Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Estado de S. Paulo

SATIAGRAHA
Fausto Macedo

Arquivos indicam que ministros e parlamentares caíram em grampos

‘Peritos da Polícia Federal identificaram em dois pen drives de uso pessoal do delegado Protógenes Queiroz arquivos ilustrados com 27 fotografias de ‘autoridades do governo federal, deputados e alvos da Operação Satiagraha’.

Os registros secretos do delegado indicam ainda que essas autoridades podem ter caído no grampo telefônico – provavelmente de forma involuntária porque mantiveram contatos com investigados.

A informação consta do Relatório de Análise de Mídias, página 19, que a PF preparou exclusivamente com base no conteúdo dos pen drives de Protógenes, apreendidos em novembro por ordem judicial.

O delegado armazenou as informações sobre parlamentares e integrantes da administração federal em pastas intituladas pela senha ‘Brasil’, inseridas no capítulo ‘dados para a vigilância’.

Também há menção a ‘áudios interceptados’ de suspeitos em contato com autoridades e jornalistas e advogados.

Na página 5 do relatório os peritos reproduziram uma tela capturada em um pen drive de 2 gigabytes de Protógenes com cinco arquivos que indicam que o grampo pode ter pego o ministro Geddel Vieira Lima, da Integração Nacional, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI), o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, ex-deputado e fundador do PT, e o advogado Nélio Machado, que dirige o núcleo de defesa do chefe do Opportunity.

Os arquivos são assim denominados: ‘Áudio Satiagraha Guilherme x D. Dantas’, ‘Áudio Satiagraha x Luiz Eduardo’, ‘Áudio Satiagraha Guilherme x Min. Geddel’, ‘Áudio Satiagraha Guilherme x Sen. Heráclito Fortes’ e ‘Áudio Satiagraha Nélio Machado’.

Nem todos os cadastros foram desbloqueados – as anotações estão criptografadas. Um cadastro que os peritos conseguiram abrir, hospedado no item ‘áudio/diversos Satiagraha’, aponta o nome Guilherme em comunicações sucessivas com Daniel Dantas, alvo maior da operação desencadeada em julho e que levou o banqueiro do Opportunity por duas vezes à prisão – da qual Dantas se livrou por decisão do ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).

A PF diz que se trata de Guilherme Sodré Martins, suposto lobista do grupo de Dantas.

TRANSCRIÇÃO

A PF está fazendo a transcrição dos diálogos. Após concluir essa etapa da investigação, vai encaminhar os dados às autoridades citadas para as medidas que considerarem cabíveis.

Em julho, Heráclito já havia recorrido ao STF, pedindo acesso ao inquérito Satiagraha para saber se era efetivamente objeto da investigação. Mas nos autos da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, onde tramita o processo contra Dantas, não há citação oficial ao senador – nem poderia haver, porque Heráclito tem foro privilegiado perante a corte suprema.

Na página 4 do relatório, os peritos federais colaram outra planilha confidencial de Protógenes, na qual aparece o arquivo intitulado ‘Acordo guarda-chuva Mangabeira’ – para a PF, pode tratar-se do ministro Roberto Mangabeira Unger, de Assuntos Estratégicos. Professor de Direito em Harvard, Mangabeira prestou consultoria jurídica durante quatro anos para a Brasil Telecom nos EUA, na gestão Dantas, antes de assumir cargo no governo Lula.

A PF está convencida de que fotos, filmagens e grampos foram feitos por arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) recrutados por Protógenes. A investigação mostra que pelo menos 84 agentes e oficiais da Abin trabalharam para o delegado da Satiagraha. Ele nega ter mobilizado esse efetivo.

À página 17, que traz imagem de Greenhalgh no Aeroporto Santos Dumont, no Rio, o relatório esclarece: ‘Ganhou destaque ainda um arquivo de vídeo com gravação ambiental na qual se vê a presença, em um aeroporto, de pessoa que foi identificada como Luiz Eduardo Greenhalgh, cujo cinegrafista, ao que se presume, foi o agente da Abin José Maurício Michelone, tendo em vista que ele mesmo, no áudio, em situação paralela, declina seu nome’.

