‘Receita infalível para plantar uma enorme dúvida na cabeça dos críticos que tentam reduzir os rappers brasileiros à condição de iletrados deslumbrados com os originais americanos e equivocados ideológica e culturalmente: assistir ao quadro ‘Profissa’ no qual o programa Pé na Rua fez uma radiografia dessa profissão ainda desconhecida de muita gente. Ao assistir ao quadro, editado com a…
Receita infalível para plantar uma enorme dúvida na cabeça dos críticos que tentam reduzir os rappers brasileiros à condição de iletrados deslumbrados com os originais americanos e equivocados ideológica e culturalmente: assistir ao quadro ‘Profissa’ no qual o programa Pé na Rua fez uma radiografia dessa profissão ainda desconhecida de muita gente.
Ao assistir ao quadro, editado com a competência e a agilidade de sempre da equipe do Pé na Rua, o telespectador descobre que o personagem escolhido para explicar o ofício de rapper ao público do programa – jovens em sua maioria cheios de dúvidas sobre o que fazer na futura vida profissional – é Fabio Luiz, irmão mais novo do Rappin Hood, ex-apresentador do programa Manos e Minas.
Ao contrário do estereótipo que se tornou um estigma, Fabio é articulado e faz questão de respeitar todas as regras do bom português. Diz que é admirador de Dostoievski, Machado de Assis e Sartre e tem, como ídolos na área musical, Quincy Jones e Herbie Hancock.
Ao contrário do que muitos pensam, ele não restringe o universo de sua profissão à batalha dos discos e shows, enquadrando-se com a maior naturalidade na categoria dos rappers que também trabalham em publicidade. E cita participações suas em produções de Zélia Duncan, Ed Motta, Nação Zumbi, e em trilhas sonoras como a da série ‘Antonia’, exibida recentemente pela TV Globo.
Fabio insiste em dizer que a rotina – e os desafios de sobrevivência profissional – de um rapper podem ser idênticos aos de qualquer outro músico, acrescentando que financia seus discos fazendo trilhas sonoras e vendendo camisetas. Para ele, dizer que não existe espaço para rappers no Brasil é o mesmo que dizer que não existe espaço para novos escritores. Ruim, diz Fabio, ‘é ficar explicando o valor da música que você faz’. Para os telespectadores ainda em dúvida sobre a profissão, Fabio sugere que eles façam para si mesmos – e respondam com sinceridade – uma pergunta simples: ‘Essa é a minha verdade mesmo?’
Se o jovem telespectador assiste regularmente ao Pé na Rua, fica bem mais fácil responder.
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Conexões vitais, 23/7
O Metrópolis, ainda se refazendo da saída de Paulo Vinicius e Domingas Person, continua a ser, junto com o Jornal da Cultura, uma preciosa conexão ao vivo da TV Cultura com a atualidade múltipla, intensa e cosmopolita da cidade e do país, em uma grade predominantemente ocupada por atrações pré-gravadas e nem sempre sintonizadas com os acontecimentos que estão mexendo…
O Metrópolis, ainda se refazendo da saída de Paulo Vinicius e Domingas Person, continua a ser, junto com o Jornal da Cultura, uma preciosa conexão ao vivo da TV Cultura com a atualidade múltipla, intensa e cosmopolita da cidade e do país, em uma grade predominantemente ocupada por atrações pré-gravadas e nem sempre sintonizadas com os acontecimentos que estão mexendo com as pessoas. Da nova gripe ao festival Anima Mundi.
Os dois programas, apesar de seus eventuais percalços operacionais e das limitações típicas impostas pela correria da pauta diária, cumprem papéis ainda mais importantes do que os de, respectivamente, uma revista eletrônica diária de arte e entretenimento e de um telejornal: eles permitem que a TV Cultura respire o tempo presente e a atmosfera que, de uma forma ou de outra, também envolve o telespectador que sintoniza a emissora.
No caso do Metrópolis exibido na quarta-feira, 22 de julho, o cardápio audiovisual era especialmente saboroso e variado. Além de uma envolvente resenha com os destaques do Anima Mundi, apresentada ao vivo durante a abertura da versão paulistana do evento, o programa tinha uma reportagem sobre o lançamento do documentário ‘Soul Power’ – com trecho de um show antológico de James Brown – outra sobre a mostra de cinema brasileira no Museu de Arte Moderna de Nova York, com direito a mini-trailer do mais novo filme de Eduardo Coutinho, e uma bem-sucedida incursão da câmera na exposição do artista plástico Gary Hill no CCBB, com boas entrevistas e uma inspirada apresentação dos trabalhos pelo curador Marcelo Dantas..
