Em sua autobiografia The Good Times, o jornalista e escritor Russell Baker descreve a redação do New York Times – à qual ele se juntou em 1954 – como ‘comicamente cheia’. Baker, vencedor do Pulitzer e colunista, gostava de lembrar o tempo em que os repórteres jogavam cartas e liam Dostoievsky enquanto esperavam para cumprir a pauta. Hoje, o cenário é outro. A redação funciona 24 horas por dia produzindo o jornal e atualizando o site. Com a recessão e a revolução que transforma o modo de produção de notícias, foi necessário cortar custos e parte da equipe.
Embora o NYTimes tenha a maior redação de todos os jornais americanos – são 1.250 repórteres, fotógrafos, editores, colunistas, artistas gráficos e produtores de web, dentre outros –, cerca de 100 cargos serão eliminados antes do Natal. Editores alegam estar determinados a minimizar o impacto dos cortes no conteúdo do diário, mas alguns leitores já se mostram preocupados. ‘Por favor, não demitam mais pessoas’, escreveu a leitora Deborah Holdstein.
Trata-se de uma estratégia – penosa, sim – de manter os investimentos no jornalismo. E o NYTimes não é o único a seguir tal caminho. O Baltimore Sun reduziu sua equipe de 400 para 150 jornalistas; o Los Angeles Times cortou a metade de seus 1.100 funcionários. Na semana passada, o Wall Street Journal anunciou o fechamento da sucursal de Boston e Michael Calderone publicou no site Politico que a Associated Press deve demitir para reduzir seus gastos em 10% até o final do ano. Rick Edmonds, acadêmico do Poynter Institute, centro de treinamento em jornalismo na Flórida, estimou no mês passado que jornais reduziram as despesas em US$ 1,6 bilhão ao ano nos últimos anos.
Novos cortes
O anúncio das novas demissões no NYTimes foi inesperado. O editor-executivo do jornal, Bill Keller, revelou que esperava que a eliminação de 100 cargos no começo de 2008 e a redução de 5% na folha de pagamento este ano fossem evitar mais cortes, pelo menos até 2010. Mas, sob o contrato com o sindicato Newspaper Guild, funcionários que deixassem a empresa depois do dia 1º de janeiro teriam direito ao pagamento completo de férias. Com os lucros publicitários caindo, isto significaria mais 10 cargos eliminados.
Keller disse estar determinado a evitar o fechamento de sucursais nacionais e no exterior e não espera que haja muitas demissões em Washington. ‘A cidade é o centro do universo no momento’, analisa. Além do conteúdo do jornal, os 70 blogs do site NYTimes.com devem ser revisados para que se determine se a existência de todos é justificável. Atitudes mais radicais, como eliminar a seção de esportes, foram descartadas.
O jornal já tomou as decisões ‘mais fáceis’: reduzir a equipe, diminuir o trabalho de freelancers e reembolsos com alimentação, buscar promoções de bilhetes de avião e hospedagens, fazer a rotação de correspondentes a cada cinco anos em vez de quatro e fazer com que alguns correspondentes internacionais trabalhem de casa, em vez de montar escritórios.
Foco
William Schmidt, subeditor encarregado do orçamento da redação, afirma que os editores estão focados em preservar a cobertura essencial, ou seja, a das seções nacional, internacional, economia, cultura e artes. Nos últimos 10 anos, o jornal contratou sete correspondentes nacionais e 10 internacionais, além de ter expandido a sucursal de Washington e o departamento de notícias econômicas. O diário gasta mais de US$ 4 milhões ao ano para alimentar, proteger e hospedar seus jornalistas em zonas de guerra.
A seção metropolitana é a que tem mais jornalistas – são 60 ao todo –, mas ainda assim foi reduzida em 20% na última década. As novas tecnologias, que lideraram a migração de leitores e anunciantes para o impresso, remodelaram drasticamente a redação. Por exemplo, não há mais um laboratório fotográfico com dezenas de técnicos para revelar filmes, mas há dezenas de cinegrafistas para o site.
Com este panorama, a solução mais eficiente seria cobrar aos leitores pelo conteúdo online. Mas, segundo Keller, esta decisão é muito mais complicada do que parece. ‘Não há um consenso sobre o caminho certo a seguir’, diz. Para o publisher Arthur Sulzberger Jr., os cortes na redação e a cobrança online são assuntos distintos. ‘Os cortes referem-se a realidades imediatas e de curto prazo da nossa situação econômica. Já cobrar por conteúdo online é uma questão de estratégia que teria pouco ou nenhum impacto nos resultados financeiros a curto prazo; apenas nos posicionaria de maneira diferente no crescimento a longo prazo’, explica.