ciência de forma mais ampla.
Demanda por qualificação
Para o secretário-executivo da Andi, Veet Vivarta, os resultados do monitoramento apontam a necessidade de se investir na formação dos jornalistas da área. ‘A boa notícia é que o espaço para pautas de ciência, tecnologia e inovação está dado e que há ótimos exemplos de cobertura de qualidade, mas ainda não são a média’, avalia. ‘Há uma demanda por capacitação e qualificação, e ela atinge não só as próprias redações, mas também as fontes de informação, que são o outro lado da notícia.’
Os resultados vão ajudar ainda a elaborar estratégias para aproximar os veículos da imprensa e o público. O diretor do Departamento de Difusão da Ciência do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Ildeu Moreira, analisou os resultados à luz de uma enquete sobre a percepção pública da ciência promovida em 2006 pelo MCT.
‘Essa enquete mostrou que uma percentagem importante do público tem interesse declarado pela ciência e pouca informação sobre a área’, lembrou Moreira. ‘Além disso, tanto os cientistas quanto os jornalistas contam com grande credibilidade junto ao público, o que reforça a responsabilidade de ambas as categorias ao noticiar temas ligados à ciência.’
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Jornalista