No Jornal da Cultura da mesma noite, estavam lá a correria assustada dos brasileiros aos hospitais por causa da nova gripe, a inesgotável maratona de irregularidades e coroneladas patrocinadas por José Sarney, a assustadora previsão sobre o número de adolescentes brasileiros que morrerão assassinados até 2012, a chegada de Vanderlei Luxemburgo ao Santos e o desmonte milionário do Corinthians de Mano Menezes, entre outros acontecimentos do dia.
Esse tipo de pulsação é insubstituível. Principalmente se pensarmos que, antes do Jornal da Cultura, dentro do projeto TV Cultura 40 anos, foi exibido um Roda Viva gravado em 1987 com Dercy Gonçalves – hilariante, antológico mas em horário inadequado para uma reprise sem tratamento atual. E que, depois do Metrópolis, em mais um momento de certo autismo temático, o programa Tal e Qual mostrou um documentário – que em boa parte mais parecia uma sessão de slides musicada – sobre a arquitetura das cidades e templos construídos pelos maias.
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Pânico, serviço e flagrantes, 22/7
Não deve estar sendo fácil a vida dos editores nesses dias de corrida aos hospitais por conta da nova gripe. O noticiário sobre a pandemia e a reação às vezes irracional a ele – ou a ela – se confundem cada vez mais, num ambiente em que, mesmo não desejando, todos os veículos de comunicação, influenciados pelos jornais e emissoras…
Não deve estar sendo fácil a vida dos editores nesses dias de corrida aos hospitais por conta da nova gripe. O noticiário sobre a pandemia e a reação às vezes irracional a ele – ou a ela – se confundem cada vez mais, num ambiente em que, mesmo não desejando, todos os veículos de comunicação, influenciados pelos jornais e emissoras de grande repercussão, acabam empurrando o assunto para a primeira página ou para a abertura dos telejornais.
Para quem ainda tem dúvidas sobre o tamanho da responsabilidade dos meios impressos e eletrônicos de comunicação – e do cuidado que os jornalistas têm de ter na escolha das palavras ou no manuseio de estatísticas e entrevistas – o momento é absolutamente didático.
O Jornal da Cultura desta terça, dia 21 de julho, seguiu a tendência geral – discutível, é verdade – de abrir o noticiário com a nova gripe, mas revelou, também, a saudável preocupação de destacar as ponderações de um infectologista sobre a baixa letalidade da doença e a necessidade de prestarmos muita atenção aos sintomas que indicam o seu agravamento, antes de corrermos para o hospital.
Melhor ainda: o JC produziu uma matéria na qual o repórter Ricardo Ferraz mostrava a diferença entre o que se poderia chamar de higiene do pânico e a higiene consciente e preventiva em relação a todas as doenças bacterianas e virais que nos ameaçam no cotidiano. Tanto para a nova gripe quanto para as outras doenças que matam muito mais que ela, a matéria mostra que o grande segredo para aumentar nossas chances contra elas continua sendo o velho e bom costume de lavar as mãos.
Macacos
O flagrante do assalto dos macacos de um zoológico da Inglaterra ao porta-malas e ao bagageiro do carro de uma família visitante tinha um impacto inegável, pela inusitada semelhança do gesto dos babuínos com o que fazem muitas gangues de humanos ao redor do mundo. Por isso mesmo, a imagem era merecedora de espaço em qualquer telejornal do planeta.
Mas será que era necessário ou adequado incluir esse instante curioso nas manchetes de abertura do jornal, junto com a nova gripe e a pesquisa que apontou o assassinato de 33 mil jovens brasileiros até 2012, entre outros assuntos mais graves e importantes? Levando-se em conta uma parcela considerável do público tradicional do Jornal da Cultura e sua notória dificuldade de assimilar o formato atualmente eclético e dinâmico do telejornal, não. Jogos de cintura à parte, histórias leves e curiosas caem melhor quando não aparecem muito na receita de um telejornal.’