Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um tiro no pé da imprensa

Na semana em que um ministro do Superior Tribunal de Justiça suspende as ações judiciais derivadas da Operação Satiagraha contra o banqueiro Daniel Dantas, e em que a Folha de S.Paulo foi condenada a pagar uma indenização milionária ao juiz Ali Mazloum, da Justiça Federal de São Paulo, fica claro que o esforço da imprensa para se beneficiar de parcerias heterodoxas no Judiciário começa a dar seus frutos. Mas podem ser frutos amargos para a imprensa, para a Justiça e para a sociedade.


O ministro Arnaldo Esteves Lima, do STJ, que suspendeu os atos judiciais contra o banqueiro, se declara surpreso com a repercussão de sua decisão. Afinal, observa em entrevista, trata-se de medida rotineira, sem conteúdo decisório, que vai valer apenas durante o período de recesso dos tribunais.


Há controvérsias: segundo a Folha, que ouviu magistrados e autoridades que atuaram na investigação, 62 cotistas do fundo Opportunity foram beneficiados com a suspensão das ações, que também abre uma brecha para Daniel Dantas e seus associados pedirem a liberação de contas bancárias e de usufruto de bens que estavam bloqueados por decisão do juiz Fausto Martin De Sanctis.


Frutos indigestos


Em artigo publicado na edição de quarta-feira (23/12), o jornalista Frederico Vasconcelos, autor das reportagens que envolveram o nome do juiz Ali Mazloum e condenado junto com a Folha ao pagamento de R$ 1,2 milhão como indenização por danos morais, levanta dúvidas sobre a clarividência do autor da sentença.


Segundo Vasconcelos, na ocasião das reportagens, produzidas a partir de 2003, Mazloum teve muitas oportunidades para oferecer sua versão dos fatos, e, antes de pedir a indenização milionária, nunca usou o direito de resposta ou retificação das acusações que lhe eram feitas.


Recorde-se, a propósito, que o direito de resposta desapareceu com a Lei de Imprensa, sob aplausos da imprensa.


O jornal está recorrendo da condenação e, a menos que tudo esteja virado de pernas para o ar, a decisão deverá ser revista. No entanto, sobram sinais de que a relação entre a imprensa e a Justiça, envenenada pela estratégia das grandes empresas de jornalismo de influenciar decisões judiciais na base da oferta de vitrines para egos superiores, seguirá produzindo seus frutos indigestos.


Mais uma vez, parece que a imprensa deu um tiro no próprio pé.