Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As inovações, os feitos e a presença da mulher

[do release da editora]

Este livro é considerado o mais completo sobre a história da imprensa da antiga província de São Luís, MA, pelo leque de assuntos abordados e dezenas de equívocos corrigidos pelo autor, que se baseou, principalmente, nas páginas dos jornais. Sebastião Jorge, que escreveu sete livros, incluindo o presente, todos explorando a área do jornalismo impresso, ressalta a importância da obra pelo implemento de características criadas com o objetivo de atrair o leitor. Tais atributos constam como sendo de autores estrangeiros ou nacionais, pelos livros que tratam do assunto, a exemplo do lead, do New Journalism (Novo Jornalismo), Jornalismo de Denúncia, emprego de refinado humor, com inspiração, ao que tudo indica, em Jonathan Swift. Em todos os textos deixaram transparecer o estilo panfletário.

Quanto ao humor, em certos momentos cáustico, com a intenção de desmoralizar ou tirar de cena o contendor, há um caso que fez rir toda a cidade. Dois médicos, o francês Affonso Saulnier e Silva Maia, ambos respeitados pela competência profissional, mas, quanto ao segundo, um político com rara capacidade para fechar acordos, não perder a liderança e perseguir uma fatia do poder. Os dois médicos discutiam sobre o colera morbus, que atacou a província fazendo muitas vítimas. Silva Maia, pelo Publicador Maranhense (de 1862), perdeu a esportiva, desviou o assunto e chamou os publicistas do jornal contrário, o Coalição (Coalizão, de 1862), de ‘garotos’. Foi um passo para o assunto terminar em deboches e gozações contra o político.

Prática indecorosa eleitoral

Os ‘garotos’ apelaram para o deboche, acusando o médico Silva Maia de ‘vira-casaca’ e enumeraram as posições políticas exercidas por ele. Vejam: naquele tempo havia essa troca de partido, e ainda hoje se discute a reforma política. Eis a acusação: ‘Tendo sido bem-te-vi, conservador vermelho, conciliador, liberal, estrela, genuíno liberal e outra vez conservador exaltado’ os ‘garotos’ perguntaram, ‘qual o juízo que o senhor dr. Silva Maia nos autoriza a formar do seu caráter? Quem é o garoto?’

Para encerrar, os ‘garotos’ dão o bote, com esta pérola de humor jocoso:

‘Por que razão o senhor dr. Silva Maia não deixa crescer as barbas, como o senhor dr. Caetano?

É porque dizem que ele sem barba tem a cara de Napoleão, e barbado tem a cara de pacamão.’

Quanto ao lead como o conhecemos, copiado dos americanos no início da década de 50 do último século, o jornal A Moderação (1847), redigiu certa matéria de natureza política, na qual empregou com propriedade esse recurso, conhecido como numerado. O new journalism, quem o empregou foi João Lisboa (1812-1863) no jornal Publicador Maranhense (1842-1854), através de um texto que intitulou como ‘A procissão dos Ossos’ ou ‘A procissão dos Mortos’, que saía todo ano, dia de finados, do cemitério do Gavião.

Ao lado do inverossímil, da ficção, ele levantou dados juntos aos ‘campos santos’ e informou o número e o local dos mesmos. Constatou que os havia para ricos, pobres e remediados e tratou do estado de limpeza em que se encontravam. Uniu o imaginário ao real. Quanto ao Jornalismo de Denúncia, poucos no Brasil, na sua época, o fizeram melhor no país, como prosador respeitado pela cultura e uma refinada ironia. Só um exemplo: houve um derrame de moedas falsas, crime cometido por estrangeiros, em São Luís, quebrando o comércio. No jornal Eco do Norte (1836), Lisboa desmontou com o esquema e exigiu providências do governo. No Jornal de Timon (1858), não esqueceu as mazelas da política, com eleições a cacete e seus atores e a prática indecorosa de ganharem eleições.

‘Mais educativos e menos sensacionalistas’

A famosa questão religiosa discutida no jornal alcançou repercussão nacional e durou dez anos. Deu-se entre clericais e anti-clericais, ou seja, um grupo de jovens ligados à maçonaria e adeptos do positivismo, em O Pensador (1880), contra os padres, patrocinados pela alta cúpula da Igreja, no periódico A Civilização (1880). Dessas discussões participou o famoso professor sergipano Tobias Barreto, que a certa altura baixou o nível e invadiu a privacidade de um dos adversários. O livro trata em detalhes dessa briga, que enriqueceu, por um lado, o jornalismo pelas teses espojadas. A favor do grupo anti-clerical, entre muitos, estava Aluízio Azevedo, contra vários sacerdotes, inclusive o cônego Raimundo Fonseca, o temível ‘Fonsecão’, todos portadores de cultura e talento.

O autor trouxe à cena o nome da primeira jornalista maranhense, Eponina Serra Condurú (1842-1931), que ao exercer o jornalismo quebrou os padrões rígidos do seu tempo, penetrando num ambiente reservado aos homens. Portadora de uma admirável cultura, ocupou-se em escrever também poesias, peças educativas de teatro, fez conferências e tornou-se ativista, ajudando as famílias que mandaram filhos ou parentes à guerra do Paraguai. Nos textos que escreveu para os jornais locais, de Belém (Pará) e São Paulo (São Paulo), tratou de cultura e criticou os periódicos, sugerindo que fossem mais educativos e menos sensacionalistas e que, em vez de publicarem folhetins em estilo água com açúcar, os substituíssem por livros úteis aos jovens.

‘Um quadro amplo do passado’

Diz o autor do livro Sebastião Jorge: ‘Não sei o porquê dos historiadores maranhenses durante 187 anos da circulação do primeiro jornal, O Conciliador do Maranhão (1821), não terem falado no seu nome e quanto ao papel que representou para o jornalismo da terra.’

A primeira Lei de Imprensa, de origem portuguesa, implantada no Brasil em 1820, trazia o ranço do colonizador. Proibia as pessoas de falarem mal da vida alheia. Quem o fizesse pegava prisão de 1 a 5 anos de cadeia e assim desfilavam artigos e parágrafos absurdos e rigorosos. Essa lei chegou a envolver num processo um dos primeiros jornalistas de São Luís, o padre Antônio Ferreira Tezinho.

A respeito do livro A Imprensa do Século XIX (1821-1900), o professor Lima Filho, que pertenceu ao Departamento de História e Geociências da UFMA, acrescentou a certa altura: ‘A leitura da obra nos deleita pelo texto didático, simples e objetivo. Transporta-nos para um mundo de conhecimento da nossa história. Sebastião Jorge traça um quadro amplo do nosso passado, que sem dúvida interessará a todos os estudiosos da cultura maranhense.’ E finalizando: ‘A obra – repito, com entusiasmo, pela minha experiência no magistério – será inscrita nos anais da memória do jornalismo maranhense, como poucos o fizeram.’