Greenhalgh admitiu, quando a Satiagraha foi deflagrada, que prestava serviços como advogado ao Opportunity. O que a PF ainda não verificou é se o monitoramento do petista ocorreu quando ele ainda era deputado.

Protógenes não foi localizado ontem.’

 

INTERNET
Gustavo Uribe

Mercado de música digital cresce 25%

‘O número de músicas compradas via internet apresentou em 2008 um crescimento de 25% ante 2007, indicou hoje o relatório anual de Música Digital divulgado pela Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI). Só no ano passado, foram feitos downloads de 1,4 bilhão de singles (músicas separadas do álbum), representando um aumento de 350 milhões de hits baixados. Em consequência, o mercado digital de singles subiu de US$ 2,9 bilhões em 2007 para US$ 3,7 bilhões. Em contrapartida, o número de downloads ilegais, que não remuneram cantores ou gravadoras, ainda representa 95% dos singles baixados – não foi divulgado o porcentual de 2007.

Entre as músicas mais baixadas no ano passado, a primeira do ranking foi Lollipop, da cantora Lil Wayne, com 9,1 milhões de cópias compradas, 1,8 milhão a mais do que a mais baixada em 2007, Girlfriend, da cantora Avril Lavigne.

Só em 2008, foram feitos downloads informais de 26,6 bilhões de singles, representando um prejuízo de US$ 53,2 bilhões às indústrias fonográficas. Por conta da pirataria digital, o relatório ainda aponta que a receita do mercado musical apresentou queda de 8% em comparação a 2007, um decréscimo de US$ 1,5 bilhão (de US$ 19,5 bilhões para US$ 18 bilhões).

Para o presidente da IFPI, John Kennedy, a pirataria é um problema a ser enfrentado e demandará ações ‘firmes’ dos governos. ‘Os países estão começando a aceitar que, no debate a respeito de ?conteúdo livre?, não agir não é a opção se quisermos um futuro para o conteúdo digital comercial.’

BRASIL

O relatório aponta que o Brasil é o País que mais faz downloads de músicas na América Latina, apresentando em 2008 um crescimento de cerca de 10%. Segundo o IFPI, por ser uma das populações que passam mais tempo na web (23 horas e 10 minutos por mês), os brasileiros são consumidores em potencial do mercado musical digital. A Federação prevê que o crescimento do País na área deverá ter altas graduais nos próximos anos.’

 

TELEVISÃO
Gustavo Miller

Mais um blogueiro

‘Após escalar no ano passado uma blogueira de cabelo pink para o seu time de VJs (MariMoon), a MTV aposta neste ano em mais uma pessoa do mundo dos blogs: Didi Ferreira, do Te Dou um Dado?.

O blogueiro será repórter do novo telejornal da emissora, que entra no ar em março, após a programação especial de verão. Furo MTV será apresentado pelo ator Bento Ribeiro e pela comediante de stand-up Dani Calabresa. O programa será diário, exibido à noite e terá 15 minutos de duração. ‘Será uma atração de variedades, com notícias bizarras. Não uma cópia do CQC, como andam falando por aí’, dispara Didi. ‘Não somos carecas’, brinca.

Em suas palavras, Didi será ‘um Amaury Jr. gay e assumido’. ‘Vou fazer matérias em festas. Não precisarei mais pedir entrada pra balada, será tudo open bar’, ri. O blogueiro já tem uma atração no site da emissora, o Gay Show. Dani Calabresa, uma das âncoras do Furo MTV, participava do programa Quinta Categoria, de Marcos Mion e Cazé.

A novidade será o ex-Globo Bento Ribeiro, que ainda hoje pode ser visto no capítulo final de A Favorita, como o personagem Juca.’

 

CINEMA
Luiz Carlos Merten

A questão da ética da imagem

‘Jaume, não Jayme, Balagueró é um diretor espanhol na faixa dos 40 anos – nasceu na Catalunha, em 1968 -, que se tornou cultuado em seu país pelas investidas que faz no cinema de terror. Há dois anos, ele fez sensação com REC. Os direitos foram comprados por Hollywood e a versão norte-americana, que se chama Quarentena, que estreou ontem. Se você gostou de A Bruxa de Blair, de Cloverfield, e Redacted, de Brian De Palma -, poderá gostar do filme dos irmãos Dowdle (quem assina a direção é John Erick). Mas é bom ir preparado(a) para emoções muito fortes. A barra é pesadíssima.

