A sustentabilidade das mídias livres foi um dos temas mais debatidos durante o II Fórum de Mídia Livre, que foi realizado em Vitória (ES), no fim de semana de 4 a 6/12. Toda uma manhã e uma tarde do encontro foram dedicadas à discussão do problema do financiamento, que já foi responsável pelo fechamento de veículos e projetos alternativos importantes. O caminho apontado pelos participantes deve ser o de aproximar os chamados midialivristas da rede de economia solidária e criar uma rede própria, da comunicação. Até a criação de uma moeda social surgiu nas conversas.
A questão não é simples. Além de pensar formas de captar verba para criar e manter projetos de comunicação comunitários e alternativos, ainda há o impasse sobre como o modelo de financiamento pode manter a independência e autonomia dessas mídias. O que fazer diante de tal situação? Recorrer ao mercado tradicional? Criar outro tipo de mercado? Cobrar investimentos do Estado? Essas foram algumas das dúvidas que guiaram o debate.
Tomando como exemplo experiências construídas com mais freqüência em outras áreas, a prestação e a troca de serviços e produtos entre os grupos midialivristas foi bastante citada nos debates do Fórum de Vitória. Um dos pontos positivos desse modelo é a possibilidade de conseguir recursos a partir de algo que o grupo cultural ou midiático já produz. Isso pode diminuir a necessidade de buscar auxílio em editais abertos por órgãos ou empresas públicas, por exemplo, que não necessariamente podem atender o conjunto de produtores de uma determinada área e também podem variar de acordo com os governos vigentes.
Caminho do meio
Algumas iniciativas já estão sendo realizadas neste sentido, pelo menos dentro de outros circuitos, como os dos Pontos de Cultura. O projeto iTEIA, idealizado pelo Instituto InterCidadania, vai criar a partir do ano que vem um ambiente digital em seu site para que os grupos divulguem e troquem produtos e serviços entre si. ‘A gente já trabalha com a troca presencialmente. O que o Pontão do iTEIA pretende fazer agora é criar um módulo onde isso pode ser feito de maneira virtual’, explica o coordenador de Articulação e Treinamento do projeto, Pedro Jatobá. Ele também diz que isso será feito em parceria com o grupo Cirandas, que mantém um portal de economia solidária na internet.
Essa espécie de ‘escambo moderno’, porém, pode também trazer seus riscos para determinados grupos. É o que avalia Marco ‘Amarelo’ Konopacki , integrante do Coletivo Soylocoporti. Sua análise parte da perspectiva de que nem todos os produtores culturais e de mídia livre podem estar interessados em oferecer um produto. ‘A gente não pode ficar sempre refém de que toda cultura vai se tornar um produto de entretenimento e que vai poder ser vendido’, diz.
Além disso, ele acredita que a prática precisa ser pensada a partir de quem a utiliza. ‘É diferente falar de cooperativas e associações que fazem alguma disputa política. A cooperativa tem a função de trabalho, que utiliza seu tempo para organizar trabalhadores e obter renda com isso. Agora, associações tem basicamente uma função política. Então, se elas passam a prestar serviço e às vezes tem que adaptar seu discurso para ir para o mercado e obter renda, é perigoso’, compara Amarelo. E defende: ‘De fato, o caminho do meio poderia ser uma boa alternativa. Ou seja, parte um financiamento público e parte do financiamento do mercado’.
Bom e ruim
Embora não discorde da eficiência do modelo, o gerente de Comunicação e Mobilização Social da Fundação Banco do Brasil, Claiton Mello, reforça a importância do Estado no fomento às mídias livres. Ele lembra que as empresas de comunicação, além de subsídios, recebem recursos públicos por meio de publicidades vindas dos governos e de empresas e autarquias ligadas a eles. ‘Essa é uma forma de garantir que esse segmento industrial exista’, diz Claiton. Por isso, seria justo reivindicar que essas verbas também contemplassem as mídias livres.
Talvez a tese mais aceita para solucionar o problema da falta de sustentabilidade seja a combinação das várias saídas possíveis, já que cada uma delas tem seus poréns. ‘O problema da gente é achar, às vezes, que virá uma resposta que é uma regra geral que todos devem copiar. É o que tem acontecido com os editais. Parece que todo mundo tem que parar suas ações, que já são sustentáveis, e botar uma equipe de cinco, seis pessoas escrevendo projeto para todos editais e criando idéias mirabolantes’, acredita Pedro Jatobá.
O conselheiro do jornal Le Monde Diplomatique Brasil, Antonio Martins, mais do que apresentar uma proposta, fez uma observação sobre a atual conjuntura, que acelera esse tipo de debate. ‘Há um declínio do trabalho assalariado para algo que pode ser muito bacana, mas pode ser muito ruim’, analisou.