Saturday, 30 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Massacre põe ícones da direita em xeque

Poucas vezes as vozes da direita americana foram tão massacradas na imprensa quanto na última semana, quando os EUA tentavam entender por que um jovem de 22 anos matou seis e feriu 14, incluindo uma deputada democrata, em um ataque a tiros em Tucson (Arizona). Mas a reação extremada de formadores de opinião de esquerda e do centro, que acusaram a direita nos mais altos tons de ter criado o clima de discórdia que encorajou o ataque, é também um testemunho da força e influência que os conservadores detêm nos EUA de hoje.

Críticas vieram de vários lados. Uma frase muito repetida foi a de um xerife do Arizona, Clarence Dupnik, que disse que o estado havia se tornado ‘a meca do preconceito e racismo’ e que apresentadores de TV e rádio deviam repensar suas atitudes. Ele não se referia só a jornalistas regionais, mas também a personalidades midiáticas icônicas da direita como Rush Limbaugh e Glenn Beck, cujas mensagens iradas contra democratas e esquerdistas são reverenciadas por legiões de fãs.

Entre os políticos, uma das vítimas preferidas dos protestos foi a ex-governadora do Alasca Sarah Palin, queridinha dos ultraconservadores do Tea Party. Ela mantinha na internet um mapa com sinais de tiro ao alvo nos distritos em que congressistas votaram a favor da reforma da saúde da Casa Branca – inclusive o da deputada Gabrielle Giffords, que levou um tiro na cabeça no ataque em Tucson.

A crescente mídia conservadora

Também entraram na lista de provocadores os políticos favoráveis ao porte de armas, como a deputada Michele Bachmann, que já afirmou que os americanos devem ser ‘armados e perigosos’. ‘Alguns na esquerda realmente passaram do limite com as acusações’, disse à Folha Brian Darling, analista da conservadora Fundação Heritage, em Washington. ‘Vimos a pior face da política. A retórica só piorou depois da tragédia.’

A troca de acusações entre a esquerda e a direita está longe de ser nova. Mas se a história americana é recheada de momentos de palavras pesadas, a eleição do presidente Barack Obama em 2008 deu vazão a discursos de extremismo particular. Além disso, a expansão das redes sociais e de outras formas modernas de comunicação aumenta exponencialmente o alcance da retórica explosiva, ampliando sua base de influência. Paul Krugman, comentarista do New York Times, afirmou que ‘já esperava’ que algo como o ataque em Tucson acontecesse por causa do clima político atual: ‘Tenho uma sensação ruim desde o fim das campanhas [à presidência] de 2008.’ E ele responsabiliza as vozes da direita que foram demonizadas nos últimos dias. Quer ouvir piadas sobre tiros a funcionários do governo ou decapitações de jornalistas do Washington Post? ‘Ouça Glenn Beck ou Bill O´Reilly’, diz Krugman.

A interpretação generalizada é de que a parcela do país que se sente ameaçada por Obama foi adotada com facilidade pela crescente mídia conservadora. Mais de 37% dos americanos adultos se dizem republicanos. Os democratas são 33,7% (dados do Instituto Rasmussen neste mês). Entre republicanos e radicais há vasta distância. Mas não é à toa que a conservadora Fox News se tornou líder na TV a cabo. Ou que o jornal mais lido seja o direitista Wall Street Journal.

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Correspondente da Folha de S.Paulo em Washington