Quarentena inscreve-se nesta tendência atual que consiste em discutir a própria imagem. Como nada se cria, tudo se copia, Daniel Myrick e Eduardo Sánchez fizeram sensação, em 1999, ao vender, primeiro na internet, a história de A Bruxa de Blair, sobre um grupo de cineastas que vai fazer um filme numa floresta, todo mundo morre barbaramente e fica o registro do material filmado para contar, postumamente, a história. Pouca gente sabia, mas os espertos Myrick e Sánchez estavam seguindo a vertente do italiano Ruggero Deodato, que fez, em 1980, o cult Cannibal Holocaust, sobre quatro documentaristas que se perdem na selva da América do Sul e, mais tarde, é encontrado o material que revela seu trágico destino numa tribo de canibais.

O filme dos irmãos Dowdle começa com uma repórter de TV (Jennifer Carpenter) fazendo uma reportagem especial, sobre como é o dia a dia de uma equipe de bombeiros. Tudo muito simpático, divertido, a garota é sexy – embora a atriz fique cada vez mais over (e histérica) -, surgem as piadas de praxe sobre mangueiras, etc. De madrugada, o grupo precisa atender à primeira ocorrência. Saem todos em louca disparada pelas ruas. Chegam a esse prédio e começa o pesadelo. Eles têm de atender a uma mulher que vive solitária, uma velha que se revela catatônica, como uma morta-viva. Inesperadamente, ela salta sobre um dos policiais que atenderam primeiro à ocorrência e lhe arranca um pedaço do pescoço. O resto é o horror mais absoluto.

Pior do que um caso de mortos-vivos, pior do que a raiva canina, embora os sintomas se lhe assemelhem, a infecção se alastra e as pessoas começam a se infectar e destruir com intensidade cada vez mais furiosa. A repórter de TV e seu cinegrafista tudo documentam, até mesmo brigando – com o policial sobrevivente – pelo direito de gravar imagens e mostrar ao público o que ocorre. O prédio é selado, o grupo, cada vez mais reduzido, fica de quarentena. No início, são quantas? Umas oito pessoas. Uma a uma vai caindo até que na tela permanece somente a derradeira – mas tem o twist final, como sabem os espectadores do filme espanhol. O original era melhor? Tinha uma protagonista mais simpática, pelo menos. E, depois, o diretor Dowdle praticamente copia plano a plano o primeiro filme. Você sabe o que significa essa operação de clonagem. Deve lembrar-se do Psicose de Gus Vant Sant, mas se há um abismo entre o remake e o cult de Alfred Hitchcock, o abismo é quase tão grande entre REC e Psycho.

Assustadora como é, e sem limites de bom gosto no que se refere a registrar imagens gráficas de violência, Quarentena é uma experiência profundamente desagradável para espectadores que vivenciarem a epifania de O Curioso Caso de Benjamin Button, de David Fincher, ou que se encantarem pelo novo Alain Resnais, Beijo na Boca, Não!, que também estrearam ontem. Mas o filme de John Erick Dowdle deve atrair o público jovem como radicalização de uma violência tipo à de Saw, que se multiplicou, virou série e chegou ao quinto título. A questão que esses filmes colocam, principalmente Quarentena, A Bruxa de Blair e Redacted, é a da ética da imagem. Parece absurdo relacionar um filme como o de Brian De Palma, sobre a Guerra do Iraque, com outro como este, mas é assim que o público os recebe nos cinemas (e vai vê-los). Neste sentido, você pode até odiar Quarentena como um anticinema humanista. O difícil é ignorá-lo, pois se trata de uma vertente forte do cinema atual.

Serviço

Quarentena (Quarantine, EUA/2008, 89 min.) – Ter-ror. Direção de John Erick Dowdle. Cotação: Ruim’

 

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