Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Como cobrar por conteúdo virtual?

Ao longo de mais de uma década, os consumidores se acostumaram ao fluxo constante de notícias, fotos, vídeos e música na internet gratuitamente. Pagar era coisa para otários e conservadores.

Agora, contudo, há indícios cada vez maiores de que a gratuidade está chegando ao fim.

Os jornais, incluindo o New York Times, pensam na possibilidade de pedir aos leitores online para pagar por, pelo menos, uma parte do conteúdo, como alguns jornais como o Wall Street Journal e o Financial Times, já fazem. Na verdade, nas próximas semanas, executivos e analistas do setor esperam que algumas publicações peguem carona na iniciativa.

Rupert Murdoch, além de cobrar por acesso ao Journal, falou em formar uma parceria com um site de buscas, que pagaria a ele os direitos de exibir as notícias e a programação de entretenimento produzida pela empresa dele, News Corp., em vez de permitir que todas as ferramentas de busca mostrem os sites da empresa. Hulu, de propriedade parcial da empresa de Murdoch, está pensando em cobrar dos espectadores para ver alguns dos programas de TV que agora exibe gratuitamente.

Receita de anúncios

Editores de revistas, por sua vez, têm se unido para tentar criar a própria versão da loja do iTunes, com o intuito de um dia poderem vender versões melhoradas do que têm oferecido gratuitamente. E cada vez mais empresas de mídia planejam cobrar por aplicativos em iPhones e outros aparelhos móveis, bem como no Kindle da Amazon e outros leitores eletrônicos.

Empresas de mídia de todos os tipos construíram seus modelos de negócios com base na suposição de que os anúncios continuarão enchendo seus cofrinhos. Mas com os anúncios cada vez mais escassos, elas agora devem encolher, fechar ou encontrar alguma forma de transferir mais dos custos para os consumidores – os mesmos consumidores que se tornaram tão acostumados a ter acesso ao conteúdo da Web de forma gratuita.

Será que os futuros consumidores vão olhar para 2010 como o ano em que tiveram que finalmente coçar os bolsos? Incertezas Especialistas do setor têm suas dúvidas, dizendo que sistemas de pagamento podem funcionar, mas de formas limitadas e apenas em alguns sites. Publishers que anunciaram mudanças esse ano ainda não deram um salto, e os executivos que defendem mudanças tendem a ser vagos e cautelosos na hora de fazer quaisquer previsões sobre mudar fundamentalmente as finanças de suas empresas combalidas.

Uma coisa, contudo, já mudou, em um ano de fechamentos de revistas e falências de jornais: o bom senso convencional entre as empresas de mídia mudou da crença de que sistemas de pagamento freariam o tráfego e reduziriam a receita de anúncios, para uma visão de que empresas de mídia precisam tentar algo novo, porque o caminho atual parece fadado a extinção.

Movidos a curiosidade

– Fornecedores de conteúdo veem que a ideia de que tudo precisa ser grátis, sustentado por anúncios, não está dando certo, e estão tentando reter o conteúdo, pelo menos parcialmente – diz Alan Mutter, consultor de mídia e blogueiro que tem sido executivo em empresas de mídia digital. – Então, estamos buscando um ponto de inflexão, pelo menos em atitude.

Mas não tenho visto muitas ideias realistas sobre como isso vai acontecer; portanto não sei o quanto isso vai mudar.

Ann Moore, executiva-chefe da Time, maior editora de revistas do país, diz que muitas coisas vão mudar nos próximos dois anos.

Ann admite, no entanto, que é muito difícil prever a forma da mudança e diz que acrescentar somente sistemas de pagamento não vai funcionar.

Obviamente é a grande mídia, com seu legado de altos custos operacionais e tecnologia ultrapassada, que enfrenta esse problema. Novos competidores online vão continuar a ser gratuitos, pegando de forma ávida os usuários perdidos pelos sites que começam a cobrar.

