Bombas e mísseis voam entre israelenses e palestinos na Faixa de Gaza e, uma vez mais, o New York Times é apanhado num conhecido fogo cruzado, acusado por todos os lados de fazer uma cobertura desleal e imprecisa.
‘Descrever as matérias do Times como imprecisas e favoráveis a Israel é um eufemismo’, diz o leitor Hugh Samson. Já a leitora Dorit Sauer Raskin vê a cobertura de maneira totalmente diferente. ‘Por que vocês não publicam artigos sobre o sofrimento das pessoas em Israel?’, pergunta. ‘Onde estão os artigos pró-Israel?’
Para Jill Abramson, editora responsável pelo noticiário do jornal, há ‘um voto de confiança na cobertura do Times, considerando que todas as facções envolvidas neste choque de povos e injustiças acreditam com firmeza que estamos apoiando um dos lados – o do outro’.
Para o ombudsman Clark Hoyt, essa é uma posição arriscada, pois a fúria dos leitores pode ser justificável. ‘No caso deste complicado e complexo conflito entre israelenses e palestinos’, diz ele, ‘mesmo a melhor e mais imparcial informação não satisfará a defesa apaixonada de um lado ou de outro.’
David K. Shipler, ex-correspondente do Times que ganhou um prêmio Pulitzer com seu livro Arab and Jew: Wounded Spirits in a Promised Land (Árabes e Judeus: espíritos feridos em uma terra prometida, tradução livre), disse numa entrevista que cada lado acredita ser a verdadeira vítima. No entanto, ‘ambos os lados são vítimas e culpados ao mesmo tempo’.
Fotos adulteradas
Mas não é essa a opinião dos leitores. Os que apóiam Israel querem uma cobertura que enfatize o terror causado pelos mísseis lançados pelo Hamas contra o território israelense; os que apóiam os palestinos querem que a cobertura destaque o sofrimento causado pelas bombas e mísseis de Israel, assim como as questões das sanções econômicas e do fechamento das fronteiras.
A intensidade das críticas não surpreende. ‘Não se trata apenas de uma guerra’, diz Nicholas Lemann, decano da Faculdade de Jornalismo da Universidade de Columbia. ‘É uma guerra da mídia. A opinião pública de fora da região é muito importante e é construída pela cobertura da imprensa.’
Devido ao alcance e influência internacional que tem, o Times torna-se muito visado. No início do conflito, o chefe da sucursal de Jerusalém, Ethan Bronner, escreveu uma profunda e incisiva matéria de primeira página que, entretanto, continha um equívoco: quando ele disse que Israel necessitaria de ‘outro tratado de paz’ com o Hamas – posteriormente, ele informou que quisera dizer ‘cessar-fogo’ –, o leitor Roger Gerber disse que a informação era tendenciosa e descuidada, pois o Hamas não reconhece a existência de Israel e jamais assinaria um tratado de paz.
Já o leitor Bert Distelburger desconfiou que uma foto de uma menina palestina sendo carregada numa maca, publicada na primeira página da edição de 5/1, era adulterada, pois ‘um médico não examina uma pessoa de cabeça para baixo’. ‘A foto é autêntica’, rebate o editor de fotografia Patrick Witty, que mostrou ao ombudsman como a ampliara no computador. Também mostrou várias outras fotos adulteradas que afirmou que jamais publicaria no jornal.
Witty e seus colegas estão frustrados porque Israel vetou a presença de jornalistas em Gaza. ‘Como não posso contar com a presença de meu próprio pessoal no local’, diz ele, ‘tenho que questionar cada foto que me chega – a ponto de ser obsessivo’.
A difícil precisão dos números
O leitor Stephen Weil disse que os bombardeios de Israel teriam matado um número de palestinos muito superior ao número de israelenses atingidos por foguetes do Hamas. No entanto, na página do Times na web, ‘para cada vítima palestina, é mostrado um israelense’, o que estaria sugerindo que o sofrimento é igual para ambos os lados e, portanto, seria ‘uma mentira’.
O assistente de Hoyt, Michael McElroy, fez um levantamento da cobertura da semana passada: havia 28 fotos de palestinos mortos e cinco de israelenses. Essa média é considerada ofensiva pelos apoiadores de Israel, que sustentam que o Hamas utiliza civis como escudos humanos e as fotos enfurecem as pessoas contra Israel.
Alguns leitores questionam a precisão do número de vítimas. ‘Os números nunca são corretos’, alegam. O Times publicou uma correção na segunda-feira (5/1), informando que nos primeiros três dias do conflito deveria ter dito ‘mais de 60 civis’ mortos, ao invés de ‘cerca de 60’. Quando foi bombardeada uma escola das Nações Unidas na terça-feira (6/1), a repórter Taghreed El-Khodary foi ao hospital para onde haviam sido levadas as vítimas. Um funcionário a informou que havia 40 mortos, entre os quais 10 crianças e cinco mulheres. Autoridades das Nações Unidas, que não estavam no local, disseram que o número de mortos fora de 30. O Times destacou o número de vítimas fornecido pelo hospital.
Na opinião do ombudsman do Times, e embora os apoiadores de israelenses e palestinos não concordem, o jornal, ainda que prejudicado por não poder estar presente ao campo da batalha e depender do caos de informação de uma guerra, tentou fazer um trabalho imparcial, equilibrado e completo – e, em grande parte, foi bem-sucedido.