O otimismo excessivo dos investidores em torno de empresas de internet aponta para os riscos de o mundo viver uma nova bolha pontocom. Segundo especialistas ouvidos pela Folha, a valorização que empresas como Facebook, LinkedIn e Groupon ganharam nos últimos meses é um dos principais indicadores do fenômeno. ‘Estamos na iminência de IPOs [oferta inicial de ações, na sigla em inglês] promissores, mas ao mesmo tempo perigosos. Algumas empresas têm seu valor de mercado calculado com base em métricas remanescentes da época da bolha pontocom’, diz Greg Sushinsky, investidor do Vale do Silício há 20 anos.
O Facebook é o exemplo mais gritante de valorização exacerbada semelhante à que aconteceu no fim dos anos 1990 e início de 2000. Em pouco tempo, a rede social popularizada nos corredores da universidade americana Harvard em 2004 foi alçada à condição de uma das empresas mais valiosas da internet. O valor de mercado, estimado em US$ 50 bilhões, ultrapassou, por exemplo, o do maior site de leilões virtuais do mundo, o eBay, e o do portal Yahoo! somados.
A proporção sobre o que se especula ser o resultado anual da empresa – faturamento de US$ 1,5 bilhão e lucro de US$ 500 milhões – é de cem vezes. ‘Ao contrário do Google, ainda não está claro o modelo de negócios para o Facebook sair do estágio inicial. Não sabemos como ele conseguirá ampliar as receitas para justificar sua valorização, que no caso de um IPO pode subir mais’, afirma Sushinsky.
O Google abriu o capital em 2004 e, antes mesmo de o IPO acontecer, já dava sinais concretos para os investidores de quais os negócios que poderiam sustentar sua receita nos anos seguintes. O Facebook ainda não tem esse nível de informação divulgada e, apesar disso, especula-se que a abertura de capital aconteça em 2012.
A ‘bolha Second Life’
A rede social corporativa LinkedIn e o site de compras coletivas Groupon são outros dois exemplos de valorização expressiva nos últimos anos. O LinkedIn tem valor de mercado estimado em US$ 2 bilhões, e o Groupon registra crescimento meteórico. Foi criado em novembro de 2008 e já chega a US$ 7,8 bilhões.
Apesar da preocupação com uma nova bolha, as empresas estão mais preparadas do que as de 2000. ‘As companhias que buscam IPO hoje estão num estágio muito mais inovador. Elas têm plataformas, e não apenas websites sem nenhum modelo de negócios’, diz Paul Bard, analista da Renaissance Capital, especialista em abertura de capital.
Resta saber, segundo os analistas, se alguma dessas promessas iminentes de IPO vai se converter no falido Second Life. A rede que prometia uma segunda vida, criada há oito anos, chegou ao ápice entre 2005 e 2006, com quase 5 milhões de usuários e centenas de empresas criando ilhas virtuais para fazer negócios. Sem conseguir provar sua verdadeira relevância, a ‘bolha Second Life’ murchou aos poucos e o que prometia acumular bilhões de dólares em valorização não passou de pó.
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Lição sobre valorização
O estouro da bolha da internet, há quase 11 anos, mostrou o que pode acontecer quando existe supervalorização de empresas. A especulação sobre o potencial das companhias levou a Bolsa de Valores Nasdaq ao seu pico. Em março de 2000, o índice chegou ao recorde de 5.132 pontos, patamar nunca antes visto e nunca depois retomado. O índice era mais que o dobro do registrado no ano anterior. A bolha foi formada ao longo de cinco anos. Empresas de internet que não tinham sequer modelo de negócios já estruturado ganharam relevância, que passou dos patamares saudáveis, entre investidores.
Empresas que abriram o capital posteriormente, como o Google e a Salesforce – de sistemas de relacionamento corporativo –, foram as primeiras que cresceram durante a bolha com retorno efetivamente comprado em valores. Ambas foram a público em 2004. A lição que ficou aos analistas e investidores foi sobre como analisar o potencial das empresas que operam no mundo virtual, incluindo redes sociais.
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Partir para encontros reais
Fundos de investimento que miram empresas de tecnologia no Brasil têm apetite menor para riscos do que no Vale do Silício. Isso porque o ambiente de empreendedorismo e inovação está em desenvolvimento e os fundos buscam experiências que já deram certo. Essa foi a conclusão de debate que reuniu ontem empresários e especialistas em empreendedorismo na Campus Party.
‘O Brasil tenta seguir o modelo do Vale do Silício, mas a quantidade de fatores que permitem essa riqueza ainda é tímido’, disse Daniel Heise, presidente da Direct Talk, especializada em tecnologias para o atendimento ao consumidor. Segundo Heise, é comum os fundos olharem para faculdades como Berkeley e Stanford como formadoras de engenheiros com mentalidade empreendedora. ‘No Brasil, são poucas as que conseguem ter esse viés.’
Para Marco Perlman, fundador da Digipix, empresa de soluções para utilização de imagens digitais, há uma ‘sensação de manada’ entre investidores internacionais de que o Brasil é a próxima onda de inovação. No entanto, ainda existem poucos investidores-anjo, dispostos a colocar recursos em empresas iniciantes. ‘Muitos vem para cá tentando entender o que é o fenômeno da web por aqui. Entram aos poucos para sentir a temperatura dos negócios.’
Para convencer os investidores sobre o potencial dos negócios, a recomendação é partir para encontros reais, já que muitos fundos só operam por indicação.