Arianna Huffington, co-fundadora e editora chefe do The Huffington Post, previu que grande parte da concepção de que a mídia vai explorar a Web para obter mais receita nunca se tornará realidade – e caso se torne, sites gratuitos como o dela vão se beneficiar. Alguns dos planos em curso no momento podem dar certo, explica Arianna, mas muitos deles somente alienariam os usuários da internet que vão de um site a outro, de acordo com a curiosidade de cada um.

– Não estou minimizando o fato de que há necessidade de experimentar múltiplos novos modelos de negócio – comenta. – Eu só não acredito que temos de ignorar nossas realidades atuais.

Em todo lugar

Por mais de uma década, empresas de mídia esperaram pelo dia em que pudessem controlar e acessar seus produtos online ou pelo menos pôr um preço neles. Mas esse dia nunca chegou. O que mudou foi o nível de ameaça que enfrentam, devido ao pior declínio de anúncios da história.

Desde o início da Web, há previsões de que tornando a informação mais abundante e acessível, os preços cairiam. Num primeiro momento, isso não parecia importar: anúncios na internet cresceram a um ritmo frenético, e a mídia tradicional obteve sucesso mesmo quando conteúdo gratuito tomou conta da internet.

Eventualmente, contudo, o crescimento da internet puniu a maior parte da mídia, a começar pela indústria da música, na forma de compartilhamento de pastas. Essa história oferece uma lição. Apesar do sucesso do iTunes e de outros serviços pagos, downloads ilegais continuam comuns.

As publicações impressas estão sofrendo muito agora, mas a distribuição digital cresceu em importância para a televisão aberta.

Quase todos os seus conteúdos estão disponíveis online gratuitamente, à medida que a mídia aberta perde audiência e anunciantes. Editoras de livros também estão enfrentando dificuldades; Simon & Schuster disse recentemente que ia atrasar o lançamento de versões eletrônicas de livro de 35 grandes títulos, como as memórias de Karl Rove e um romance de Don DeLillo, temendo que as versões digitais de US$ 9,99 possam prejudicar as cópias com capas duras.

A televisão a cabo tem sido exceção, obtendo sucesso com as mensalidades dos assinantes, mas os executivos se irritam com o fato de os consumidores deixarem os pacotes para escolherem os programas individuais online e assisti-los em suas TVs. Jeffrey Bewkes, presidente e chefe-executivo da Time Warner, avançou com plano que chama de TV Everywhere (TV em todos os lugares, em tradução literal), que permitiria que os assinantes vissem programas online sem cobrança extra.

Acesso conveniente

De forma semelhante, a Comcast iniciou um serviço nesse mês que dá aos assinantes de sua internet banda larga e serviços digitais a cabo acesso a sua programação a cabo na Web. Essas iniciativas não têm a ver com arrancar dólares extras da Web, mas com preservar o negócio.

Um dos maiores defensores da chegada de uma nova era é Rupert Murdoch. Ele diz que vê um dia não tão distante em que todas as empresas de notícias da News Corp., incluindo o Times of London e o New York Post, cobrem pelo acesso ao conteúdo online. Ele e os executivos criticaram, com frequência, sites de busca, dizendo que era um ‘roubo’ lucrar com o trabalho das editoras.

A News Corp. tem buscado um sistema de software para pagamento online – até agora sem muito sucesso – com esperanças de fazer frente a outras editoras, e integra o grupo de editoras de revistas que se uniram, em um consórcio anunciado esse mês. E tem havido conversas sobre a possibilidade de a Microsoft pagar pelos direitos exclusivos para que sua ferramenta de buscas Bing direcione os usuários para os sites da News Corp.

‘Conteúdo de qualidade não é gratuito’, escreveu Murdoch no Wall Street Journal no dia 8 de dezembro, dias depois de divulgar uma mensagem semelhante em conferência da Comissão Federal de Comércio. ‘No futuro, o bom jornalismo vai depender da capacidade de uma empresa de notícias de atrair clientes fornecendo notícias e informação pelas quais os leitores estejam dispostos a pagar’, escreveu.

Estudiosos do problema argumentam que cobrar por conteúdo online funcionaria apenas se os consumidores recebessem um produto bastante melhorado com a conveniência do acesso ao conteúdo em qualquer lugar, em qualquer aparelho digital.

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Do The New York Times