Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O desafio de segunda onda ao jornalismo

Foto: Marcelo Seabra/Ag.Para

Estamos vivendo um preocupante paradoxo. A pandemia do Coronavírus volta a encher hospitais, mas os cuidados da população são cada vez menores. Há um crescente descompasso entre as advertências de médicos e a resposta do público que dá nítidos sinais de cansaço em relação às medidas preventivas contra a doença.

Se levarmos em conta que entre o pessoal médico e as pessoas comuns está a imprensa, a questão passa a ser também um desafio ao jornalismo e aos donos de empresas jornalísticas. As estratégias editoriais usadas até agora se mostram insuficientes para provocar a mesma mobilização social registrada no início da pandemia, em fevereiro e março deste ano.

O que começamos a perceber é uma crescente indiferença em consideráveis segmentos do público, em especial entre os jovens, trabalhadores de baixa renda, desempregados e alguns grupos de alta classe média. Não é uma atitude de resistência às medidas governamentais de contenção da pandemia, como a demonstrada por setores de negacionistas de extrema direita.

A intensidade da indiferença foi medida nos Estados Unidos, numa pesquisa do site Axios com base no fluxo de mensagens (likes, comentários e compartilhamentos) sobre a Covid-19, entre usuários de redes sociais, nas primeiras semanas de dezembro. Enquanto o número de norte-americanos que testaram positivo para a Covid disparou para alarmantes 146 mil casos diários, as interações nas redes sociais sobre a pandemia despencaram de 75 milhões por dia, depois de terem atingido pouco mais de 600 milhões a cada 24 horas, em março.

A explicação corrente na imprensa, tanto brasileira como internacional, é a de que as pessoas estão cansadas de tanto ouvir falar em Coronavírus. Esperava-se que o interesse ressurgisse com a intensificação do noticiário sobre novas vacinas, mas o tema não chegou a quebrar a apatia de muita gente.
Agora surge uma nova tentativa de entender o comportamento público. A resistência passiva às medidas de prevenção seria uma forma das pessoas dissimularem a sensação de insegurança e incerteza diante de uma doença ainda sem cura e que, além de introduzir novos hábitos individuais, provoca consequências macroeconômicas e macro políticas.

Noticiário pouco criativo

Numa conjuntura como esta, o papel da imprensa e do jornalismo, como intermediários no fluxo noticioso, passa a exigir de profissionais e executivos uma reavaliação das estratégias editoriais adotadas até agora. As decisões das autoridades sanitárias passam obrigatoriamente pelos meios de comunicação, incluindo imprensa e redes sociais.

São estes intermediários que formatam as mensagens para que elas consigam captar a atenção do público e garantem a interatividade entre tomadores decisões e as audiências. Quando as mensagens não logram despertar a atenção das pessoas é um sinal de que o jornalismo não está falhando em sua função pública.

A mediação entre os meios de comunicação jornalística e os tomadores de decisões torna-se agora especialmente relevante com o aumento da expectativa das pessoas com as vacinas contra o Coronavírus. Há uma forte probabilidade de que o grande público só poderá se vacinar a partir de maio do ano que vem, o que implica uma espera carregada de incertezas.

O noticiário recente sobre a pandemia tornou-se repetitivo e pouco criativo. A imprensa está apostando tudo nas vacinas como se elas pudessem operar o milagre de acabar com a Covid de uma vez por todas. As informações disponíveis indicam que as vacinas podem frear o avanço da doença, mas as medidas preventivas ainda serão necessárias durante um tempo não definido até agora.

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Carlos Castilho é jornalista, graduado em mídias eletrônicas, com mestrado e doutorado em Jornalismo Digital e pós-doutorado em Jornalismo Local.