Começa 2021 sem grandes esperanças. A conta a pagar deixada por 2020 é pesada e vai colocar quase todo mundo no vermelho: pessoas, empresas e indústrias. Só quem investiu nas desgraças provocadas pelo vírus vai ter bom retorno. Nesta semana, começarão em Genebra os despejos por falta de pagamento de aluguel mesmo se as ruas estão geladas e algumas ainda com a neve dos últimos dias. Na França, uma lei social impede despejos durante os meses do inverno.
No Brasil, é verão, não há nenhuma lei protegendo locatário devendo aluguel e o governo cortou a ajuda do auxílio emergencial, enquanto a retração de muitos setores da economia provoca um aumento do número de desempregados.
As igrejas católicas estão mais vazias, talvez para não provocarem ajuntamentos. Porém, os evangélicos mostram igrejas cheias – espalharam o boato de haver nessas igrejas uma espécie de pára-raios contra os coronavírus, movido por orações e ofertas. Versão brasileira das indulgências para ir ao céu, vendidas na época da Idade Média pelo frade Johann Tetzel. O rendoso pára-raios não protege e nem cura, mas, infelizmente, não há nenhum registro das pessoas infectadas pelo vírus nesses cultos de enganação bíblica. Em todo caso, como diz o presidente “ninguém morre antes da hora”, embora o atual desgoverno pareça ter acelerado os relógios.
Israel anuncia que até o fim de fevereiro terá controlada a pandemia do coronavírus com a vacinação da maioria da população e a mídia europeia destaca a importância do avanço israelense para a compreensão do controle do vírus pela vacinação. Apontada sempre como exemplo, desta vez a Suíça fez seu mea culpa por não ter reagido às ameaças do coronavírus a tempo. Só não diz ter priorizado a economia em lugar da saúde do seu povo. Terminando o ano com medidas severas de confinamento, a Suíça conseguiu evitar, em cima da hora, a falta de leitos nos hospitais, enquanto explodiam os casos de contaminações.
O número de vacinados ainda é irrisório mesmo porque não há vacinas suficientes. O resultado é serem pessimistas as previsões: só no fim deste ano 2021 se poderá retornar à vida normal. Diante desse pessimismo suíço, qual a previsão possível para o Brasil, onde se fala em começar a vacinação só em fins de fevereiro, enquanto setores conservadores e pastores evangélicos incitam seu rebanho também chamado de gado a não se vacinarem? Até onde a ignorância, a cegueira e o populismo religioso favorecerão Bolsonaro? Até 300 ou 400 mil mortos juntos com desemprego e crise econômica?
Igual ou pior que Bolsonaro só mesmo Trump, ainda tentando implantar nos EUA o mesmo cenário de golpe ensinado pelos americanos aos ditadores das republiquetas sul-americanas. Registrem aí — essa farsa do Trump será adotada ipsis litteris por seu imitador em 2022, caso não seja reeleito, com a agravante de provocar realmente um golpe no Brasil. Porém, talvez nem precise, as sondagens lhe garantem até agora uma abençoada reeleição com culto de ação de graças na igreja pentecostal do Silas Malafaia!
A boa notícia nesta primeira semana de janeiro, é a decisão de uma juíza inglesa de não autorizar a extradição do militante Julian Assange, pedida pelos Estados Unidos de Donald Trump. A intenção era a de destruir Assange numa prisão americana. Assange, hoje com 49 anos, poderia ser condenado a 150 anos de prisão.
E, enfim, vamos falar do vício mais praticado por todos os homens e mulheres, o vício solitário, condenado pelas religiões embora também praticado hipocritamente pelos líderes religiosos. Uma associação, cofinanciada pelo governo suíço, Saúde Sexual, provocou a ira de uma deputada de extrema-direita, por considerar normal e, de certa forma incentivar, a masturbação. Ora, uma pesquisa da Universidade de Berna, na capital suíça, mostrou que 94% das jovens e 98% dos jovens gostam e praticam regularmente a masturbação.
Embora considerada tabu e mesmo praticamente proibida de ser mencionada nas conversações, a prática da masturbação é considerada pela associação Saúde Sexual, com base na própria Organização Mundial da Saúde, como algo normal na vida das pessoas. Por isso, Saúde Sexual decidiu declarar guerra a esse tabu, para que seja sempre incluído nos cursos de educação sexual como algo normal, do qual não se deve ter vergonha, como geralmente ocorre com as jovens. Essa campanha deveria também ser levada ao Brasil, onde masturbação é considerada pecado grave e punida severamente por Deus. Em síntese, para os religiosos e conservadores, todo prazer é pecado!
***
Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro Sujo da Corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A Rebelião Romântica da Jovem Guarda, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.