No fim de semana ensolarado da capital federal, de 20 a 22 de novembro, deixei meus compromissos familiares, religiosos e pessoais de lado e fui dar a minha pequena contribuição às últimas discussões e definições, em nível distrital – seria estadual se fosse em outra unidade da federação – a título de consolidar as propostas para a 1ª Conferência Nacional de Comunicação, marcada para 14 a 17 de dezembro, também em Brasília (DF).
Pelo que pude acompanhar nas palestras e debates, há posições muito diferentes e conflitantes, que separam o nicho da sociedade civil do campo empresarial do pessoal do campo público. Os representantes do setor estatal nem se manifestaram. Acho que teremos muitas emoções no evento nacional. Em palavras menos diplomáticas e mais assembleísticas, o pau vai comer.
O período de inscrições foi curtíssimo – apenas uma semana e pela internet –, para um número limitado de participantes. Como era de se esperar, não houve divulgação em massa. No decorrer do encontro, fiquei sabendo de uma acusação dos movimentos sociais de que o governo do Distrito Federal, responsável pela organização, estava enrolando na preparação, desde agosto, e deixou tudo para a última hora. O prazo máximo das conferências estaduais e distrital definido pela comissão nacional era justamente o dia 22/11.
Debates e propostas
Dos inscritos, 190 se credenciaram: 113, da sociedade civil pública; 71, da sociedade civil empresarial; e apenas seis, do setor estatal. O regimento aprovado definiu o tema ‘Comunicação: meios para a produção de direitos e de cidadania na era digital’. Para a discussão e oferecimento de propostas, o tema foi separado em três eixos que davam nomes aos grupos de trabalho: Produção de conteúdo, Meios de distribuição e Cidadania: direitos e deveres.
Como não representava nenhuma entidade – cada qual com a sua sigla, documentos, moções (assinei todas), camisetas, estereótipos e palavras de ordem –, fiquei meio sem saber em qual grupo me inscreveria. Cheguei a trocar umas ideias com a gentil recepcionista do evento que, apesar de entender menos que eu das repercussões daquela escolha, tentou ajudar. Como sou jornalista, minha primeira opção foi pela produção de conteúdo.
Entretanto, depois das palestras iniciais, entendi que deveria me juntar ao grupo que apresentaria propostas sobre os meios de distribuição, já que fiquei empolgado com a possibilidade de propor a criação de conselhos públicos de gestão, não só para veículos públicos, mas também para os estatais. Parto do princípio de que, se usa verba pública, deve ter um controle social efetivo e não só via controle remoto, como propõe o pessoal da iniciativa privada. O que vemos são os governos de plantão usando um patrimônio público para promoção do próprio governo e da figura dos governantes, numa clara demonstração de patrimonialismo e clientelismo explícitos.
E não é que a participação foi democrática, mesmo? Confesso que fiquei surpreso – uma vez que não tinha nenhuma entidade e sua respectiva sigla me apoiando – quando consegui emplacar duas proposições que serão encaminhadas à Conferência Nacional. A primeira, em uma proposta do Coletivo Intervozes sobre a criação de conselhos com participação majoritária da sociedade civil nos veículos públicos, acrescentamos os veículos estatais na mesma condição.
A outra foi mais específica, já que milito no jornalismo legislativo. Trata-se da criação de conselho público de gestão para os veículos de comunicação de massa mantidos pelo Poder Legislativo e pelo Poder Judiciário, de caráter deliberativo, composto igualitariamente por representantes da direção do respectivo órgão, dos servidores do veículo e da sociedade civil.
Pouca participação empresarial
Aqui vale uma menção de louvor à participação das entidades patronais na conferência, entre elas a ABRA (Associação Brasileira de Radiodifusão), capitaneada pela Rede Band, e a Telebrasil. Feia foi a ausência de algumas entidades de peso, como a Abert, ANJ, Abranet, ABTA e outras, que fugiram do debate meses atrás.
O que fica é uma sensação de que a sociedade ainda precisa se mobilizar para discutir um direito que é seu. Por exemplo, em se tratando da mídia eletrônica, que usa e abusa do espectro eletromagnético que, por princípio constitucional, é patrimônio público. O problema é que o Estado brasileiro decidiu, na época da ditadura Vargas, distribuir concessões para que o negócio fosse tocado pela iniciativa privada. O resultado é que alguns empresários ligados à elite governamental transformaram essas concessões em patrimônio familiar, o que acaba dificultando um maior controle social dos veículos.
Enquanto não houver uma real conscientização da importância central do maior interessado no assunto – Sua Excelência, o público – os fóruns de discussão e os órgãos que definem as políticas públicas ficarão reféns de uma polarização que não leva a lugar algum e o diálogo estará sempre prejudicado. O resultado é que o controle do fluxo de informações de interesse público continua sendo feita de forma unilateral. Ou seja, não existe comunicação, diálogo, e sim fornecimento de conteúdo interessado apenas em manter as relações de poder no seio da sociedade.
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Jornalista, mestre em Comunicação Social pela UnB, Brasília, DF